18 ¶ Rosas brancas

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"Os mortos recebem mais flores que os vivos, porque o remorso é mais forte que a gratidão".

Pelo menos uma vez na semana eu ia ao cemitério visitar o túmulo do Dexter. Levava rosas brancas, suas flores prediletas, e sempre ia com meu vestido florido. Um vestido que me presenteou no meu décimo quarto aniversário. O único vestido que eu tinha no guarda roupa, a única peça de roupa que mostrava meus braços e pernas. É óbvio que eu colocava um casaco por cima, não poderia arriscar ter os olhos de ninguém sobre minha pele, ainda mais depois do show da Minnie.

A noite estava fria, sem estrelas no céu, sem uma lua brilhante. Apenas o gigante céu azul que se alastrava sobre toda a humanidade. Estendi um lençol vermelho quadriculado no gramado ao lado da lápide e sentei de pernas cruzadas. Havia trago o álbum de fotografias do último verão em que havíamos estado juntos. Relembrava cada memória durante cada foto, mesmo que Dexter não estivesse ali para ouvir, eu queria continuar pensando que ele me ouviria de algum lugar no universo.

—... você me fez te levar para fora do dormitório e te forçar a acampar no meio da noite na floresta. — sorri em meio à lembrança. — Você resmungava a cada passo que dávamos, me xingava baixinho para que ninguém mais ouvisse, e até jogou uma pedra em mim quando sentamos no chão. Só parou de reclamar quando percebeu como era incrível sentar no meio da floresta a noite e se permitir ouvir o cricrilar dos grilos e assistir as estrelas em seu auge. — solucei entre o sorriso e o choro. — Queria que estivesse aqui, Dexter. Você me ensinou quase tudo que eu sei, às vezes via você como minha linha tênue. Você fazia tantos planos... Enquanto eu, egoísta, persistia em te prender aqui. Devia ter te ajudado como me ajudou, é que fiquei com tanto medo... Queria que tivesse sido eu naquela noite, e não você.

Deitei às costas no lençol e fechei os olhos. O vento gélido batia contra minhas pernas, mas isso não me incomodava. Ele varria qualquer pensamento frívolo para distante de mim. A ausência de pessoas me trouxe paz, confortou o caos interno. Deixei minha mente se aliviar e apenas desfrutei do cricrilar dos grilos.

Após um tempo, uma força muito maior que eu, fez com que eu tornasse a abrir os olhos. Quase enfartei quando meus olhos o encontraram em pé ao lado da lápide do Dexter, me encarando como se eu fosse um fantasma, algo terrivelmente muito assustador. Ele poderia causar medo em mim, mas minha presença o causava pavor.

Se quer um conselho, cuidado com o destino, ele brinca com as pessoas.

— O que faz aqui? — balbuciei entre a respiração pesada.

Connor era como uma noite de inverno, às vezes encantador, outras, devastador. Podia ajudar as coisas mais belas a germinar, ou destruir tudo por onde passava. Para compreendê-lo, bastava eu pensar na neve. Havia algo de diferente nele naquela noite em que ele surgiu entre outros túmulos. Era estranho vê-lo naquele lugar, no meio da noite. Nunca tínhamos nos encontrado ali, mas sabia que ele visitava o lugar constantemente. As rosas brancas murchas que encontrava me levava a pensar que quem as trazia conhecia Dexter muito bem.

Connor olhou ao redor, como se me mostrasse o óbvio.

— Esse é o lugar onde meu irmão está. A pergunta certa seria: O que você faz aqui?

Eu até poderia ter sorrido se não fosse o olhar penetrante e sério que ele possuía. E lá se ia minha paz, a ausência prazerosa de pessoas. Como uma chuva tempestuosa, ele chegou devastando tudo.

— Acho que é óbvio. — retruquei, apontando para o buquê de rosas brancas que havia deixado sobre a lápide.

Nós dois tínhamos chegado a um impasse onde não daríamos o braço a torcer. Eu não iria embora, não permitiria que estragasse minha noite.

Como Não Te Amar? (REPOSTANDO)Où les histoires vivent. Découvrez maintenant