31/12/2018

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Acordei sei lá quanto tempo depois e com uma forte dor de cabeça que me incomodava bastante, sem contar o fato das minhas mãos estarem amarradas e presas numa árvore atrás de mim. Minha visão estava turva e eu me senti bastante desorientado nos primeiros instantes após recuperar a consciência.

Por algum motivo eu permanecia ainda na floresta, talvez tivesse acordado antes dos infelizes me levarem pra seja lá onde for o acampamento deles. Ao passo que minha visão foi retornando, assim como meus outros sentidos, passei a olhar ao redor a procura de algum sinal de Barbara ou de qualquer um a minha volta.

Não consegui enxergar ninguém e nem ao menos ouvir conversas, risadas, sussurros ou qualquer tipo de som comumente feito por pessoas. A minha frente vi algumas pedras aglomeradas em forma de circulo e um pouco de fumaça que aparentava serem os resquícios de uma fogueira.

Aproveitei que pelo jeito havia sido deixado sozinho por um tempo para tentar me desatar das amarras só que eu ainda estava sem forças e mal consegui mexer meus braços. Forcei meus pés contra o chão e com as costas encostadas na arvore fiz um movimento para tentar me erguer, consegui levantar alguns centímetros mas caí logo em seguida.

Continuei tentando executar a manobra por mais algum tempo e interrompi as tentativas quando ouvi passos e percebi que alguém se aproximava. Sentei-me novamente ao chão e fingi que ainda estava desacordado.

- Esse é o seu pedaço da preguiça. – Um homem disse logo após jogar parte do bicho a minha frente. – Quando parar de fingir que está dormindo, pode comer.

- Droga! – Falei em voz baixa reprovando a falha do meu plano.

- Achou que eu não ouviria todo o barulho que vocês fez tentando se levantar? – O homem disse sentado à minha frente, após os restos da fogueira. Era o mesmo desgraçado que havia me atacado e me desacordado logo antes.

- Quem é você e o que fez com ela?

- Eu não sou ninguém. E não fiz nada com a moça...

- PARA DE MENTIR, DESGRAÇADO! Onde ela está?

O homem largou o pedaço da carne que tinha em mãos e veio na minha direção.

- Quando eu me soltar daqui irei matar você está ouvindo?! Eu vou matar você! – Esbravejei enquanto o homem se aproximava.

- Quando você se soltar? – O homem disse se agachando próximo a mim. – Você só irá se soltar quando EU permitir, então...

- Eu vou matar você! – Falei interrompendo sua frase.

- Vamos a algumas regras básicas de convivência. – O homem sacou de uma pistola e a pôs encostada em minha têmpora. - Primeiro: nunca ameace alguém que está com sua vida em mãos. Entendido?

Continuei com o olhar firme em sua direção, mesmo estando sob a mira de sua arma.

- Eu não deixei que você fosse morto pelo grupo de busca porque achei que você não era só mais um imbecil, vai continuar me fazendo pensar que decidi errado?

Eu não entendia o que estava acontecendo a essa altura e o motivo daquele homem fazer toda essa ladainha. Parte de mim queria permanecer relutante e tentar me soltar dali e dar um fim nisso, mas outra parte sabia que era impossível e que por mais que eu não quisesse acatar as baboseiras daquele cara, esta seria minha única opção.

- Segunda regra de convivência: Responda as perguntas que forem feitas a você. – O homem deu uma pequena pausa. – É sua vez de responder.

Eu me senti como um cachorro preso a uma arvore, não queria fazer parte daquele joguinho. Precisei engolir a seco meu orgulho e fazer o que ele queria, mas talvez não tão da forma que ele almejasse.

- Quem é você?

- Perguntas não respondem perguntas. – O homem disse e pôs-se de pé. – Mas vai passar dessa vez. Se vamos brincar do jogo de perguntas, sou eu que começo fazendo. E a primeira coisa que eu quero saber é sobre aquele arco.

- O que você quer saber exatamente?

- Ouvi histórias sobre um arqueiro, quero saber mais sobre elas.

- Pensei que você quisesse ouvir respostas e não histórias da carochinha. – Respondi provocativo.

- Suas decisões erradas afastaram sua amiga de você. Vai mesmo continuar com piadinhas ao invés de tentar reverter à situação? Pelo visto eu realmente me enganei em relação a você.

- Onde ela está?

- Sou eu que faço as perguntas! – O homem respondeu num tom forte e agressivo. – Agora me fale sobre o arco.

- O que você quer que eu diga? Que eu matei seus amigos desgraçados usando esta droga de arco, é isso? Que eu os cravejei de flechas e balas por todas as vezes que nos encontramos? É isso que você quer ouvir?! Então por que não me mata logo de uma vez, já que você sabe quem eu sou e o que eu fiz!

O homem observou em silêncio meu acesso de raiva e após alguns instantes respondeu.

- Alguma flecha ficou nas bolsas com a garota? Ou algum sinal de qualquer coisa que ligasse ao arco? – Ele respondeu friamente em contrapartida do meu excesso.

- Não. Todas as flechas que restaram estão nesse estojo. – Respondi de forma mais calma e direta mas logo voltei a perder o controle. – Quem é você e o que quer afinal de contas?! Vocês já estão com ela e comigo. Sabe quem somos, por que você continua com esse jogo doentio?

- Se eu estivesse com aqueles homens não estaríamos tendo esta conversa. Você sobreviveu muito tempo nesse mundo para continuar sendo tão idiota, garoto. É tão difícil de entender que eu não sou o cara com quem você deveria se preocupar?

- Então quem é você?

- Garoto estúpido teimoso. – O homem disse dando as costas e se afastando dali.

Assim que ele se foi eu voltei a tentar desatar as amarras que me prendiam mas os nós estavam muito bem apertados e todas minhas tentativas não resultavam em nada. Era impossível me desprender daquela droga de árvore.

Continuei lutando contras as amarras por mais alguns minutos mas fui vencido pelo cansaço e minha teimosia então deu lugar a apatia. Não muito depois disto o homem volta a se aproximar e vem caminhando por uma direção diferente da qual partiu.

- Meus rastros falsos parecem ter servido para despistá-los. – Disse o homem assim que voltou. – Mas não vamos passar mais uma noite aqui e dar a eles a segunda chance de nos achar, partiremos logo.

O homem percebeu minha feição com uma mescla de desaprovação e raiva e antes que eu pudesse dizer qualquer coisa ele se adiantou.

- Nem pense em relutar ou dizer "nem ferrando". Você está a um passo de me aborrecer mais do que eu admito e se isso acontecer eu irei deixá-lo amarrado à árvore para servir de lanche para os cabeça-oca.

Diário de Um SobreviventeOnde as histórias ganham vida. Descobre agora