22ª dose

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Ítalo passou um tempo com aquela garota ontem. Quando olhei novamente na direção dele, a menina já estava saindo com duas amigas, e Ítalo não foi atrás. Depois da festa, Bernardo me avisou que ele dormiria em sua casa, então convidei Jessica para dormir comigo. Yara já me disse várias vezes que posso chamar minhas amigas para passar a tarde e até dormir lá. Ela quer que eu me sinta em casa e faça tudo o que costumava fazer, então aproveitei a oportunidade para chamar Jessica. Rimos a noite inteira e, confesso, estava sentindo muita falta disso.

— Então é aqui o quarto erótico? — Jessica diz, sentando na cama.

— Erótico só nos meus sonhos, né?

— Admitiu que sonha em transar com Ítalo de novo.

Não respondo. Jessica me deixa envergonhada por ser tão direta. Ela está andando pelo quarto, observando cada detalhe. Vou para o banho tirar o cheiro de cerveja que derrubaram em meu pé. São cinco horas da manhã e eu não sinto nenhum pouco de sono.

— Não sabia que Ítalo desenha — ela diz, olhando os quadros na parede. — Alguma coisa ele faz bem.

— Não foi ele quem fez.

Ela aponta para umas siglas bem pequenas no final da folha, e minha boca se entreabre. Foi uma das primeiras coisas que reparei ao entrar no quarto de Ítalo, mas nunca imaginei que fosse ele quem desenhou aquela casa na fazenda e o carro todo cheio de detalhes. Toco as siglas "I.M" e não sei o que dizer para Jessica. Ele me confessou que desenha no dia em que conversamos sobre nosso filho, mas não dei muita importância na época. Ítalo parece um profissional. Há mais sobre ele que eu não sei do que imaginei.

Jessica só foi embora domingo de tarde. Conheceu Yara e gostou muito dela e de suas loucuras. Ítalo só apareceu segunda-feira depois do trabalho. Pensei que nem falaríamos sobre o que aconteceu, mas ele estava irritado. Como se eu que tivesse feito todo aquele show. Fico em silêncio, observando-o jogar a mochila no outro sofá e me encarar com aquele olhar carregado de ódio. Não consigo entender como tudo mudou tão rapidamente.

— Que foi, Ítalo? Fiz algo dessa vez? — pergunto, enquanto troco de canal na TV.

Ele solta um suspiro exasperado antes de responder.

— Você podia sair da minha vida.

— Infelizmente, vou ter um filho com você — respondo calmamente.

— Não precisamos manter tanto contato — ele insiste.

— É só você não falar comigo — retruco, mantendo-me firme.

Ele hesita por um momento antes de falar, sua voz soando pesada.

— Seria meu sonho não precisar falar contigo nunca mais. Eu não gosto de você, Julia.

Ele sai da sala e vai para o quarto. Sua habilidade em criar conflitos é desconcertante. No entanto, prefiro manter o silêncio. Estou chocada demais para formular qualquer resposta. Parece que ele esperava que eu provocasse uma briga na festa. Ele queria um confronto, uma explosão entre nós dois, mas eu me segurei.

— O que foi, minha querida?

Tenho chorado com mais frequência do que o normal ultimamente. Os hormônios da gravidez têm mexido comigo de formas imprevisíveis. É um turbilhão de emoções para lidar, e tudo o que eu queria era ter paz com Ítalo durante um mês inteiro.

Yara me olha com preocupação, seus olhos expressando uma mistura de compreensão e carinho. Ela se aproxima e me abraça, oferecendo um conforto silencioso que eu tanto preciso.

— Seu neto é um idiota. Eu o odeio!

— Tanto tempo juntos e não conseguiram se entender?

Na verdade, estamos forçando demais uma convivência desnecessária. Eu não preciso de Ítalo e ele não precisa de mim. As coisas podem ser mais simples. Eu já poderia ter resolvido isso, mas cada vez que começo a arrumar as coisas, ele diz alguma coisa boa e faz eu me sentir segura. Toda vez que dobro minhas roupas para colocar na mala, Ítalo sorrir e mostra que vai ser um grande pai, então eu esqueço minha vontade de ir embora e agarro sua mudança como se fosse ser incrível sempre. Mas existe o dia seguinte e depois ele não é o cara legal que eu dei secretamente mais uma chance. Ele não é aquele cara que nem sabia que eu estava tentando ir embora e, mesmo assim, me impediu de partir com seu sorriso, sua mão na minha e suas frases perfeitas. No dia seguinte ele chega do trabalho e diz que não gosta de mim, e dói porque eu sei disso e ainda permaneço aqui.

Quando estiver sóbrio (COMPLETO)Where stories live. Discover now