Capítulo XXIV

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Syran não hesitou, baixou seu machado e correu para ele. Baltazar puxou um galho de árvore para trás e o soltou. O galho enorme ricocheteou no peito de Syran e o jogou contra um cavalo enorme. A parte de trás de seu crânio se encontrou com o tronco gigante, quase o nocauteando. Mal conseguia se mover. Sua respiração estava curta e dolorosa. O sangue escorria pelo braço e se espalhava pela camisa.

Observava o rosto de Baltazar. A doninha sorria, parecendo mentalmente perturbado e satisfeito. Devia estar amando vê-lo assim, com sua energia sendo drenada e uma ferida jorrando em seu braço. Estendeu as mãos para os machados, mas eles haviam caído da sua cintura. Repousavam no chão a poucos metros de distância.

— Eu capturei muitas garotas — disse Baltazar, seguindo em frente. — Mas sua irmã foi especial.

Syran se levantou, uma onda de energia o revigorava.

— O que você disse? — perguntou. Olhou os machados no chão, sabendo que não poderia recuperá-los sem ficar vulnerável a um novo golpe. Baltazar olhou de soslaio.

— Ela lutou. Quando ficou claro que havia acabado, ela implorou. Você devia saber que ela chamou por você. Sua Sophie.

Syran mal conseguia respirar. A raiva ardente lhe deu forças. Baltazar estava mentindo, ele não estava lá. Pensaram que fosse um dos saqueadores de outra aldeia. Foi o que lhe disseram em seu retorno. Então, por que Baltazar estava contando a história de outra maneira? Por que estava brincando com ele agora?

— Como você sabe o nome dela? — Syran gritou. Olhou sobre o ombro de Baltazar, mirando em uma árvore caída. Suas raízes mortas se eriçavam do solo. As sombras a haviam matado de dentro para fora, tornando as raízes secas e cortantes. Pareciam lanças de madeira pontiagudas com as quais Syran costumava caçar.

— Ela me disse — Baltazar sibilou. — Pouco antes que eu cortasse sua garganta.

Isso era tudo o que Syran precisava ouvir. Descontrolou-se, suas lembranças iam voltando todas de uma só vez. O pescoço dela, havia sido aberto com um corte, crostas de sangue pretas haviam se formado ao redor do ferimento. Ele correu sua mão por cima do vestido dela, e sentiu outro corte logo abaixo das costelas. Continuou a olhar para seu rosto, se perguntando que tipo de monstro poderia machucar uma garota como aquela. Que em seus pouco mais de quinze anos de vida, nunca havia feito mal algum a nenhuma criatura na Terra... Que tipo de homem covarde e sem alma poderia tirar a vida de Sophie?

Agora ele sabia.

Avançou em Baltazar, não se importando com a espada levantada em sua mão, que tinha a lâmina afiada o suficiente para decapitá-lo. Só abaixou seu ombro enquanto corria, desferindo um golpe no meio do abdome de Baltazar. Eles voaram para a árvore. Baltazar caiu sobre as raízes com muita força. As raízes afiadas cravaram-se em sua pele. O bastardo uivava em agonia.

Seus gritos só aumentavam a raiva de Syran. "Este homem matou a Sophie" — não parava de pensar enquanto empurrava os ombros de Baltazar para baixo, espetando-os sobre as raízes da árvore gigante. Não parou até que elas romperam a frente da camisa dele. Baltazar se contorcia em agonia, tentando se libertar dos galhos, mas Syran o empurrava para baixo.

— Ismalia! — Baltazar gritou. Derrubou a cabeça para trás. — Me cure, minha rainha!

As sombras giravam em torno deles. A fumaça preta se enrolava em torno das extremidades da árvore afiada, tentando curar suas feridas, mas era impossível. As raízes as mantinham abertas. Baltazar sangrava, os cortes estavam em carne viva.

Ainda assim, a nuvem negra circulava.

— Minha rainha? — Baltazar engasgou. Syran não soltou os ombros dele. Continuou o empurrando para baixo, vendo-o morrer, as lágrimas escapando do canto dos olhos.

— Você a matou — sussurrou e viu que a luz deixava os olhos de Baltazar.

Quando Baltazar finalmente se foi, com seu corpo mole contra as raízes da árvore, Syran se afastou. Não se sentia poderoso ou valente. Não estava satisfeito consigo mesmo ou muito feliz com o que tinha feito. Mas havia um consolo na morte de Baltazar. E não era a seu favor, pela primeira vez. Syran pensava em Alvo. Talvez a morte de Baltazar indicasse que Alvo poderia viver livre agora. Talvez ele pudesse viver em paz, em Carmathan.

Quando voltou para a floresta, os homens de Baltazar estavam todos mortos. Os anões, guerreiros ferozes, cuidaram deles um a um. Syran focou em Alvo e os outros, que estavam aglomerados em torno de alguém. Ao se aproximar, pôde ver que era Gully, o mais novo. Seu rosto estava pálido. A flecha ainda estava alojada em seu peito, logo acima do coração.

Alvo baixou a cabeça, as lágrimas ensopando a camisa de Gully. Syran deu um passo para trás, com o rosto nas mãos. Os anões começaram a cantar uma canção fúnebre. Suas expressões eram tensas e tristes enquanto cantavam. Cantavam canções de amor e amizade, de vida e de morte, em voz alta. Suas canções encheram a floresta. Nada podia aquecer o ar. Os animais não saíram de baixo da terra. As fadas haviam desaparecido. A nuvem negra que havia descido sobre eles ainda permanecia ali, circulando-os em colunas escuras e retorcidas.

Quando a música terminou, Beith e Nion trouxeram braçadas de madeira para queimar na pira funerária. Brida colocou pedras no chão em um grande retângulo, fazendo uma cama para Gully repousar. Moveram seu corpo minúsculo, empilhando os galhos em cima dele e cruzando-os até que ele desapareceu sob a madeira. Muir, o mais velho, acendeu a pira.

Ficaram ali, todos juntos, assistindo enquanto ela queimava. As chamas cresceram. Os galhos estalavam, pipocando enquanto eram engolidos pelo fogo. Alguns dos anões choravam. Qual deles, Syran não sabia. Tudo o que ouvia eram os soluços baixos do Príncipe, sua imensa tristeza que provocava arrepios em sua coluna. Continuou olhando para ele, desejando tomar a dor dele para si. Mas, conforme a noite caía, a tristeza deles só crescia. Aquele não era o fim da batalha, era apenas o início, pois sua rainha má e demente ainda estava viva.

A Caça ao Cervo Real [Romance Gay] - Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora