prologue

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concluído; em processo de revisão;
sujeito a alterações

Verão de 2017

Para mim, a complexidade de mudanças era labiríntica; não reagia bem a elas, como a maioria das pessoas. Ainda me recordava bem de minhas primeiras semanas de aula na Sto. Frederick, do som do sangue pulsando em meus ouvidos e dos pesadelos horrendos que as freiras me causaram neste ínterim. É difícil transitar de algo que se ama porque, subitamente, já não lhe faz bem. Doía saber que retroceder nos foi necessário. Havia dias da decisão tomada de mamãe, mas já estávamos outra vez em Monroe, uma vilazinha estupidamente alegre e bem-disposta na Paróquia de Ouachita. Seus argumentos eram bastante convincentes e tentadores, para ser honesta, porque não era uma tarefa árdua me convencer de que uma escola católica sem vida e ledices deveria ser deixada para trás — mais uma vez. Mas ela definitivamente se precipitara ao esperar que eu estivesse aberta a uma expansão da minha vida social. Tinha o suficiente, não precisava de mais. Mantinha minha expressão de poucos amigos por onde passava e, assim, obtinha sucesso ao tentar espantar moradores animados de perto. A despeito de minha antipatia e resistência, precisava assumir, Monroe era um lugarzinho bonito, verdejante e calmo.

Millie Brown, onde você está? — Sadie questionou-me impaciente ao telefone, irresignada com o meu atraso. Inspirei algum ar fresco antes de cruzar as portas grandes e translúcidas d'O Vagão Vermelho. Fui recebida pela atmosfera quente e agitada do local, o falatório da mesa atrás de Sadie se sobressaindo acima do borbulhar do óleo fervente na cozinha.

— Aqui. Não precisa de toda essa irritação — me sentei no banco à sua frente e apoiei os braços na mesa rústica. — Por favor, Sadie, me diga que era algo realmente importante.

— Importante? — ela se esforçou para conter o riso, dispensando a ideia com um aceno pouco antes de mordiscar sua batata. — Já é hora de aprender a não confiar em mim, Mills.

— Droga, Sadie! Eu estava lendo!

— Você faz isso o tempo todo, eu lhe fiz um favor — concluiu a ruiva, sacudindo os ombros — Sabe, você deveria sair mais. Passa o dia inteiro enfurnada na biblioteca, só lendo, lendo e lendo — ela aumentou gradativamente o tom de voz. — O que livros têm de chatos essas batatas têm de sabor. Francamente, esse lugar é bom demais para ser real...

— Veja bem, livros chatos têm lugares alternativos muito melhores que algumas realidades por aí. Por isso não sinto nenhuma necessidade de sair de casa, já visitei muitos mundos diferentes. E nunca mais ouse insultar meus pequenos dessa forma! — tive de falar mais alto que o de costume, sentindo uma raiva crescente nascer pelo grupo barulhento da mesa mais próxima. Todos falavam tão freneticamente que só podia ser sobre alguma teoria marvelística, dada a forma com que se trajavam, cada qual com uma camiseta de personagens distintos.

— E como vai a vida nas suas outras dimensões? — berrou. Era como se a reconstrução do Muro de Berlim acontecesse bem ao nosso lado. Meus ouvidos se concentraram no menino sarapintado que falava mais alto, tentando se sobressair, dizendo algo sobre uma tal de Jean Grey. — Caramba...

— Que foi? — sustentei o olhar com o garoto de cabelos cacheados que parecia ter engolido um megafone, e isso aparentemente o calou, tendo sido algo mais eficiente do que eu pensei que seria.

— O com a camiseta do Steve. Nossa — ela apontou para um dos meninos atrás de nós, sorrindo momentaneamente para o de pele negra e abanou o ar nos arredores do rosto, rindo com nervosismo. — Está quente, não acha?

— Você vai acabar é incendiando esse banco.

Era indiscutivelmente barulhento e azucrinante. Eles falavam cada vez mais alto, e, naquele momento, tudo o que conseguia imaginar era a sensação de paz que esfregar a placa do silêncio da Sink na cara de todos eles me traria. Eu e o cacheado sarapintado nos olhamos com expressões hostis, enquanto ele tentava organizar a mesa transbordando exemplares de almanaques famosos, refrescos e batatas em que estava.

ventured to say ˓ fillieWhere stories live. Discover now