28 - Uma surpresa a cada degrau (parte 2)

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De repente, abri os olhos e notei que estava de volta na caverna. Entretanto, Rafiq e Fred ainda se encontravam em transe. O pior de tudo não foi o fato de estarem inconscientes, mas de se enfrentarem.

Então era aquilo. Na verdade, Karl e Ulisses eram Rafiq e Fred. Farmug havia nos manipulado.

Tentando parar as alucinações, entrei na frente de Rafiq. No entanto, mesmo tentando impedi-lo, agiu como se eu não estivesse presente.

Diante da falha, fiz o mesmo com Fred. Puxei-o para trás, tentei derrubá-lo, porém, ele insistia em golpear o rei.

Não sabia mais o que fazer, pois acabariam se matando caso o ritmo continuasse. Joguei algumas pedras contra outras, fiz barulho, tentei de tudo. Mas nada mudava. Quando estava prestes a desistir, lembrei de Merry. Recordei do instante em que recebi o colar.

Depois de descobrir a finalidade dele, e usá-lo por três vezes, repasse para alguém que você queira proteger.

Peguei o pingente e ergui. Não sabia como aquilo me ajudaria, uma vez que parecia ser tão frágil. Enquanto pensava nessa fragilidade, pressionei-o. Então, para a minha surpresa, ele mudou de forma.

Não se tratava apenas de um pingente, ali se escondia um apito.

Assopre, assopre, meu subconsciente ordenava.

Naquele momento, soprei o apito. Para minha surpresa, ambos pararam de se enfrentar e ficaram paralisados. Observando tal comportamento, soprei pela segunda vez. Com isso, saíram do transe.

— Caí no mesmo truque de novo — reclamou Rafiq.

Rafiq limpou o rosto, retirando a areia. Em seguida, olhou para Fred; depois, para mim.

— Perdão, Majestade — lamentou Fred. Dito isso, questionou-me: — Como se livrou do transe?

— Ouvi Salua dizer que...

Sem perceber, falei demais. Estava tão fascinado com o objeto que nem me dei conta do que disse.

— O que Salua tem a ver com isso? — prosseguiu ele, olhando-me torto.

Tive de contornar a situação.

— Nada... Só decidi que não ia mais acreditar no que estava vendo.

— O assunto está bom, mas não viemos aqui para ficar conversando — alertou Rafiq.

Antes que voltássemos ao foco, verifiquei meu ombro. Não existia nada ali, a não ser o mesmo arranhão de antes, ocasionado pela flecha que me derrubou. Agora seguíamos por uma trilha. Ao visualizá-la, nem discutimos. Concordamos que ela poderia nos levar ao topo da montanha.

Com a passagem do sol, algumas vezes, o ambiente ficava escuro demais. Outras vezes, iluminado demais — gerando desconforto. Enquanto segui, observei o caminho ficar estreito. E isso aconteceu até chegarmos perto de uma escadaria cinzenta e petrificada.

Antes que eu pisasse no primeiro degrau, Rafiq me impediu, puxando-me para trás. Ele olhou desconfiado para a escada. Porém, no primeiro momento, não disse nada. Após refletir, o rei pediu para nos afastarmos. Enquanto isso, encheu os bolsos com pequenas pedras escuras e lisas.

— Peguem o máximo de trômix que conseguirem, mas, antes, pisem em cima deles — disse Rafiq, apontando para as pedras do chão.

Mesmo sem saber o que faria, peguei as menores pedras e guardei. Quando terminamos, Rafiq pediu para recuarmos um pouco mais. Feito isso, ele mirou o primeiro degrau e atirou uma delas. Mas, naquele momento, nada aconteceu.

De repente, o rei atirou a segunda pedra no degrau seguinte. E quando ela o atingiu, o degrau se autodestruiu, deixando um buraco fundo e escuro à nossa frente. Apesar de ter prometido que não iria mais duvidar de nada, não tinha como negar que aquilo era instigante.

— Querem saber de uma coisa? — disse Rafiq. — Nunca subestime os primeiros degraus de uma escada.

Antes de continuarmos, Fred não se conteve e perguntou sobre a serventia das pedras. Como resposta, obtivemos a seguinte informação:

— O trômix é uma pedra reveladora. Nos ajuda a ter autocontrole, nos encaminha e estimula a tomar decisões sábias.

Ainda no primeiro degrau, Rafiq aproveitou para jogar outras pedras. A que caiu no terceiro, não causou nenhum impacto. Mas a do quarto, sim.

— Pelo visto, sempre saltará um — disse Fred.

— É cedo demais para deduzir isso — retrucou Rafiq, que, ao me ver com um trômix, acrescentou: — Tente!

Com a permissão do rei, atirei o trômix, e o quinto degrau também foi destruído, deixando um espaço dificultoso. Quando isso aconteceu, olhei para a reação de Fred e o vi ficar sem jeito.

— É, devemos ter cuidado — comentou ele.

Quando pulei, nada aconteceu. Entretanto, só de pensar no que me aguardava, sentia o coração saltar como se ele estivesse brincando numa cama elástica. Ao atingirmos um ponto avançado, tudo se acabou, menos a subida. Não tínhamos mais trômix. E, para a nossa frustração, faltavam apenas três degraus.

Enquanto pensávamos numa solução, um olhava para o outro. No entanto, como não tínhamos mais nenhum objeto pequeno; em pensamento, cogitei jogar o colar. Todavia, antes que eu sugerisse, Fred apoiou-se no ombro de Rafiq e retirou o par de botas.

— Será que vai dar certo? — perguntou.

Olhando para trás, vi os degraus explodindo. Por esse motivo, gritei:

— Rápido!

Sem demora, Fred jogou uma bota, mas nada aconteceu. Então, prosseguimos. Naquele instante, Rafiq demonstrou alívio. O rei ordenou que eu fosse o primeiro a saltar. Obedeci, é claro. No entanto, quando cheguei do outro lado, notei a proximidade das explosões.

Assim que Fred atravessou, tentei ocupar o menor espaço possível do local em que estava. Qualquer movimento brusco nos derrubaria. Com o impulso da explosão, Rafiq não se apoiou firme, com isso, deslizou no novo lado. Por cerca de cinco segundos, o rei apoiou-se no degrau, segurando-se apenas com uma das mãos. No entanto, Fred e eu conseguimos puxá-lo a tempo, mantendo-o a salvo.

Após recuperarmos o rei, retirei minha bota esquerda, atirando-a contra o último degrau.

— Não é possível! — disse eu, apavorado.

E agora, como vamos sair daqui? Pensei.

A última explosão permitiu que a luz de fora adentrasse. E assim que o degrau mais próximo se autodestruiu, por um instante, fechei os olhos para não ver o que viria em seguida. Contudo, o degrau que servia de apoio nos elevou para a superfície, deixando-me cara a cara com Farmug; o meu eterno inimigo.

Reluscer - O SucessorKde žijí příběhy. Začni objevovat