36ª dose

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Depois do quase beijo, Ítalo se desculpou. Conversamos sobre coisas aleatórias e, quando um vento frio começou a soprar, ele me abraçou e ficamos assim até duas e meia da manhã. Não teve nada romântico nisso. Eu não pensei em nada além de tentar adivinhar o que Ítalo está sentindo.

Passei dois dias na casa dele ignorando meus pais. A única pessoa com quem resolvi falar foi Jessica. O clima está horrível. Ítalo não fala com Rômulo e eu tento não falar também, mas Rômulo provoca. Reclama de estar dormindo no sofá da sala e tenta perguntar coisas sobre o meu filho. Eu até tento me manter quieta, mas ele me deixa com muita raiva.

Fui para casa pegar umas roupas e minha mãe estava sentada na sala assistindo a um programa qualquer. Dou um "boa noite" rápido e caminho para o meu quarto. Eu sei que ela vai vir atrás e isso se confirma um minuto depois. Eu não queria precisar vir aqui porque eu sei que minha mãe vai dizer algo que não vou gostar.

— Vai dormir lá de novo, Julia? — Ela se encosta na porta e fica me olhando de braços cruzados. — Vocês não estão juntos. Qual a necessidade disso?

Respiro fundo enquanto coloco algumas peças de roupas em minha mochila. Não quero discutir, e sei que ela vai fazer perguntas para as quais não tenho resposta.

— Sinto que ele precisa de mim.

— Você ainda está apaixonada por ele?

— Não, mãe! — balanço a cabeça negativamente. — De jeito nenhum.

— Não? E onde está aquela sua tentativa de recomeço com Bernardo? — ela diz baixo, sentando-se na minha cama. — Ítalo sabe se cuidar sozinho.

Fico pensando no que minha mãe diz e entendo seus motivos para estar chateada. Eu não preciso dormir com Ítalo, já que o problema não é meu, mas algo me faz voltar toda vez que tento ir embora. Ela nunca vai entender isso. Meu pai sempre foi perdidamente apaixonado por ela, e meus avós são uns amores. Eles nunca passaram por nada parecido, então não sabem o que é.

— É uma situação complicada.

— Uma situação que você não precisa se envolver. Lembra que estresse faz mal ao Valentim? Você quer isso?

Não desejo mal ao meu filho, mas não estou estressada. Me sinto bem quando estou com Ítalo. Agora, sem as brigas, é fácil lidar. Pode parecer injusto, egoísta e até desumano, mas o Ítalo que não sabe como agir diante de um pai que o desprezou me traz paz. Esse Ítalo machucado não me estressa. E é por isso que fica mais difícil não ceder a tudo o que sinto.

Continuo a arrumar minhas coisas e me deito na cama, deixando a mochila no chão. Olho para o teto e sei que minha mãe continua ali, me observando, esperando uma resposta.

— Não é justo com ele, Julia!

Foi a única coisa que minha mãe precisou dizer para a ficha finalmente cair. Sabemos quando estamos errando, mas o impacto é maior quando alguém nos alerta. Bernardo não merece o que estou fazendo. Estar exageradamente apaixonada por Ítalo e nem tentar modificar isso é colocar uma corda bem apertada em Bernardo o impedindo de conhecer alguém que dê o valor que ele merece. Se for preciso ficar sozinha para esquecer Ítalo, farei isso. Um amor nunca se cura com outro amor. Sempre alguém acaba perdendo ou se machucando. Me sinto cada vez mais ridícula quando penso no que fiz e no que sinto.

— Preciso contar para Bernardo, ?

Ela sabe do que estou falando. Não preciso olhar para saber que ela me entendeu. Assim que fico sozinha, digito o número de Bernardo e uma hora depois ele está com aquele carro chamativo na frente do meu portão. Entro e ele me leva a algum lugar mais sossegado. O caminho todo tento ficar perdidamente apaixonada por ele. Observo com detalhes cada movimento que ele faz, cada traço nesse rosto mais chocolate que o meu. Quero tocar Bernardo. Penso nos filmes e quase peço para ele seguir a estrada e sumirmos por um tempo, mas na vida real nada é fácil.

Quando estiver sóbrio (COMPLETO)Where stories live. Discover now