O que está acontecendo aqui?

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A enorme Lua cheia escondia-se vagarosamente em meio às nuvens escuras.
Esplandesia-se, agora, no emerso céu, apenas as incontáveis estrelas.
O relógio empoeirado do criado mudo marcava meia noite e trinta e seis minutos de uma madrugada instigante.
Eu estava aproximadamente duas horas e meia a espera de Violet.
Talvez, não se recordem ou eu não tenha dito, mas Violet foi minha primeira amiga desde o dia em que mudei-me para o meu bairro.
Éramos praticamente irmãs, em todos os aspectos.
Mas ela se mudou aos dez anos para Londres e nunca mais nos falamos. E é neste período que conheci Pedro, que também me deixou, por desventura do destino. Porém, não sei o que este quer, fazendo-me reencontrá-la novamente.
Não só ela, como também algumas mágoas do passado.

A noite fria estimulava meu ingênuo sono, fazendo-me bocejar a cada dois minutos.
Meus olhos pesados esbravejavam-se diante do indestrutível cansaço para se manterem atentos e observar o término do espetáculo. Mas era impossível. A sonolência vencia-me mesmo sem minha percepção.
Porém, meus irritantes pensamentos eram mais sagazes.
Em vez de caminharem para outras bandas ou relaxarem-me como o sono, talvez, atormentavam-me sussurrando em meus ouvidos algo que eu era extremamente culpada. Ou culpavam-me.
Algo que prometi esquecer, mas fui lembrada. Algo que queria nunca ter feito, mas fiz.
Uma indesejável lembrança que estava guardada em um baú, mas infelizmente foi aberto e agora faz-me dar suspiros de preocupação.

O toque melancólico que havia ouvido antes, repetiu-se inesperadamente, tirando-me de meu devaneio.
Logo, meu sono assustado saiu levemente com a ajuda da brisa, pela grande janela de vidro.

Junto ao mesmo toque, veio também o mesmo sentimento.
Algo inexplicável. Indecifrável.
Aquele dia parecia se repetir em minha mente. Até mesmo os mínimos detalhes.

Se eu pudesse ao menos dizer...
Se eu pudesse desculpar-me...
Se... Se eu não me atrevesse e fosse tão imatura, talvez ele ainda estaria aqui.
Mas eu era uma criança!
E-Eu não sabia que um simples ato, causaria um grande erro...

De repente, da mesma forma que iniciou-se, o toque cessou e meu ouvidos passaram a escutar um estrondo sobre a parede.
Levantei-me da confortável cama e direcionei-me cuidadosamente, em meio ao emaranhado de objetos espalhados pelo chão do desogarziado quarto, até a porta.

Meus olhos captaram, através da entreaberta porta, seus passos apressados diante do escuro corredor.
Ele parecia irritado e ao mesmo tempo arrasado.

Assim que seus passos levaram-o para o andar de baixo, onde a barulhenta festa já havia chegado em seu fim, retirei-me em um galope do quarto de Violet.

Abrir silenciosamente a porta de seu quarto.
Havia pôsteres de bandas coladas nas paredes pintadas de branco.
No teto, via-se á tinta, a imagem da Via Láctica.
Isso é normal por aqui?
O quarto era enorme. Seus instrumentos musicais deixavam-o ainda mais charmoso. O tapete de veludo preto junto a cortinas também pretas e a alguns quadros além dos pôsteres, eram a combinação perfeita de um quarto perfeito.
Tudo tinha a sua cara. O seu jeito. Era o seu mundo de quatro cantos. Um mundo no qual, eu queria explorar.

Encostei lentamente a porta.
Seu Notebook estava aberto em um site qualquer.
Aproximei-me e pude notar alguns rabiscos em um bloco de notas.

- Letras de músicas...- Sorrir - Não há nada melhor para se expressar...- Sussurrei.

Guiei meu olhar ao redor do quarto.
Meus olhos fixaram-se rapidamente em algo. Atrás da porta, havia um painel onde algumas fotos estavam coladas.

Aproximei-me para olhar.
Tinha fotos suas e com... com seus pais. Eles pareciam tão felizes.

Logo abaixo, havia uma pequena cômoda com algumas medalhas, livros didáticos, de fantasia e um diário.

Maryanne, não se atreva...

- Eu não queria mas é mais forte do que eu...- Disse entre os lábios.
Levei minha mão para pegá-lo.
Antes que eu o abrisse, ele foi retirado apressadamente de minhas mãos.

- O que tem aqui, não é de sua conta! - Olhou-me seriamente.

Gelei, descongelei e gelei novamente.

- D-Desculpe. - Engoli um seco.

- O que faz em meu quarto? Dei-lhe permissão para entrar aqui?

- Não... E-Eu apenas...

- Como ainda ousa...- sorriu com sarcasmo.

- Clay, eu...

- Saia do meu quarto agora! - Aumentou a voz - Eu disse para nunca mais chegar perto de mim, idiota!

- Idiota é você por ser tão preconceituoso. - Gritei - Entenda-me, eu ainda me sinto mal por aquilo!

- É o mínimo​ que você pode fazer.

- Não. Não é! Se você não fosse tão mala, imbecil e orgulhoso, talvez, nada daquilo teria acontecido!

- Eu não tenho culpa de não gostar de você, Maryanne. Foi apenas uma festa na qual eu NÃO QUERIA A SUA PRESENÇA! O mundo não gira apenas em seu redor. Você não pode conseguir tudo que quer sempre. Você deve aprender isso!

- Não me culpe por algo que você não tem certeza, peço-te...

- POR QUE VOCÊ AINDA NÃO SAIU DO MEU QUARTO? EU NÃO QUERO ESCUTAR SEUS ARGUMENTOS SEM NEXO, PORQUE VOCÊ NÃO PASSA DE UMA GAROTA MIMADA QUE SEMPRE SE ACHOU SUPERIOR A TODOS, MAS VOCÊ NÃO É! VOCÊ, MARYANNE, NÃO SE PASSA DE UMA ASSASSINA QUE ARRUINOU A MINHA VIDA!

- A dor que você sente em dez anos, eu sinto há dezesseis...- Sussurrei com os olhos lacrimejados - Você deve lembrar que eu era uma criança solitária e fingia, Clay, fingia ser durona para a vida não ser dura comigo. Só assim, atraia "amigos." E você foi o único que me desprezou simplesmente por ser uma sem mãe. Ainda lembro de seus xingamentos durante o intervalo no colégio. Saiba que doía e como doía, na verdade, aquelas palavras doem até hoje. Agora, além de não ter mãe, estou prestes a não ter também, um pai. Mal sabe o porquê de eu está aqui e já começou a me julgar. Uma de suas principais características. Julgar. Mas nunca gostou de ser julgado. Irônico, não? - Sorrir em meio ao choro - Eu não entendo o fato de nunca ter gostando de mim. Que mal te fiz? Diga, Clay! Que mal te fiz? Em vez de ajudar-me, maltratou-me em meio a todos.
Ah, e não precisa lembrar-me que fui uma assassina, já sei disso há um bom tempo, porque matei minha mãe. Lembra? Dizia-me isso todos os dias...
Não matei seu pai porque quis. Assim como minha mãe. - Desmoronei em lágrimas.

- Mary, está tudo bem? - Violet olhou-me com as sobrancelhas erguidas - O que está acontecendo aqui, Clay? - Indagou.

Desventuras De MaryanneNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ