Capítulo 1 - Eduarda

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Minha cabeça explodindo, abro os olhos lentamente e me encontro ainda um pouco tonta tentando entender onde estou e o que estou fazendo pelada... Sento-me na cama, a cabeça girando, olho ao redor e reconheço o meu quarto. "Minha Nossa Senhora, como eu voltei pra casa?" aos poucos, flashs de memória desta noite me vem à mente, mas acabo desistindo... eu nunca consigo ao menos uma pista do que fiz, com quem estava, o que bebi, onde estava, quem me trouxe pra casa... até meus amigos mais próximos já desistiram de me perguntar. Procuro meu celular pela cama, no criado mudo... Até ter a brilhante ideia de usar uma coisa chamada abajur que fica ao lado da minha cama (apesar dos 5 segundos em que fiquei defendendo minha visão daquela luz e ter aumentado minha dor de cabeça), e encontro o dito cujo no chão. Olho as horas, e são exatamente 3h57 da madrugada. Vejo duas chamadas não atendidas da Lívia, (minha amiga de balada) mas deixo para retornar mais tarde, não há nada de tão urgente que ela quisesse falar há uma hora atrás que não possa esperar até às 13h quando eu acordar.

Deito novamente e continuo tentando lembrar onde estive depois da social na casa do Guilherme, (meu melhor amigo) inesperadamente, começo uma autoanálise sobre o que minha vida se tornou... Levanto e acendo um cigarro para pensar melhor e vou até a janela do meu quarto. Eu sou Eduarda, a filha do meio num total de três filhos de um casal que sempre foi o exemplo de família perfeita, casados há 37 anos, e quase nunca brigaram. Meus pais moram em redenção - Pernambuco, lugar onde eu também nasci, mas estão passando uma temporada em meu apartamento aqui em Boa Viagem, para a confraternização de fim de ano em família que eles teimam em fazer anualmente. Com a presença deles, eu até tento levar ao máximo uma vida normal: de casa para o trabalho, evitando causar problemas... Mas a verdade é que de normal a minha vida não tem nada. Eu ainda amo desesperadamente minha primeira e única namorada que morreu há quase 3 anos atrás. A lembrança é tão viva quanto se eu a tivesse perdido ontem! E o pior de tudo: eu estava lá.

Desde que ela morreu, a melhor parte de mim morreu também. Passei muito tempo em choque me perguntando "por quê ela fez isso?", mas depois de três anos eu percebi que a culpa não era minha, mas isso não me impediu de me fechar para as pessoas e outras relações. Desde então, a Lívia e o Guilherme têm sido meus anjos, eles nunca me abandonaram e logo que passou o período aceitável do meu luto, eles começaram a me tirar de casa, me levavam para beber, para conhecer gente nova, usar coisas novas... Mas apesar da vida boêmia que tenho, sempre me bate a saudade e o vazio que ela deixou. Meus pais já nem se importam tanto comigo, mas eu não os culpo... Talvez eles achem melhor que eu saia, do que fique no meu quarto chorando. Eu nunca encontrei uma garota tão incrível quanto ela! Namoravamos em perfeita sintonia, quase nunca brigamos sério, e até já líamos nossos pensamentos.

Nesse momento, as lágrimas começam a escorrer e a angústia aperta, mas eu me levanto, apago o cigarro, vou no banheiro lavar o rosto e escovar os dentes para dormir de novo.

Acordo com batidas na porta, mando entrar e vejo a Lívia entrando com uma bandeja com café da manhã completo. Abro um sorriso e sento na cama, ela põe a bandeja ao meu lado e vai falando:

— Vamos acordar diva da putaria! Tem noção de que horas são? O mundo precisa do seu brilho minha querida!

— E você? Tem noção do perigo de entrar com esse vestido no quarto de uma lésbica pelada? — falo com um sorriso debochado.

— Ah minha amiga, na seca que eu tô, o que vier é lucro! — diz Lívia rindo e sentando do meu lado. — Cheguei, tomei café com teus pais e sua mãe após falar que a sua querida bela (filha) adormecida ainda estava no sono profundo, me mandou trazer café para você! Como está se sentindo depois de ontem? Não vi você saindo...

— Bom, só estou me sentindo enjoada e com a dor de cabeça... Eu não lembro de nada de ontem, qualquer dia desses dou o azar de ser estuprada numa dessas farras!

(gargalhadas)

Lívia me olha com reprovação, e começa a mexer na bolsa... - Como ótima amiga que sou, te trouxe remédio para enxaqueca e para o fígado...

— Owwn! Você é uma fofa mesmo! Preciso casar com alguém assim! — falei piscando para ela.

(rimos de novo)

Começo a tomar meu café em silêncio, quando olho a Lívia novamente, ela está me olhando com um olhar que eu nunca tinha visto antes, que eu não consegui decifrar... Pergunto meio sem jeito:

— O que foi?

— Nada ué — ela fala levantando e começa a andar pelo quarto — vim aqui te chamar pra um programinha..

— Não me faz beber hoje, pelo amor de Deus Lívia!

— Não tapada! Ia sugerir um cinema, sei lá... Um programa para duas mocinhas respeitosas que somos! Aliás, podíamos ir lá pra casa assistir uns filmes vestindo pijamas, fazer pipoca e brigadeiro...

— Já não gostei!

— O que foi? - ela calou de repente num tom muito preocupado que eu já conhecia.

— Além de termos que ficar vestidas, você está tentando me engordar! - falei rindo e levantando - vou tomar banho e nós vamos!

— Aff, que susto! (risos) Tá bom, te espero.

A Lívia e eu nos tornamos muito próximas durante esses anos. Após a morte da minha única namorada e a minha quase-depressão, foi ela que ficou ao meu lado. Ela sempre foi muito atenciosa comigo, mas nunca tive segundas intenções com ela, quer dizer, reformulando a frase, quando nos conhecemos eu até tentei leva-la para a minha teia de sedução, digo... para minha cama, mas não aconteceu absolutamente nada, era mais amizade que qualquer coisa. Depois que a Clara morreu, eu nunca tive vontade de me relacionar sério com ninguém. A Lívia é uma bissexual, quase que totalmente hétero, mas louca o suficiente para topar ir para cama com uma garota que conheceu na balada, apenas para fazer ciúmes ao namorado ( atualmente ex).
A Lívinha é dona de uma beleza meiga, angelical que conquista qualquer um, é sempre um amor com todos que estão a sua volta... É exatamente o tipo de garota que qualquer uma amaria ter por perto.

Troco de roupa ainda dentro do banheiro e saio.

— Ah não Duda! Achei que ia ver aqui um desfile like Victoria Secrets! Já estava até começando a me animar com a idéia do nude e você sai vestida? - falou Lívia no seu habitual tom descontraído

— Fala a verdade, você é uma lésbica encubada com uma queda imensa por mim!

— Você ainda tem dúvidas, meu bem?

Rimos e fizemos mais algumas piadinhas. Era impossível não ficar alto astral perto da Lívia! Coloquei umas poucas roupas na mochila, e descemos em direção ao estacionamento do prédio.

2 - Colorindo uma vida de tons cinzasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora