Capítulo 38

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Porã virou-se para o homem em questão que ousou interrompê-los e invadir seu território. Aparentava ser bem mais velho que ele, porém um pouco mais jovem que seu pai. Possui uma expressão bruta e um corpo forte e bem estruturado. Ele não conseguiu reconhecê-lo, então resolveu questioná-lo.

— E quem é você estranho, que se acha em pleno poder de invadir o meu território e importunar a minha tribo?

O homem levantou um pequeno sorriso de escárnio a pergunta de Porã e respondeu-lhe.

— Ó jovem garoto. Este solo e esta tribo são tanto meus quanto seus, não hei de enrolar-me e deixá-los ansiosos, então para que tenham ciência Chamo-me Cobí Parî filho mestiço de Ainoã Parî. Como descendente direto do antigo Cacique Codê Parî, revogo meu direito à posse e ao governo da tribo Aikaranis.

Toda a tribo arfou em surpresa. Porã deu um passo para trás com o baque da informação, mas não perdeu sua compostura. Não iria acreditar facilmente em um blefe de um homem. Aquira foi quem falou em meio a surpresa de todos.

— Isso é impossível. Cobí Parî morreu ainda criança ao acidentalmente cair do penhasco em meio a floresta.

— Isso foi o que todos acharam na época. E não foi bem assim que aconteceu. Não foi um simples acidente, eu fui empurrado. E por pura graça divina sobrevivi.

— Toma-nos por tolos homem, se acha que acreditamos simplesmente apenas em suas palavras.
Respondeu-lhe Amani irritada com o homem audacioso.

— Não seja por isso. Tenho como provar-lhes. O intruso começou a aproximar-se e Porã e seus guerreiros rosnaram em resposta. O homem ao menos piscou, manteve-se firme e parou a cinco passos dos anciões, Amani, Aquira e Porã. O

homem levou as mãos à sua camisa, e Porã tornou-se alerta.

— Acalmem-se todos, agora vejam se não é verdade o que digo.

Ele levantou a camisa mostrando-lhes um símbolo já reconhecido por todos, posicionado próximo a um de seus músculos oblíquos na parte inferior da barriga. Amani e Aquira arregalaram seus olhos em espanto.

— Como pode? É realmente o símbolo de nascença que só os Parî tinham.

Disse Amani em grande espanto.
A Tribo que até então estava em silêncio disparam em cochichos alarmados, e desacreditados com a história do intruso.

— Contra todas as possibilidades, a queda do penhasco não me matou. E não foi um acidente. Armaram para que eu caísse, não conseguiam viver com o filho traidor e resolveram que acabar com minha vida fosse a solução. Eu passei dias estirado entre as pedras sangrando, rezando por um socorro que nunca veio. Mas a Terra pareceu não aceitar dar-me para a morte. Sozinho eu forcei meu corpo a resistir, foram semanas perdido, com e faminto em meio a floresta. A licantropia serviu-me de alguma forma, mas a cura agiu lentamente, fazendo-me sofrer todo o processo. Agora imaginem, uma criança de apenas 8 anos. Ferida e perdida em uma grande mata não podendo retornar ao lugar que chamava de lar por medo de causar-lhe mal de novo.
Melina ficou perplexa com a história de Cobî, era comovente. Tão jovem e tendo que tornar-se forte.

O homem seguiu com sua história sem interrupções.

—Passei meses alimentando-me de pequenos vermes e águas em meio a poças de lama sempre que chovia. Nunca havia saído do solo Aikaranis, então não saberia localizar um riacho ou cachoeira próximo. Sobrevivi e me fortaleci assim por anos. Até a poucos meses atrás consegui encontrar-me em meio aos lobisomens e cá estamos nós. Cansei de viver alheio ao que pode ser meu por direito.

— Reconhecemos sua Luta e sua história Cobî Parî. Porém nós temos ordem e leis, como já há um Olcan sucessor nos resta apenas uma opção a tomar.

Disse-lhe o ancião Rudá.

— Sim eu sei, lembro-me das leis. É por isso que desafio Porã Olcan a uma luta cerimonial pelo poder dessa Tribo.

Melina arfou buscando por ar, nervosa com a imposição do homem. Porã ao menos reagiu, já imaginava ouvi-lo dizer isso. Ele não queria fazer tal cerimônia, mas não deixaria seu povo entregue a um homem desconhecido. Os aldeões ficaram indignados com a imposição de Cobî. Melina aproximou-se de Porã, parando ao seu lado olhando para o homem.

—Como pode chegar em nossa tribo cheio de exigências se não agiu de boa fé conosco? Você foi o cabeça dos ataques lupinos e da tentativa de sequestro do antigo alfa, quem não nos garante que foi quem o matou para tomar o poder agora?
Cobí olhou-a com curiosidade e graça.

— Olha se não é uma coisinha perspicaz. E é interessante que tenham voltado a aceitar humanos aqui depois de meu pai!

Melina incomodou-se com a forma dele compará-lo ao traidor, e Porã rosnou em advertência a forma do homem falar com sua parceira. Ela acariciou-o no braço para que se mantivesse calmo. Cobí seguiu pleno com sua fala.

—Muito lógico seu raciocínio humana, mas tem provas do que fala? Os lobisomens sempre os atacaram, são bestas irracionais, acha mesmo que poderia controlá-las?

A jovem irritou-se porque mesmo que tivesse certeza que tudo foi armado por ele, não haviam provas. Então seria a palavra dele contra a dela.

Quill pronunciou-se pela primeira vez.

— Infelizmente devemos concordar com relação a isso. Nossos costumes e leis sempre foram baseados na verdade e na honra, não temos como acusá-lo sem provas.

— Então faremos o que? Mesmo sendo um Parî tornou-se um estranho para nós. Não pode chegar assim.

Disse Raoni negando a possibilidade de aceitar abertamente um estranho. Mas para surpresa de
todos depois de alguns minutos calado raciocinando, Porã respondeu-lhe.

— Eu aceito o seu desafio. Mas como você mesmo disse ser conhecedor de nossas leis, sabe que precisamos de alguns dias para o preparo da luta cerimonial. Então ainda sendo o sucessor em exercício aqui, exijo que retorne de onde veio e aguarde o tempo determinado.

Cobí Parî não gostou muito do que lhe foi solicitado, mas não tinha outra opção. Se quisesse ter o poder daquele lugar para vingar-se, teria que resguardar-se em paciência.

— Que assim seja jovem Líder. Mas não esperarei nem um dia a mais, nem um a menos. Retornarei no dia exato de nossa luta. É bom que se prepare bem, tentarei não matá-lo para que você volte para os braços de sua parceira.

Porã aproximou-se cara a cara dele.

— Não me subestime, velho. E não pense que duvido de que tenha matado meu pai, eu sei que sim, e usarei seu sangue para vingar a morte dele.

O homem demonstrou irritação pela primeira vez desde que adentrou a tribo, encararam-se por mais alguns minutos. Então ele virou as costas e sumiu floresta adentro.

A Batalha dos Lobos Where stories live. Discover now