Capítulo - 24☆

63 18 2
                                    

Pagar de donzela em perigo fez Noah sofrer tudo que podia e mais um pouco, me carregando até o ponto de encontro. Andar pela margem do rio era complicado, tinham pedras, galhos e toda sorte de entulho pra pular e transpassar, ainda mais comigo pendurada em seu pescoço. Eu sou magrinha, devo ter lá meus 70 quilos eu eu acho, porém pesadinha já que no alto dos meus quase 1,75, tem muita massa muscular pra carregar.

Eu fui muito má, admito. Reclamando cada vez que me colocava no chão da dor no meu tornozelo, que de momento está estupidamente inchado. Mas, era um castigo justo. Foi por causa dele que quase morri afogada. Ele enxugava o suor, buscava o ar lá no fundo dos pulmões e retornava a me pegar no colo. Delicadamente e sem proferir uma única palavra de reclamação.

Nossa roupa molhada também era incômoda, já que volta e meia fazia com ele quase me deixasse escapar dos seus braços. Eu via o pânico no olhar dele quando isso acontecia. O medo de me deixar cair e acabar fazendo um machucado maior do que um tornozelo torcido.

Eu confesso, poderia até dar um geitinho de me apoiar em seu pescoço e mancar alguns metros mas, foda-se! Quem manda ter admiradoras piradas que saem por aí socando a cara das turistas?! Meu diabo sorria feliz com essas minhas indagações. Ele adora essas desavenças ao qual me meto.

Mas, para não ir pro inferno com mais um pecado, na estrada me apoiei nele e no guia, aliviando assim, a carga de Noah. Quando chegou no ônibus, deveria ter prometido a si mesmo, nunca mais bancar o herói. Sorriu vendo-o beber todo o conteúdo da garrafa de água. O rosto vermelho do sol, o cansaço expresso na respiração irregular e os músculos tremendo pelo excesso de peso. Lembrando, sou magrinha! Mas, uma girafa.

Dai me pego pensando, ou esse cara está muito apaixonado por mim? Ou está numa seca diabólica, já que Sheila dissera que Guido arranjava suas amantes. Ou na melhor das hipóteses, é o melhor homem em que uma mulher possa investir num provável relacionamento.

Fico indecisa na resposta. Porém, vendo-o ali molhado, suado e tendo passado todo esse tempo em seu colo, minha mente tem ainda outras probabilidades para fazer com esse cara. Nada comportadas e que se remetem a quatro paredes. Nesse momento, meu diabo sarcástico, me faz lembrar de um detalhe...

"Seu marido nem esfriou ainda!"

Aquela vozinha dentro da minha cabeça faz eu revirar os olhos e dar um "foda-se" pra ela. Será mesmo que tenho que esperar que meu marido "esfrie" para ter umas horas divertidas com alguém?

E quanto tempo isso vai levar? Afinal, Chris foi o único homem da minha vida. E Noah... Haaa Noah... Está mexendo com hormônios meus, que nem sabia que existiam...

Quando nos encontramos com os outros, novamente na trilha, Marcos correu ao nosso encontro, jogou-se em abraço no meu pescoço, apertando-me o mais que podia, feliz por tudo ter acabado bem e já começou a tagarelar sem parar...

---Que loco, tia da cidade! Você acabou com a perua da Sheila!--- Quase me sufocou naquele abraço gostoso. Noah o afastou de mim e ele continuou o seu alarde.----Foi uma de direita, depois de esquerda e aquela cuspida! Sensacional!!

O garoto comemorava a minha vitória inexistente com euforia. Por que na verdade, ninguém de fato ganhou nada naquela briga ridícula. A não ser é claro, os inúmeros machucados e contusões que temos espalhados pelo corpo.

Não dá pra negar que ao vê-lo imitando a briga em movimentos lentos, toda a vergonha do mundo desabou sobre mim. Como posso proporcionar uma cena dessas ao meu suposto filho?

Como poderei repreendê-lo no futuro, dizendo que com violência não se resolve nada? Francamente, acho que ainda não saí da adolescência e nem tenho competência para ser uma boa mãe. No mínimo, uma que dê bons exemplos aos filhos.

Mas confesso, o orgulho que ele estava sentindo, me envaidece. E a rebelde que existe dentro de mim agradece radiante, as suas palavras. Mas, era preciso uma retratação. Uma lição deveria ser ensinada àquele pequeno ser.

--- Olha Marcos, foi horrível aquilo...--- Segurei os seus ombros e fiz me encarar nos olhos.--- Nunca repita ! É errado! Foi um péssimo exemplo! E se não fosse o seu pai....

Meu olhar de donzela resgatada fez Noah estufar o peito orgulhoso. Talvez, seja fetiche de todo homem resgatar uma princesa. No caso aqui, uma gata rebelde. Dei meu melhor sorriso em agradecimento e o vi desmoronar por dentro em alegria.

---Foi nada, aquela cadela merecia!---Uma professora passou bem perto de mim e sussurrou as palavras.

----Tudo bem, agora todo mundo pro ônibus!--- Noah ordenou e os grupos começaram a entrar mas, quando Sheila passou por ele, a segurou pelo braço impedindo sua entrada.

---Acho que você tem algo a dizer pra Any, não tem?--- Noah a encarou firme nos olhos.

--- Me desculpe, querida. Sinto muito mesmo pelo o que aconteceu.---Sheila se soltou da pegada dele e se aproximou de mim estendendo a mão para que eu apertasse selando o pedido de desculpas.

Sheila tem o rosto inchado. Um olho quase não abre e acredito ter hematomas por todo o resto do corpo. Mas, caminha bem. E está pronta para outra guerra se precisar. Um banho e uma nova maquiagem, vai fazer ela parecer com as vilãs dos filmes. Plena e rancorosa.

E por um momento, vislumbrar ela numa banheira de espuma planejando uma revanche, me causa arrepios.

Apertei a mão dela simplesmente para não criar caso com Noah. E também para mostrar ao pequeno Marcos, que devemos perdoar e ser civilizados com nossas desavenças. Não consigo ainda andar sozinha. Preciso dele como apoio. E não quero que me abandone onde possa estar aquela mulher no meu atual estado deplorável.

Fico fragilizada ao perceber o quanto de fato estou apavorada por dentro. Não que tenha medo do que ela possa fazer comigo. Mas, de me envolver em problemas que possam me afastar dos meus filhos. Afinal, uma queixa na delegacia seria problema futuro num tribunal. Por que faria um juiz se questionar em dar a guarda à uma mulher que por causa de um cara bonito, quebrou a cara de outra mulher. Se colocou em risco e outras pessoas também.

Nesse momento, percebo minha imprudência. Uma náusea me invade e um ódio intenso se aproveita para torturar minha consciência. Leonardo já dizia sempre. Faça a tolice que quiser, mas planeje sempre fazer bem feita e de um modo que seja possível encobri-la ou se sair de vítima da situação. Nesse caso, talvez vítima me caia bem. Mas diante um juiz...

Estou sentada nesse banco improvisado, molhada, com frio e dor por causa daquela vibora. A obsessão dela é doentia por Noah. Perigosa e tenho medo de me deixar envolver. Ela seria uma ótima testemunha contra mim num tribunal.

----Que bom que se arrependeram do que fizeram! Foi um péssimo exemplo para as crianças!--- Noah nos repreendeu. --- Agora vamos!---Me ajudou a levantar.

Na verdade...

Não nos arrependemos de nada. Pelo menos eu. Talvez, por pirraça tenha me segurado mais firme ao pescoço de Noah ao subir no ônibus e deitado a cabeça em seu peito de propósito só para vê-la queimar de ciúmes. Mas, ele tem razão. Preciso me controlar. O que fiz foi muito errado...

Ao Acaso Do DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora