05/12/18

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Hoje de madrugada ouvi um barulho vindo de fora da despensa e acordei Dayse que dormia ao meu lado. Era um barulho de vidro quebrando e por um momento achei que alguém ou algo tinha quebrado uma janela para entrar no restaurante.

Ficamos um pouco assustadas e eu pedi que Dayse ficasse na despensa tomando conta das meninas enquanto eu levantei para checar o que era. Levei uma pequena faca comigo e uma lanterna de bolso, segui silenciosamente pela despensa apertada e fui até a porta. A abri até então sem ligar a lanterna e olhei pela cozinha procurando algo mas não vi nenhuma movimentação.

Ninguém do grupo tinha levantado para checar o barulho e ninguém de fora havia entrado ali por enquanto. Liguei e desliguei rapidamente a lanterna algumas vezes para conseguir achar o caminho até a saída da cozinha quando ouvi Castilho falar:

- Olá? Quem ta aí?

- Sou eu, Izabel. – Respondi quase com um sussurro.

- O que você ta fazendo? – Antes que eu pudesse responder ele continuou. – Tome cuidado com os pés, eu derrubei alguma coisa de vidro que quebrou e deve ter cacos pelo chão.

- Foi você quem fez o barulho?

- Sim. Me desculpa.

- Não precisa se desculpar. Pode voltar a dormir que eu dou um jeito nisso.

Agora mais aliviada repousei a faca na bainha em minha cintura e fui atrás de algo para limpar os cacos de vidro. Depois que terminei de limpar a bagunça que o Castilho fez decidi ir até meu irmão ver se ele ainda estava acordado.

- Eai maninho, como você está?

- Oi Izabel, o que você ta fazendo acordada há essa hora?

- Que bom maninho, eu também estou bem, obrigado por perguntar. – Falei ironicamente ignorando sua rispidez.

Ele sorriu e disse:

- Tudo bem me desculpa. Eu estou bem e pelo jeito você também já que está de pé, como vai a perna?

- Melhor. Esse tempo de descanso ajudou a me recuperar bem. O pulso também está melhor, acho até que vou fazer unas flechas amanhã já que as minhas estão no fim.

- Acho que você quis dizer mais tarde.

- Já são mais de meia noite?

- Sim. Se andasse com relógio saberia.

- Qual é? Você tem algum compromisso marcado e não pode perder a hora?

- Sempre implicante. – Ele sorriu.

- Você sabe, é de família.

- Vai querer ajuda com as flechas?

- Talvez. Vai ser bom lembrar os velhos tempos.

Continuamos a conversa por mais algum tempo, nada de mais, apenas coisas do cotidiano e lembrar-se de velhas histórias de quando caçávamos com o nosso pai na fazendo do nosso avô, sinto falta daquilo.

Depois de algum tempo vimos Dayse aparecer pela porta da cozinha:

- Está tudo bem aí?

- Está sim. – Respondi.

- Ah! Tudo bem então Izabel, apenas fiquei preocupada porque você não voltou.

- Está tudo bem, eu já até estava voltando pra lá.

Me despedi do meu irmão e voltei com Dayse para a despensa.

Apesar de ter ficado parte da madrugada acordada eu não levantei muito tarde hoje. Assim que me vi de pé dei inicio ao trabalho de confecção das flechas, já que pelo que ouvi vamos embora daqui ainda hoje e eu não quero ser pega desprevenida numa situação de perigo.

Usei bambus que vinha coletando desde a época que eram apenas eu, meu irmão e Rafaela o nosso grupo, já imaginava que precisaria disso mas até que demorou bastante até que eu precisasse usá-los. Também usei uma antena velha que encontrei ao lado do restaurante e vai servir pra fazer unas flechas metálicas.

As pontas eu fiz de estanho que derreti no fogão do restaurante e coloquei em moldes que carregava comigo desde a época dos primeiros treinos e os estabilizadores foram feitas com recortes de embalagens de margarina que achei na despensa.

Consegui fazer quase duas dúzias de flechas e meu irmão só veio me ajudar quando estava nas últimas, se ele tivesse comigo desde quando comecei teria conseguido produzir mais, mas a quantidade até que está legal contando com as que ainda restavam.

Pouco tempo depois de terminar o trabalho com as flechas começamos a nos organizar para sair. É inicio de tarde ainda então teremos um bom tempo de sol para dirigirmos até encontrar outro lugar para ficarmos e decidir o que fazer depois.

Não vamos ficar nesse restaurante em definitivo porque aqui não é nem de longe o melhor lugar para ficar. Estamos longe de tudo, o que é bom por um lado mas por outro nos deixa longe de mais de tudo, inclusive de comida, água e gasolina. E como não temos suprimentos o suficiente para nos mantermos por muito tempo nós precisamos encontrar um lugar mais viável para nos alojar.

Na conversa entre o grupo para decidir por onde seguir eu me lembrei que havia visto um mapa em uma das mochilas do carro que eu deixei naquela vala há alguns dias. Até agora estamos rodando as cegas por aqui e ter um mapa da região seria perfeito para nós, além do que a estrada onde larguei o carro seguia para o interior e de todo jeito é pra aquela direção que vamos mesmo então pareceu lógico para todos passar por lá e tentar pegar o mapa.

Saímos do restaurante há algumas horas e já é quase fim de tarde mas estamos perto de onde o carro ficou, eu sei pois passamos ainda agora pelo posto em que parei pra almoçar.

- Igor vai devagar agora porque foi por aqui que passei pelo trilho de pregos.

- Mas você não tirou da estrada?

- Tirei mas vai saber se quem colocou aquilo da primeira vez não botou de volta no lugar.

Nem precisamos continuar por muito tempo até meu irmão dizer:

- É aquele o carro?

- O quê? – Não havia entendido direito o que meu irmão falou pois estava concentrada lendo anotações antigas do diário.

- Se você deixou o carro desse jeito porque queria que voltássemos? – Ele disse enquanto olhava pros restos da carroceria queimada e retorcida.

Eu não havia deixado o carro nessas condições, a batida tinha sido tão fraca que nem chegou a quebrar o para brisa, não tinha como o carro ter incendiado do nada. Então descemos para analisar melhor.

- Eu não o deixei assim Igor. Não tinha nenhum sinal de fogo ou qualquer coisa quando eu saí.

- Talvez tivesse algum vazamento e você não viu. – Rodrigo falou enquanto circulava o carro queimado.

- Não e de todo jeito eu desliguei o motor, o que daria inicio ao fogo?

Igor e Rodrigo continuaram vasculhando o carro e meu irmão falou:

- Tinha algo no porta luvas? Qualquer coisa no carro que agüentasse o fogo?

- Tinha um canivete no porta luvas e um cantil pequeno eu acho, por quê?

- Não tem nada aqui. - Ele falou enquanto saia do carro.

- O fogo é forte o bastante pra consumir essas coisas? – Alessandra perguntou.

- Não. – Igor respondeu de imediato.

- Alguém levou as coisas e pôs fogo no carro. – Rodrigo supôs.

- Mas que merda. – Leonardo que até então só observava falou.

- Entrem nos carros. Vamos embora daqui. – meu irmão finalizou enquanto seguia pro nosso carro com uma feição séria e preocupada.


Diário de Um SobreviventeWhere stories live. Discover now