Capítulo 8 - Devaneios

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Eduarda

Seguimos caminhando descalço na areia da praia sem um rumo exato a seguir. Estar ali com Melissa era diferente, era como se mesmo na companhia de alguém eu me sentisse sozinha. Em cada passo eu pensava na Clara, em tudo que havíamos vivido. Foi aqui, exatamente aqui nesta praia que Clara e eu começamos a namorar, após um luau romântico onde firmamos nosso compromisso. Era estranho estar ali sem ela. A chuva caia sobre minha cabeça, circulava sobre minha face e se misturava com minhas lágrimas.

— Dou uma bala por um de seus pensamentos? — ela sorriu docemente tentando decifrar meus devaneios. — Se bem que até acho que sei o que deve estar te perturbando. A falta da sua namorada ainda mexe muito com você né? — ela me olhou como se conseguisse enxergar minha alma.

— É que foi nessa praia que aconteceu nosso pedido de namoro. —Um turbilhão de lembranças passadas habitam em minha alma a cada passo que eu dava. Excessos de vazios em meu coração faziam escapar lágrimas de meus olhos.

— Mas se essa é uma lembrança boa, por que ela te faz tanto mal?

— Porquê foi apenas isso que restou: Lembranças! Com a falta dela eu pude ver o quanto errei. Eu sei que devo estar sendo repetitiva reafirmando tantas vezes sobre a falta que ela me faz, mas é que até meus assuntos se tornaram tão repetitivos quanto meus dias.  Como pode alguém perder a vida e continuar vivendo? Talvez não perdemos a vida exatamente quando morremos, perdemos quando acaba o encanto e a vontade de viver. Comigo foi e continua sendo assim. Eu tentei fugir para longe, mas me contive em continuar no escuro do meu quarto. Eu tentei conhecer pessoas, mas entendi que sou melhor sozinha. Como posso ter dias tão iguais e chamar isso de vida? Já tentei encontrar forças em mim e mudar tudo isso, mas parece que estou mais fraca que nunca. Eu morri, mas contínuo respirando.  Sem ela não há caminho para qual eu queira seguir. 

  — Acha mesmo que ela gostaria de te ver assim?  Você não pode desistir assim da sua vida. Eu sei que você a amou e ainda ama muito, mas você precisa aceitar a morte dela. Não estou falando para esquece-la, mas tente lembra-la como algo especial, não como uma abstinência que você não consegue viver sem.  Eu sei que a gente se conhece pouquíssimo tempo, mas já me sinto na obrigação de cuidar de ti, e não vou te deixar se afundar assim dentro de si mesma. 

Melissa
**

Eu queria naquele exato momento abraça-la e mostrar que ela não estava sozinha, mas me contive em continuar andando pela praia, sentindo as ultimas gotas de chuva caírem lavando nossas almas. No fundo eu desejava saber o que tornava Clara tão diferente das outras. Era nítido que Eduarda nunca havia amado outra garota como a amava.  

  — Estou um pouco cansada. Podemos sentar? —  ela falou, interrompendo meu absorvo de devaneios.  

— Claro, podemos! —  falei parando meus passos e colando meu bumbum naquela areia molhada, enquanto ela fazia o mesmo.

—  Eu posso te fazer uma pergunta?  — indaguei meio desconcertada.

—  Claro que pode. Diga-me o que deseja saber?  —  senti uma certa curiosidade vindo dela. 

— Clara tinha irmãos? —  ela me olhou surpresa. Talvez aquela pergunta não era tão comum aos seus olhos.

  — Não. Nem pai. O pai morreu quando ela ainda era bem jovem. No mundo era apenas ela, dona Valentina - sua mãe, Spaick - seu cão e eu. —  ela disse cabisbaixa.  

— E como a mãe dela reagiu a tudo isso? Primeiro o pai, depois a filha, creio que não deve ter sido fácil pra ela.   

 —  Dona Valentina morreu dois anos após a morte de sua filha.  No inicio eu até tentei me aproximar para que a solidão dela não fosse tão enlouquecedora, mas Valentina me culpava inconformavelmente pela morte de sua filha, e com razão, então com dois anos após eu soube de sua morte.  Ela morreu de uma pneumonia, dizem os médicos, mas eu acho que na verdade a causa de sua morte foi a solidão que a ausência de sua filha causou. Spaick, o cachorrinho de Clara foi mandado para adoção, quando eu soube tentei recupera-lo, mas ele já havia encontrado um novo lar. —  sua voz ecoava em meus ouvidos de forma tremula. Era nítido que esse assunto mexia negativamente com os sentimentos de Eduarda. Olha-la daquela maneira tão frágil me trazia sentir impotência diante de toda aquela situação. 

Os ventos fortes e o frio constante estavam me fazendo ver que foi loucura dá a Eduarda a ideia de visitar uma praia naquele turno. Minhas roupas úmidas e geladas me fazia tremer dos pês a cabeça. Apesar de ter passado a chuva, o frio se mantinha firme e forte. 

   —  Caramba Mel, você está tremendo! —  ela observou surpresa, arregalando seus olhos. 

   — O que é super natural, afinal estamos no meio de uma praia com ventos constantes, roupas umedecidas de uma chuva que acabou há pouco tempo. É completamente natural que eu sinta frio. —  eu tentei me defender, afinal Eduarda sorria como se o clima estivesse em total estabilidade. 

—  Vem aqui que vou te ajudar a sentir menos frio. Dizem que sou quente até dentro de uma barra de gelo. Vamos tirar a prova?  (Risos)  — falou Eduarda me envolvendo num abraço quente e aconchegante. Confesso que eu estava surpresa com aquela atitude. Eu realmente não esperava. Me sentia confusa e era notório que eu não sabia o que fazer e nem de que forma agir. No entanto, eu estava com frio demais para me desvencilhar daquele abraço. Fechei meus olhos e curti o momento, enquanto ouvia o coração de Eduarda saltitando em seu peito. 


2 - Colorindo uma vida de tons cinzasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora