25º dose

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Agora é a minha vez de ouvir tudo o que Ítalo tem a dizer. Ele não me olha quando volto para a sala de espera, nem quando me entrega o fone. Nossas mãos não se tocam como nos filmes românticos. Ítalo está ali, quieto e inexpressivo, enquanto meu coração bate tão rápido que penso que seja audível.

Ele entra e eu me sento, colocando o fone de ouvido. O fone é grande demais para a minha cabeça, mas isso é o de menos. Ao escutar a voz de Antonella, um arrepio percorre minha espinha. É hora de eu saber o que Ítalo pensa, e a incerteza é quase palpável. Após as perguntas normais, Antonella faz aquela que temo pela resposta:

— Por que a fez perder o emprego?

— Não era bom o bastante — ele repete o que disse para mim.

— O que você acha bom o bastante? — Ele não diz nada e ela continua. — Então por que achou que aquele, em especial, não era o bastante?

— Apenas senti que não era. Fui pela a minha intuição.

— Isso quer dizer que você se preocupa com ela?

— Me preocupo com meu filho. Se é ela quem está carregando, então sim. E eu já me arrependi.

— Por que se arrependeu?

Já memorizei as expressões e os gestos dele. Quase consigo vê-lo mexer no cabelo e bater com as pontas dos dedos na poltrona verde escuro. Vejo a perna direita balançar deixando claro que está nervoso ou desconfortável demais com aquela pergunta e aquele lugar. Sei que Antonella vai olhá-lo da mesma forma que olhou para mim. Há algo bom naquele rosto que transmite confiança.

— Porque não é algo que eu faço normalmente. Fiz por impulso.

— Já teve sonho em formar uma família?

Ele assente e eu posso jurar que não sabia disso. Mesmo sem vê-lo, consigo imaginar Ítalo sentado todo largado na poltrona, com sua expressão de tédio visível. Mesmo que ele pudesse me escutar, eu não iria reclamar. Ele está se esforçando. Terapia não é algo que ele faz normalmente, e nem eu. Quando penso em Ítalo na frente de Antonella, percebo o quanto ele respeita sua avó, pois essa é a única explicação para ele estar ali.

— Já! Mas aí eu vi que existem coisas mais divertidas.

— Exemplo?

— Futebol. Bebidas. Amigos. Festas, — Ítalo diz, calmamente. Consigo imaginar sua expressão enquanto fala. — Até uma TV ligada em um programa chato de domingo é melhor do que ter uma mulher reclamando por tudo enquanto seu filho chora e você não sabe o que fazer.

— Essa é sua visão de família?

— Agora é!

Ela pergunta se essa visão de família é especialmente comigo, e ele diz que sim. Ela pergunta o motivo, e ele responde que eu reclamo muito e que sabe que isso vai piorar quando o nosso filho nascer. Fico irritada com as respostas dele, mas tento me acalmar. Se eu reclamo por tudo é porque ele me dá motivos. Eu não reclamaria se ele fosse sempre uma pessoa calma, engraçada e companheira, como foi no dia em que descobrimos o sexo do bebê. Se ele fosse um pouquinho melhor, as coisas dariam certo.

— Já teve algum momento que você se sentiu feliz com ela?

— Dois momentos.

— Pode me contar quais foram?

Estou muito nervosa. Não sei se minhas respostas causaram a mesma coisa nele, mas as deles está causando algo bem desconfortável em mim. Quero ir embora, mas, pelo o meu filho, eu tenho que continuar aqui.

— O dia que vi que seria um menino e quando deitou ao meu lado colocando a minha mão na barriga dela. Eu pensei "Agora vai", mas só foi aquilo.

— "Agora vai" significa basicamente o quê?

Quando estiver sóbrio (COMPLETO)Where stories live. Discover now