41 - Outra dimensão

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Eu precisava aprender a controlar a minha magia. Para minha sorte, John voltou ao seu bom humor habitual e aceitou com muita naturalidade o fardo de ajudar a salvar o mundo. No lugar dele, acho que eu teria me ressentido mais.

— Por que ela não consegue? — ele perguntou.

Todo mundo estava com os olhos em mim. Isso me deixava ainda mais nervosa.

— Ela está resistindo. — Selva cruzou os braços.

Eu não conseguia criar as passagens que me foram concedidas como dom natural. John era um híbrido mais fraco do que eu e já conseguia, só que ele só conseguia alcançar dimensões pequenas.

— Pare de tentar controlá-la. — Selva olhou fundo nos meus olhos.

— Eu estou tentando. — o meu coração estava acelerado de medo. Se eu não conseguisse aqui, sã e salva, como conseguiria lá em baixo?

— Está reprimindo a sua magia! — ela gritou. — Porque tem medo que ela te controle! Então a guardiã mais poderosa do mundo não pode imitar sequer os passos de um híbrido que possui um resquício do poder que ela tem?!

A guardiã mais poderosa do mundo?!

— Espera aí! — falei. — Está falando de mim?

Selva suspirou, cansada.

— Francamente, não sei como não percebeu. — respondeu me encarando. — Aquele dia, na cabana, o presente que o Sr. M. deu a você... ele te deu a magia dele.

Elisa arfou. Não! Isso quer dizer... que vai acontecer com ele... o que aconteceu comigo.

— Como... como você sabe? — gaguejei.

— Porque foi ele que me pediu. — ela respondeu. — O meu papel era levar você lá.

Mais uma vez a filha da lua agira por baixo dos panos.  

— Posso devolver! — a ideia me passou pela mente.

— Não pode. — Selva respondeu. — A magia não pode ser fragmentada. Se devolver para ele, será a magia total. É você ou ele. E eu não vou voltar à Shangri-la para buscar nada para você!

Elisa, de cabeça baixa, não conseguia esconder a tristeza. Aquilo nem tinha começado e já não sairíamos sem baixas.

— Uma vida pela de milhares. — Selva acrescentou. — Então, guardiã, não faça vão tal sacrifício. Você tem o poder necessário. Liberte-o.

Sr. M confiou em mim, acreditou em mim o suficiente para se sacrificar. Não posso tornar a morte dele vã.

As vozes se distanciaram. Minha mente submergiu em névoa. Abri mão do controle.

Quanto mais a magia enlaçava os dedos no meu coração, mais a minha mente submergia no inconsciente. Senti medo do poder me dominar e me deixar louca.

A realidade voltou com tudo e o meu cérebro latejou.

— Concentre-se! — Selva deu um berro no meu ouvido.

— Não sei se consigo fazer isso!

— Você pode! Acredite em si mesma porque nós não temos outra pessoa em quem acreditar. — ela estava apostando todas as fichas em mim. Selva colocou John parado à minha frente. — Está pronta?

— Eu vou tentar.

— Resposta errada. Você vai conseguir! — Selva me encarava com serenidade e firmeza. — Nunca duvide de si mesma, guardiã. Essa é a pior derrota de todas. Então, mais uma vez. Está pronta?

— Estou. — um leve sorriso curvou um canto de sua boca. Era muito estranho que ela sentisse orgulho de mim.

Esava na hora de criar um espectro. Eu precisava encontrar, em algum lugar perdido nas dimensões, um lugar ausente de magia. Um lugar morto e vazio.

Coloquei a minha mão sobre o coração de John, a palma formigou com o calor. Ele será usado como um amplificador. Reprimi o medo da loucura. Dava para sentir a sensação escorrendo pelas minhas veias, misturadas ao vermelho do meu sangue.

Eu não tinha mais visão, audição, tato, respiração, fala. Não tinha mais pulsação. O meu corpo estava leve como se fosse um espírito. Não existia mais nada me envolvendo, eu não tinha lacre. O entorno desapareceu. O tudo era mudo... e vazio.

A loucura riu com escárnio. A gravidade me engoliu e agarrei os ouvidos, mas a risada de insanidade estava dentro da minha mente, não fora. Abri os olhos, ofegante.

— Que lugar é esse? — ouvi a minha própria voz ecoar na escuridão, reverberando pelo negro opaco.

Onde ela está?! — me virei instantaneamente para a voz distante.

Eu conheço essa voz quente e escura. Gael.

O que você fez com ela?

Comecei a caminhar sobre o breu, seguindo a voz como um raio de luz.

— O que você fez com ela?! — ele estava desesperado.

Alguém respondia alguma coisa abafada.

Não me interessa! — Gael berrava. — É melhor trazê-la de volta, seu desgraçado...

Gael? — falei. Ele parou. Tudo continuava escuro e inalterado onde eu estava, mas podia ouvir o som desregulado da respiração dele. — Para de gritar.

Alma?! — choque e estupefação.

— Modos! Por favor. — pedi. — O que eu já falei sobre controlar melhor o seu temperamento?

Carissimi! Onde você está?

No lugar que vim procurar. — dei uma última olhada naquela escuridão com um sorriso de satisfação.

O mundo se tornou outra vez silencioso e a selvageria me percorreu. Em um instante, estava de volta.

— Merda! — Gael me abraçou com força. — Pare de me deixar para trás! Já perdi você vezes o suficiente. Não me importo de segui-la para onde for, apenas... não me deixe aqui.

— Que meigo! — John deu um pigarro.

— Miserável! — Gael partiu para cima dele. — Você mandou ela para outra dimensão, idiota!

— Não foi ele quem me mandou! — me coloquei entre os dois que queriam um rápido e agressivo confronto corporal. — Eu levei a mim mesma.

— Já acabou a ceninha de ciúmes? — o semblante de Selva expressava o mesmo desprezo evidente da voz. A minha cara queimou de vergonha.

— Eu consegui. — falei. — Consegui encontrar o espectro vazio.

— Ótimo. — Selva olhou a tempestade na borda. — Então vamos descobrir o que tem lá em baixo.

 — Então vamos descobrir o que tem lá em baixo

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Tadinho do Sr. M. =( vou sentir saudade dele.

Se gostou não esquece a estrelinha. Bjos.

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