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25 de setembro de 2013

Brighton, Inglaterra – Reino Unido

— O que houve aqui?

Scarlet tinha certeza que sua imaginação não teria sido fértil o bastante para desenhar aquele cenário. Ela não falava apenas da desordem palpável no ambiente. Talvez, com um pequeno esforço que a pusesse fora de sua bolha de quase constante tranquilidade, pudesse criar a bagunça na sala de estar. A mesa, que antes era usada para servir o jantar e para que Charlie trabalhasse, fora posta de cabeça para baixo, empurrada para baixo da escada em uma tentativa de criar uma camuflagem. O grande problema vinha do fato de que o espaço ali não era o bastante, e, como resultado, uma das pernas se encaixa entre alguns degraus, outra se projetava para fora. Das quatro cadeiras, duas estavam perfeitamente inteiras; uma, porém, tivera uma das pernas quebradas ao meio e fora deixada naquela posição torta porque não havia como encaixar a abaixo da escada. Da quarta, só sobravam os restos da madeira. A televisão estava ligada, alta, estridente, um trincado disforme, com bifurcações variadas, estendendo-se em um uma versão estilizada de diagonal. Parte das almofadas — em especial aquelas cujas estampa Scarlet gostava o bastante para comentar e toda visita — estava danificada, com rasgos significativos no tecido, o interior estufando-se para fora, vazando pelo chão e pelo sofá. Algumas tinham marcas de desgaste, como se alguém puxasse com força. A coberta fina estava embolada, largada sobre o chão, próxima a um travesseiro, encostada ao sofá na pior e mais danificada versão de cama. Sobre a mesa de centro, xícaras e copos tinham se acumulado e os mosquitos que se moviam sobre eles, pousando nas bordas, fizeram Scarlet franzir os lábios. Os porta-retratos foram colocados para baixo e, com exceção da foto em que havia apenas Charlie e Baloo, não era possível ver a imagem de nenhum deles.

O aspecto emocional embutido naquele cenário é o que realmente fugia a todo o conhecimento de Scarlet. A energia, tão densa e negativa que parecia estar movimento como uma névoa preta e com cheiro podre, atingiu tão logo cruzou a porta. Scarlet tonteou. Sentiu surpresa, sentiu choque. Sentiu enjoo. Sentiu vontade chorar. Sentiu agonia. Olhou para trás e não compreendeu como seu marido mantinha a imparcialidade no rosto, o olhar sereno e calmo diante daquele caos. Depois, olhou para o filho e a saliva em sua boca engrossou, ficou densa e com um gosto pútrido.

A expressão no rosto de Jack misturava raiva, desespero e dor — o pior tipo de mistura que uma mãe poderia ver em um filho. Do lado de fora, a chuva era contínua, embora calma e compassada. Do lado de dentro, Jack era uma tempestade tropical, não prevista, criada pela pior pressão e se movendo com violência. O rastro de destruição na sala de comprovava isso. Havia um rasto de destruição no rosto. As olheiras tinham cavado a pele dele até praticamente expor os ossos, forçando os olhos a se curvarem para baixo, as primeiras, e talvez precoces, marcações acinzentadas na barba por fazer surgiam e o cabelo dele estava despenteado, como se Jack puxasse-o com as mãos. Os braços estavam menores, mais finos. Havia uma faixa rodeando o punho, com uma discreta marcação rosada em meia lua, e, onde deveria haver unhas inteiras, haviam porções razoáveis de carne avermelhada e a mostra.

— Disse que não queria visitas. — Jack disparou entredentes.

De fato, ele fora rápido o bastante em negar as mensagens encaminhadas nos dias anteriores que propunham um almoço. Qualquer outro texto que fosse enviado, fosse por Scarlet, fosse por John, era ignorado. Bastava, porém, que afirmassem estar a caminho para receber uma negativa imediata. No começo, não pareceu nada além de um comportamento padrão. Então, quando a sensação começou a tirar o sono de Scarlet, apertar seu peito de tal modo que ela se viu preparando o oxigênio reserva da sogra para tentar normalizar o desconforto, John decidiu contatar Charlie. Descobriram que ela tinha saído de casa no sábado e, com uma conversa de poucos minutos, Scarlet e John chegaram a conclusão de que tinham de interromper as mensagens e partir para a ação.

O silêncio das estrelas [CONCLUÍDA]Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon