XXVIII. UM ANJO - NÃO TÃO - DA GUARDA

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— Não pode roubar! — Eloísa gritou.

— Como você acha que ela conseguiu aquele carro? — Perguntou ele, começando a andar para fora da lanchonete e ser seguido pelas duas garotas.

— Mas você é um anjo! — a outra argumentou. — Não devia, tipo, pregar coisas boas e impedir as ruins, algo assim?

— Eu não me importo — riu a olhando com seus olhos cerrados. Eloísa abriu a boca para questionar, mas o seu botão de dane-se se acionou. Estava cansada daquela guerra.

— Você quer dar uma volta de moto, gata? — Enzo perguntou, esbarrando em seu ombro antes de ir subir na moto preta que estava prestes a roubar, isso a irritou mais ainda

Ambas entraram no veículo preto e redondo, Eloísa ao lado de Lupita no banco do passageiro. O anjo ligou o carro, mas esperou alguns segundos para ver Enzo saindo na moto roubada. Ela deu partida e ambas puderam ouvir os gritos do dono do veículo de duas rodas segundos depois. Eloísa balançou a cabeça negativamente vendo o velho barbudo xingando e elas permaneceram por mais algumas horas na estrada, até Eloísa ver a entrada do estado de São Paulo, de novo. Já era noite.

Ligou o celular, estava cheio de mensagens de uma Melissa brava e respirou fundo antes de mandar um áudio tentando acalmá-la.

— Vou precisar ligar para minha mãe — disse em tom baixo, o anjo olhou para ela com os olhos arregalados.

— Há quanto tempo está com esse celular? Droga, Eloísa... — aflita, voltou a olhar a estrada. — Podem rastrear esse negócio. Está maluca? Do que adianta eu cortar a energia de Lorenzo com esse troço tecnológico rastreável? Joga pela janela, agora — mandou. Eloísa a encarava descrente, com a boca aberta. — Agora, Eloísa — gritou, a menina abaixou a janela e jogou sem pensar. Sorte ter apenas o carro deles na estrada naquela noite. — Desculpa — sussurrou Lupita, mais gentil. — Você lembra do demônio daquele outro dia? Ela voltou para o inferno. Sei que parece estranho para você, mas fiz isso com uma seta, como essa que está lá atrás, — indicou a caixa preta no banco posterior — mas de diamante.

— Diamante? — sussurrou surpresa, franzindo a testa, logo se interessando mais.

— Sim... Só existem cinco delas no universo — revelou — e uma delas estava comigo.

— Não lembro de ver você a lançando e, definitivamente, não gostei do tempo verbal que usou — sussurrou a aflita loira, passando as mãos no cinto nervosa. — Por que ela é importante? Quando vai me falar o que preciso fazer para voltar à minha vida?

— Quando se lança uma flecha daquelas, demora alguns segundos antes que ela seja sugada — comentou — e alguém como você... não pode vê-la. — E fugiu das demais perguntas de Eloísa.

— Alguém como eu? — El sentiu seus pelos arrepiarem. Lupita lhe lançou um olhar, mas logo voltou a encarar a estrada. — Certo, precisa começar a me contar o que é tudo isso e como estou envolvida até o pescoço nessa loucura.

— Cedo demais — sussurrou para si mesma. — Eloísa, você precisa entender que não há nada de humano sobre mim, Enzo ou... você — revelou sem olhá-la.

A respiração da garota saiu cortada e ela quis perguntar novamente, mas não conseguiu. Estava com tanto medo, todos os seus membros tremiam. Viu o olhar cheio de dó do anjo em sua direção, arqueou as sobrancelhas e seus olhos se encheram de lágrimas.

— El... — Sussurrou com compaixão. — Quando souber de tudo, vai ficar com mais medo ainda, precisa ser corajosa — pediu com a voz baixa. Eloísa se ajeitou no banco, limpou as lágrimas e encarou a rodovia escura e deserta. — Estamos indo buscar a lança. Ela tem uma energia própria — esclareceu e apontou para Eloísa. — É guiada pelo colar — a garota encarou os dois colares se chocando em seu pescoço, o dela e de Lorenzo. — É feita de um material que só existe... — engoliu o seco. — Em seres únicos no universo.

As sobrancelhas da garota se tensionaram. Ela se perguntava o que mais poderiam contar, vão revelar que o Drácula existe? Apertou sua mão nos colares.

— Deus? — Quis saber a loira, Lupita riu, mas manteve-se calada por alguns instantes. — Qual é? — Indignada. — Deus mesmo? — O anjo negou.

— Eu consigo sentir o local onde a lança está — suspirou — da mesma forma que consigo sentir onde você está. É como se me chamasse...

— Por isso me achou da outra vez e agora? — El questionou — sentiu onde eu estava?

— Está pegando o jeito, garota — sorriu o anjo.

Eloísa não estava confiante, na verdade, sentia algo totalmente contrário. Nunca, em toda a sua vida, esteve tão fora de controle. Estava cansada de fazer muitas perguntas e não ter nenhuma resposta esclarecedora de Lupita ou Enzo. Não fazia a mínima noção do que aconteceria dali em diante. Ela pensou bem. Não achava mais que conseguia continuar com aquilo. Olhou Lupita e se encheu de coragem.

— Lupita, o que eu sou? — Ousou iniciar a fala, mas o impacto lateral no carro a impediu de obter a resposta.

A velocidade alta do veículo onde estava fez com que o impacto o fizesse voar. Uma... duas... três... quatro capotadas consecutivas antes de se arrastar por muitos metros. Seus vidros se despedaçaram e Eloísa apertava os olhos com força. As rodas estavam para o alto e a lataria completamente destruída. Um corte na bochecha esquerda da garota pingava sangue enquanto a pressão se estabelecia em sua cabeça virada para baixo. Ela sentia a cabeça doer e começou gemer ao tentar se mexer enquanto o cinto a segurava. Seu rosto estava completamente vermelho, como se ela estivesse prendendo o ar o tempo todo. Estava difícil respirar ou raciocinar. Com os olhos ainda fechados, mas todo o seu corpo doendo, foram assim nos segundos seguintes, até que os abrisse rapidamente, seguindo o movimento por um grito de socorro. Procurou Lupita ao seu lado, mas o anjo não estava lá. A adrenalina corria por suas veias quando gritou novamente por ajuda. Seu primeiro intuito foi tentar soltar o cinto de segurança, mas então percebeu o pedaço de vidro que atravessava seu braço esquerdo e choramingou com a quantidade de sangue que molhava sua camisa azul. Em desespero, pela dor e por logo depois perceber que o cinto tinha sido amassado e não se soltaria tão facilmente. Gritou mais uma vez quando as lágrimas deixaram seus olhos. Por mais alto que gritasse, um eco parecia prender o som dentro do carro. Sussurrou por ajuda divina. Implorou mentalmente que não fosse deixada ali. Tentou se acalmar, respirar, mas... caramba, como aquele braço queimava e sua cabeça... parecia prestes a estourar. Seu coração estava acelerado e El gritou seu nome. Foi o único nome que lembrou na hora. Enzo. Ela chamava, estava apavorada. Tinha medo de morrer. Tinha medo de não se despedir dos pais. Tinha medo do inferno. Enzo. Chamava, em súplica. Por favor. Pedia.

Notou um par de pés e se tremeu de alívio. Era ele, estava tudo bem. Só que mais deles surgiram. Piscou uma vez e já eram cinco pares de calçados masculinos e femininos. Demônios, ela sabia.

O impacto da moto contra o carro o arrastou para mais longe, fazendo o corpo da garota novamente de fantoche querendo manter a inércia. Ela gritou, mas não foi um nome ou um pedido, El gritou de pânico porque tinha medo de morrer ali. Viu pelo retrovisor o fogo que surgiu e gritou novamente, apertando os olhos e gastando toda a energia que lhe restava. Ela estava com tanto medo. Não queria morrer ali... queimada. Tinha medo do inferno. Não conseguia mais respirar. Sua garganta fechou e seus movimentos se resumiram a pulsos do seu pulmão tentando obter oxigênio.

Ela apagou. Estava assustada e estava sozinha.

FUGITIVOS DO INFERNO 01 - Ciclo Da Era [COMPLETO]Where stories live. Discover now