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10 de agosto de 2013

Brighton, Inglaterra – Reino Unido

— Oi. Sou eu. Estou fazendo a segunda ligação do dia para um país que eu nem sei qual é e caindo na caixa postal. Eu não... Não estou brava, antes que pense isso. Só preocupada. Kelly tem me atualizado como pode, só que não é a mesma coisa. Você nem deve estar com o seu celular, mas... Bom... Só queria... Não sei bem o que eu queria. — Charlie tomou fôlego, esfregou a nuca, erguendo o rosto para encarar a luz do banheiro. — Espero que escute essas mensagens e ligue para mim. Não precisamos resolver nada pelo telefone. Eu só quero ouvir sua voz e... E ter certeza de que está tudo bem. É o meu aniversário e — Charlie dá um riso sem graça, perguntando a si mesma qual o motivo de ter entrado nesse tema. — e seria um bom presente saber que você está bem. 

Como em todas as mensagens que havia gravado ao longo das últimas duas semanas, mais ou menos, Charlie desligou antes que "sinto sua falta", "desculpe por ter deixado você ir" ou "eu te amo" fossem mais rápidas que seu controle e corressem para fora da boca. Ela acreditava na verdade daquelas palavras — é claro que acreditava — só que ainda não se sentia pronta para dizê-las, especialmente em voz alta. O último contato direto com Jack havia acontecido em 25 de julho, quando ele disse que precisaria se ausentar por um tempo. Charlie se lembra de ter respondido apenas "okay". Ela pensou por um tempo, tomou um banho e só então encaminhou o complemento: boa sorte, tome cuidado e volte seguro. Aquela mensagem, porém, nunca chegou a ser visualizada de fato e Charlie tem amargado isso, assim como amarga ter pego a saída mais fácil de volta para Brighton, sem nem mesmo conferir se ele havia embarcado com os amigos para sabe-se lá onde. As notícias ocasionais vindas de Kelly, sempre acompanhadas de um pedido de desculpa pelo espaçamento porque não só os rapazes estavam com problemas na comunicação, mas a base improvisada deles também, não calavam os receios de Charlie e nem chegavam perto de domá-los.

A primeira semana foi passada sobre o sofá de Diana. A princípio, Charlie sentiu uma falta absurda do trabalho e da distração que isso criava. Sem ele, sua mente era uma enorme oficina com todas as cadeiras e espaços vagos. Ela podia pensar e revisar cada momento daquele curto e fatídico final de semana em Virgínia Beach. Conseguiu reavaliar a conversa com Jack, o momento de honestidade mais brutal entre eles, de tantos ângulos e percepções distintas que, em dado momento, as palavras tomaram um significado diferente. Naquele meio tempo, Diana, Malcon e Clay fizeram um excelente trabalho mantendo Charlie atada a realidade. Nenhum deles tocava ou mencionava o nome de Jack e muito menos se dispôs a uma defesa para ele. Foi só diante do pedido dela — quando Charlie se sentiu desgastada demais para pensar sozinha — que Diana realmente expressou uma opinião. E, assim como Baloo, ela parecia bem inclinada a ideia de que, apesar do grande erro, haviam circunstâncias atenuantes que deveriam ser consideradas. E, apesar do que o incomodo de Charlie indicava com um alto grau de certeza, no final, de um jeito ou de outro, a escolha de ir também foi dele, e não dela.

No segundo dia de volta ao trabalho, Charlie também teve coragem para voltar a casa deles. Entrar ali reacendeu o latejar no peito dela. Foi como encarar Jack pela primeira vez no domingo, escutá-lo narrar cada pedaço que compunha o passado dele e tentar localizar o exato espaço em que ela se encaixava. Passando pelos cômodos, sentando-se no ateliê que, no final das contas, passou a ser só dele, Charlie também tentou encaixar todos os planos e desejos para o futuro, a visão de quem queria que eles fossem em cinco ou dez anos, com o que tinham naquele momento. É estranho que tenha sido nesse ponto, sentada entre os quadros em pré-produção de Jack, vestida com uma blusa que, há muito tempo, ela havia tomado do armário dele, que Charlie entendeu como cada teoria criada no chão do banheiro de Erin era pouco fundamentada ou baseada em uma visão equivocada, uma distorção criada pelo impacto e pelo choque.

O silêncio das estrelas [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora