14/12/2018(Continuação)

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A entrada da loja era de vidro e Edinho disparou contra ela enquanto corríamos, entramos o mais rápido possível mas não sabíamos mais o que fazer lá dentro. Olhamos em todas as direções procurando alguma saída quando ouvimos uma voz pelo rádio comunicador na minha bolsa.

- Tem uma porta nos fundos da loja no lado esquerdo. Uma saída de emergência. – Dizia a voz. – Vão e saiam por lá. AGORA!

Eu, Barbara e Edinho nos entreolhamos e ficamos sem reação por um momento.

De quem era aquela voz? Como ele sabia que estávamos ali? Por que estava nos ajudando? Ou melhor, será que realmente aquilo era uma ajuda?

Esses questionamentos borbulharam na minha cabeça e pelo rosto de Edinho e Barbara, eles pensavam o mesmo. Mas não podíamos perder mais tempo, os zumbis no beco já alcançavam a rua e os que vinham pela rua já quase alcançavam a vitrine da loja que estava completamente aos pedaços. Não tínhamos escolha a não ser agir o mais depressa possível e nossas escolhas se resumiam a enfrentar uma horda de zumbis ou seguir as ordens da voz no rádio.

Eu não tinha a menor confiança em quem quer que fosse que tenha falado conosco, mas a verdade é que isso não importava já que não estávamos em posição de escolher. Cada segundo de indecisão se transformava num metro a menos de distância entre nós e as mandíbulas dos mordedores, independente da nossa escolha, seja lá o que decidiríamos fazer, aquela era à hora de agir.

Vi nos olhos de Edinho que a indecisão dele era próxima da minha e já estava mais que claro que não havia mais tempo para discussões e dúvidas, então pus de volta a segunda alça da mochila nas costas, a apertei bem e partir em direção a porta mencionada pela voz.

Passei a frente de Barbara e Edinho que logo me seguiram com os zumbis não muito atrás. Corri entre as prateleiras tentando me esquivar mas a tensão da situação fazia com que os corredores parecessem ainda mais estreitos, esbarrei em várias e derrubei algumas pelo caminho, o que esperei que ao menos também pudesse dificultar o avanços dos zumbis.

Após uma corrida com muito pouco cuidado e bastante pressa enfim alcançamos a porta que procurávamos, empurrei a trava de segurança para baixo e empurrei a morte metálica com toda força. A porta logo se abriu com um ranger alto das dobradiças e nos fez sair em meio a outro maldito beco, do lado direito havia a rua e no esquerdo não tinha saída.

Eu estava à frente e quando percebi que se tratava de uma furada já era tarde de mais para evitar que Barbara e Edinho também saíssem. Os dois estavam bem as minhas costas quando vi os primeiros mordedores alcançarem a frente do beco. Eram muitos e a passagem estreita de mais, com a munição que tínhamos era impossível passar por ali.

A porta por onde saímos se fechou por nosso descuido e o único caminho a seguir era o fundo do beco, caímos numa armadilha, estávamos presos numa panela onde éramos o prato principal.

Só podia ser. Toda essa merda foi orquestrada pelo maldito do rádio, ele que nos empurrou para cá. Ele que armou tudo isso, foi ele quem confundiu Barbara um pouco antes e era por causa dele que estávamos prestes a morrer.

Eu não acreditava que tinha sido tão estúpido em ter caído nessa armadilha barata. Corremos em direção ao fundo do beco tentando manter as ultimas esperanças de sair dali mas tudo já estava perdido. Portas trancadas, não havia escadas e nem passagens. O fundo do beco era a parede de um prédio e não tínhamos o que fazer para conseguir passar por ela, presos como ratos.

Os zumbis já inundavam o beco quando chegamos ao final dele, de costas para parede um ao lado do outro, parecíamos prisioneiros a postos num paredão de fuzilamento prestes a sermos abatidos. Eu estava no meio e quis olhar uma última vez para Barbara e Edinho, não deveríamos estar aqui, não deveríamos morrer, não desta forma. Eu só queria ter mais tempo para despedir-me deles e me desculpar.

Barbara parecia não entender que não havia mais saída, ou ao menos não queria aceitar. Ela ainda não havia se rendido e passou a disparar nos zumbis que estavam mais próximos. Edinho a observou, sacou a arma e deu alguns passos para frente disparando junto com ela.

Os dois se adiantaram um pouco a mim, que continuei parado encostado na parede e já conformado com a situação sem saída que nos encontrávamos. Eu vi Edinho e Barbara a minha frente lutando desesperadamente pela vida, mas sabia que era inútil lutar contra o inevitável.

Saquei de minha arma e ao ver os dois a minha frente, por um segundo olhei para minha pistola e pensei em apontá-la para nuca dos dois, seria menos doloroso do que vê-los sendo comidos vivos e não poder fazer nada. Aquela pistola nunca havia pesado tanto quanto naquele instante e eu não fui capaz de erguê-la.

Me senti fraco como nunca antes, uma lagrima escapou dos meus olhos, - esta é a última – pensei e levantei a cabeça onde já pude observar os zumbis ultrapassando o meio do beco. Era questão de segundos antes de sermos mortos. E foi no meio do barulho dos disparos, entre uma cápsula e outra que alcançava o chão, que algo aconteceu.

Uma porta ao nosso lado se abriu, já havíamos tentado abri-la de fora mas não conseguimos e agora ela foi aberta do nada. Alguém passou pela porta recém aberta e saiu bem as costas de Barbara e Edinho, ele passou entre os dois e cuspiu uma rajada de fogo contra os zumbis, assustando todos nós.

As labaredas voaram com tudo para cima dos mordedores e nos deixaram sem reação. Edinho e Barbara pararam de atirar e apenas olhávamos enquanto o homem terminava seu ataque, ele se virou para nós e com chamas ainda escapando da boca nos mandou entrar.

Barbara entrou e Edinho voltou para me puxar para dentro, logo depois o homem também entrou e fechou a porta novamente. Estávamos assustados e ainda sem entender bem o que estava acontecendo ali.

O lugar estava escuro e não conseguíamos distinguir bem onde estávamos. O homem mantinha um capuz sobre a cabeça o que também dificultava reconhecê-lo e antes que pudéssemos dizer qualquer coisa ele se pronunciou.

- Larguem as armas no chão, agora!

Demoramos a assimilar tudo aquilo e era difícil aceitar ordens assim naquelas circunstâncias. Estávamos perdidos e assustados, ficar desarmados era a ultima coisa que queríamos mas o homem insistiu.

Ele apontou uma lanterna para nossos pés e nos fez notar que o chão estava totalmente encharcado, depois acendeu um isqueiro na outra mão e repetiu.

- Larguem as armas agora ou vão se arrepender de não terem ficado lá fora.

Não foi difícil entender que o liquido sob nossos pés na verdade era gasolina e todo mundo sabe o que acontece quando um isqueiro aceso cai em cima de algo assim.

Largamos todas as armas no chão com cuidado enquanto o homem apagou o isqueiro e continuava a nos observar recostado na porta. Ele parecia nos analisar dali e eu pude ver nos seus olhos que ele não estava muito certo do que estava fazendo.

Barbara tomou as rédeas da conversa por nossa parte e se apresentou, começou a explicar o que havia acontecido e Edinho também ajudou. Os dois falavam com calma tentando evitar qualquer reação que fizesse o homem acender novamente o isqueiro. Eu permaneci calado até então, apenas observando e tentando voltar a por a cabeça no lugar.

Assim a conversa sucedeu-se até o homem sentir segurança para baixar o capuz e se apresentar, mas antes nos pediu para acompanhá-lo até outro local.

Num ambiente mais a frente, desta vez com uma iluminação melhor e sem litros de gasolina sob nossos pés o homem enfim se apresentou. Seu nome é Felipe, segundo ele "só Felipe", e ele era bem mais novo do que eu imaginava.

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