Capítulo VI

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Água o sugou para dentro de um tubo longo e estreito. Ele sentiu as paredes se fechando sobre si, seus ombros raspavam nelas. Encolheu-se o quanto foi possível, cruzando os braços sobre o peito e cruzando as pernas. Não se atreveu a lutar, pois estava com medo de ficar preso.

Algum tempo depois, saiu em águas abertas, tendo seu corpo finalmente livre. Seus pulmões estavam latejantes. Queria desesperadamente tomar fôlego. Olhou para a superfície da água, que estava cerca de seis metros acima dele. Algas flutuavam na superfície, gerando sombras em seu rosto. Chutou com força em direção ao Sol, mas, quando chegou às algas, viu que a camada era muito espessa. Elas se emaranharam em torno de seus braços e pernas e o arrastaram para baixo.

"Isso não pode estar acontecendo", pensou. Chutava a água freneticamente tentando se libertar, mas um pedaço de alga ainda estava enrolado em sua perna. Continuou sacudindo os braços até que a superfície da água estava a centímetros dele. Seus pulmões doíam. Com alguns pontapés desesperados, finalmente se libertou e rompeu a barreira, emergindo para o ar livre.

Arfou para respirar. Podia ouvir o som distante de cascos na pedra. Os soldados estavam atrás dele. Olhou para a praia, a apenas 30 metros de distância. O Castelo era aninhado na encosta. O penhasco ao lado dele estava coberto de arbustos. Nadou para a terra, grato quando as ondas o impulsionaram para a praia. Ele não tinha muito tempo.

A praia era coberta de grandes pedras cinzentas. Estavam dispostas em fileiras, criando um enorme labirinto, que se estendia pelo comprimento da areia. Alvo se aproximou da primeira entrada de pedra. Aquilo era mais alto do que ele, as paredes cobertas por cracas e algas ressecadas. Seguiu em frente, serpenteando pelo labirinto, mas, quando a passagem de pedra se bifurcou em duas, não sabia por qual caminho seguir. Sua memória de infância era menos distinta quando pensava no labirinto.

Sua roupa estava encharcada e ele tremia de tanto frio. Ouvia o som de cascos nas pedras. O exército estava se aproximando. Baltazar certamente já havia alertado Ismalia. Se ele não o encontrasse, a magia de Ismalia certamente o faria. Ela teria seu coração.

Alvo escolheu o caminho da direita. Suas mãos tremiam. Estava prestes a contornar uma esquina quando o som de um assobio suave chamou sua atenção.

O pássaro azul havia voltado. Estava apoiado no muro de pedra a esquerda. Ele vôou na direção oposta. Alvo o seguiu até a praia, serpenteando para dentro e para fora entre as enormes pedras, até que o caminho desembocou na areia. Poucos metros à sua frente havia um lindo cavalo branco, que estava parado na praia de uma maneira que nunca tinha visto um cavalo fazer antes, como se estivesse apenas esperando que ele o montasse. O som dos cascos se aproximava.

— Ali! — uma voz de homem gritou. Olhou para o penhasco acima. Os dois primeiros soldados a cavalo surgiram das árvores. Um lhe apontou um punhal de prata. Ele não hesitou. Correu para o cavalo, saltando sobre o dorso do animal. O cavalo se levantou e partiu pela praia rochosa.

Galopou pela costa, as ondas quebrando ao seu lado. Alvo olhava para trás, seu cabelo era uma bagunça preta. O ar salgado que vinha do oceano fazia seus olhos arderem. O exército de Baltazar desceu o penhasco rapidamente e estava muito próximo deles.

Finalmente, o pássaro virou a direita, de volta para o continente. O cavalo o seguiu rumo a floresta densa, e oi exército perseguia o príncipe por entre as árvores.

Ele reconheceu a terra de sua infância. Eles estavam do lado de fora de uma das aldeias. Mas, conforme se aproximava da aldeia, Alvo mal a reconhecia. A maioria das casas eram pilhas de escombros queimados. Outras estavam fechadas com tábuas. O velho poço no Centro da aldeia estava selado.

O cavalo manteve o ritmo. No final do caminho de terra, algumas crianças surgiram de uma casa de palha. Havia buracos enormes no telhado. Alvo deu um tapa no corpo do animal, mas ele se recusou a parar. Conforme as crianças se aproximavam, ele viu o porquê. Havia pânico nos olhos delas. Estavam todas muito magras, pareciam esqueletos ambulantes. O nariz de uma delas sangrava. Outra era tão frágil que mal conseguia ficar de pé. Moviam-se lentamente, fitando o cavalo com uma estranha curiosidade.

Alvo partiu para a floresta, mantendo os olhos no pássaro azul, quando ele passou sobre uma colina. Além da ladeira íngreme, havia uma parede de árvores antigas. Seus troncos tinham mais de dois metros de diâmetro. Alvo engoliu em seco. Ele tinha ouvido falar da Floresta das Sombras quando criança. Sua mãe costumava contar histórias da magia contida na floresta: plantas que se enrolavam em torno das pernas, criaturas estranhas que assombravam a vegetação rasteira e areia movediça que poderia engolir uma pessoa inteira. Ninguém que entrou nas profundezas da Floresta das Sombras saiu vivo.

Olhou para trás. O exército de Baltazar estava subindo a colina. Dentro de minutos, estariam em cima dele. Encorajou o cavalo a ir adiante. O cavalo hesitou. A floresta estava envolvida por um denso nevoeiro, que se esparramava por entre os troncos. Ele não conseguia enxergar um dedo à sua frente.

— Vamos — Alvo sussurrou, esfregando o pescoço do animal.

Começou a entrar na floresta, a névoa o cercando. O pássaro havia desaparecido no nevoeiro espesso. Olhou para os ramos das árvores. Aves estranhas se expunham acima, seus gritos guturais causavam arrepios em suas costas. O cavalo se movia de forma vagarosa. Alvo respirou profundamente, suas mãos tremendo. O som dos homens de Baltazar desapareceu no ambiente. Ele só conseguia ouvir a Floresta e seus ruídos terríveis. O cavalo deu um passo à frente, depois outro e depois o chão cedeu sob seus pés. Ele recuou, derrubando o Príncipe Alvo, que bateu no chão duro e arfou para conseguir trazer o ar para seus pulmões. Quando olhou para cima, o cavalo havia desaparecido em meio à névoa.

Ficou ali por um momento, tentando recuperar o fôlego. O chão estava molhado. O musgo espesso se movia furtivamente entre seus dedos, como se estivesse tentando engoli-los. Podia ouvir os passos macios de homens por perto, conforme caminhavam pela floresta. Levantou-se e começou a se afastar deles, incapaz de ver até mesmo o chão sob seus pés. O nevoeiro o envolveu. Olhou para trás e viu brevemente a silhueta de um homem. Correu mais rápido, tentando fugir. Continuava avançando, sua respiração, áspera e irregular, até que seu pé ficou preso sob uma raiz de uma árvore gigante, lançando-o pelo ar. Ele aterrissou com um baque e uma área de cogumelos roxos e vermelhos.

Uma nuvem de pólen se levantou ao seu redor. O pó pegajoso se depositou em cada centímetro do seu corpo. Soube, em um instante, que algo estava errado. Sua cabeça estava leve. Sua visão, turva. Levantou-se tentando fugir, mas a Floresta das Sombras parecia ainda mais estranha do que antes. As árvores pareciam figuras encapuzadas e ameaçadoras, esperando para levá-lo de volta ao Castelo.

— Você não deveria ter saído, meu caro — sibilou uma delas, seu ramo serpenteando para fora para tocar sua bochecha.

Outra coxeou em sua direção, levantando suas raízes gigantes com grande esforço.

— Vejam o que temos aqui. Um Príncipe. — A árvore se debruçou em sua direção. Alvo olhou para seu rosto escuro, a casca marcada por um machado.

— Afaste-se de mim — murmurou. Sua boca estava cheia do pólen. Sentia-o em sua língua. — Me deixe em paz.

Mas a floresta estava se fechando.

— Por favor, não... — gritava enquanto eles o perseguiam no denso bosque. — Fiquem longe de mim. — Ele estava muito tonto. Seu corpo parecia amarrado em pedras. Esforçou-se para manter os olhos abertos enquanto seguia para longe dos homens de Baltazar. Mas, em questão de segundos, ele caiu e o pólen mágico o enviou para um sonho pesado e estranho.

A Caça ao Cervo Real [Romance Gay] - Livro IWhere stories live. Discover now