22 | subestimar

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GRACE

Damian parecia relutante em aceitar que eu o acompanhasse até lá fora. Mas eu também não me entendia, não entendia por que queria tanto passar um tempo a mais com ele. Ou o conhecer melhor... Não, como se faz com amigos. Era diferente. E eu não sabia o que fazer com isso.

Meus pés descalços passaram pelo corredor levemente estreito, cheio de trepadeiras, mas de chão em pedras lisas, mas quando cruzamos a passagem do salgueiro, vi nossos pés em meio a pedrinhas, folhagens e cascalho.

Começamos a caminhar, e eu senti uma pedrinha pontuda se enfiar no meu pé, tentei não soltar um lamúrio alto, mas meu leve resmungar foi o suficiente para Damian se virar.

E não só isso, me pegando totalmente desprevenida, ele fez um movimento rápido, passando os braços em volta de mim, e em menos de um segundo, eu estava no seu colo, sendo carregada.

— Mas... — Tentei, mas a frase ficou presa na garganta. Normalmente ele não me pegava, sem antes pedir permissão. Mas... Eu... Eu não me importei. Não mesmo. — O que é isso? — Saiu dos meus lábios, na surpresa.

Ele pigarreou levemente antes de falar.

— Você ia acabar perdendo esses pés minúsculos no caminho daqui até o lago. — Resmungou.

— São menos de cinquenta metros. — Observei, um tanto ofendida.

— Você conseguiria essa proeza nos primeiros vinte. — Completou.

E eu senti algo dentro de mim, se enfurecer.

Comecei a balançar minhas pernas e me remexer para que ele me soltasse.

— ME SOLTA! EU POSSO IR SOZINHA! ME SOLTA! — Protestei, e em um bufar ele me colocou no chão, e eu saí marchando até o lago. Com pedrinhas e cascalhos me incomodando, mas isso não importava agora.

A floresta, estava silenciosa, apesar de alguns pequenos gnomos estarem aparentemente lutando entre si na beira do lago, por um fruto qualquer da mata. Eu podia ver ao longe Aurin adormecido. Uma coisa que descobri sobre abernates: eles dormem bastante. Até mesmo dias.

Damian nada disse, apenas me seguia.

Eu ja tinha notado como ele me subestima. Todos fazem isso. Me fazem sentir fraca. Eu estava cansada de ser vista assim, de ser tratada como se não fosse capaz, mesmo que muitos não fizessem por mal, mas era difícil.

Me sentei na grama em frente ao lago, que estava repleto das belas libélulas da meia noite, que só voltariam para as as profundezas do lago, com a primeira menção do dia raiar.

Pouco depois Damian se sentou ao meu lado. Perto. Ele parecia bem contrariado.

— Achei que quisesse minha companhia. — Ele observou. Eu queria... Quero. Não quero. Não sei.

O olhei de esguelha, ele estava menos tenso do que quando o encontrei na sala, mas mais intrigado. Talvez por eu ter fugido dele e de seus comentários sobre mim.

— Eu estou cansada. — Fui sincera. — Todos me subestimam. Todos. Cada um a sua forma. E você... Me trata como se eu fosse quebrar a qualquer instante. — Tive que dizer. Mesmo que fosse difícil expor pra ele.

Ele abriu a boca pra rebater. Abriu de novo. Pensou.

— É verdade. — Concordou comigo. Ele concordou comigo que me subestimava, falando a verdade certeira, como sempre fazia.

— Eu pareço assim... Tão inútil? — Perguntei erguendo meu rosto, para ver sua expressão. Eu espero que ele fale a verdade, da mesma forma, que não queria ouvir que ele pensava de mim, o mesmo que a minha família.

O que queima através de nós | LIVRO IWhere stories live. Discover now