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Mas eu não pude dizer não. Por mais que minha vontade tenha sido aquela - e, acreditem, ela tinha.

Ao longo dos dias que se seguiram, ele me cercou pelos corredores, me ligou para saber como estava o bebê - sim, o bebê. Só ele - e uma vez até bateu em minha porta para se certificar de que eu dizia a verdade quando respondia que ele estava ótimo. Eu me sentia sufocada. Era Alfonso demais à minha volta! E eu não podia nem sequer expurgar minha frustração com aquela situação dizendo gracinhas ofensivas, como a velha Ana Nicholls costumava fazer. Aquilo era... agoniante!

Alfonso: vamos parar em algum lugar pra você comer alguma coisa.

Voltávamos da tal consulta médica, mas aquele parecia ser um assunto provisoriamente proibido. Por mais tempo que passasse, acho que aquilo nunca deixaria de ser estranho. Ao menos para mim. O bebê estava bem e, embora aquilo não importasse a ninguém (com ênfase no ninguém) pelo visto, eu também estava. A médica fizera uma série de recomendações (recomendações exaustivas e frustrantes só de se pensar!). Reeducação alimentar - nada de gorduras e refrigerantes a não ser que eu quisesse um filho gordo e sofrendo de cólicas e cólicas e cólicas todas as noites -, nada de bebida - nada mesmo! -, cigarro nem pensar - tópico inútil, whatever - e estresses e aborrecimentos de forma alguma. Alguém precisava avisar para aquela mulher que minha vida era um estresse por si só!

Nunca achei que ter um filho fosse algo tão desgastante. E eu nem havia chegado na fase realmente ruim da coisa, como meu corpo virando uma bola, as pernas inchadas e doloridas, as estrias, o peito esguichando leite como uma boa e velha vaca leiteira, a dificuldade para dormir, a impossibilidade de ver a ponta do meu dedão do pé e todas aquelas outras coisas medonhas que rezavam a lenda. Tem como uma mulher ter uma gravidez sem estresse só de pensar nessas coisas? Diga, tem?

Anahí: eu não estou com fome. Prefiro ir direto pra casa.

Ele me olhou de canto, desviando a atenção momentaneamente da estrada.

Alfonso: você precisa se alimentar direito. Você ouviu o que a médica disse sobre...

Anahí: sobre manter uma boa alimentação ser fundamental para o desenvolvimento do bebê - completei, remendando sua voz. - E ouvi também o que ela disse sobre não me entupir de comida.

Alfonso: que bom então que você não tomou café da manhã hoje, não é? - disse com um meio sorriso vitorioso e eu precisei segurar meus pulsos antes que eles voassem até seu rosto. Assim, sem querer.

Revirei os olhos.

Anahí: eu não sabia que conviver com você seria algo assim, tão insuportável.

O meio sorriso permaneceu ali, enquanto ele dirigia tranquilamente.

Alfonso: a recíproca é verdadeira. Aonde quer ir?

Anahí: quem se importa?

Alfonso: onde está toda aquela história de conviver civilizadamente, doçura? - perguntou, virando-se para mim logo após parar o carro no sinal vermelho. - Você pode facilitar as coisas e escolher o lugar. E ninguém pode dizer que eu não estou te dando escolha.

Anahí: tão bondoso - debochei, arqueando uma sobrancelha. - Você não tem que trabalhar?

Alfonso: não. Cancelei todos os compromissos na empresa hoje por causa da consulta. Portanto, você escolhe ou eu escolho?

Anahí: eu não gosto de você.

Alfonso: hmmm.

Anahí: tanto faz, Poncho! Tanto faz! Qualquer coisa que faça com que eu me livre logo de você!

O Pecado Mora Ao LadoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora