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Anahí: você precisava ter visto a cara dele quando eu disse isso! - gargalhei, me jogando sobre o sofá, destruída. - Ele achava mesmo que eu ia me render como uma idiota ali, beijando-o. Tá.

O último convidado havia saído há alguns minutos e Dulce e eu juntávamos os cacos do que restara daquela noite. Ela ia dormir aqui, porque, como dissera, estava muito tarde para uma jovem, linda e gostosa ruiva sair por aí na calada da noite, correndo o risco de ser atacada por algum maníaco serial killer ou estuprador. Modéstia definitivamente não era sua maior virtude. Assim como a sanidade.

Dulce: e pela segunda vez ele fica lambendo os dedos - bateu pequenas palminhas, empolgada. - Estou adorando a idéia de ser sua cúmplice nesse plano macabro. Apesar de que, devo confessar, é muito difícil pra mim, enxergar esse cara filho da puta que você disse que ele era. Ele me parece ser tão boa gente - fechei os olhos, tentando bloquear aquele comentário. - Já parou para pensar que ele pode ter se arrependido e realmente ter mudado?

Anahí: vai começar a ter crise de mulherzinha agora? - entreabri os olhos e resmunguei, cortante. - Ele não mudou, e mesmo se tivesse mudado, isso não muda o que me fez no passado.

E não mudava mesmo, eu sabia bem. Ela deu de ombros e ficou calada, sentada na beirada que restava do sofá onde eu me mantinha deitada, novamente de olhos fechados.

Eu não queria pensar na possibilidade de estar fazendo algo errado. Não queria começar a me arrepender, antes mesmo de ter começado, da ideia de dar o troco. Podia parecer errado para qualquer um, menos para mim. Eu havia sentido na pele o que aquela atitude cruel fora capaz de provocar. Desolação era pouco se comparado a forma como fiquei nos meses seguintes àquilo. Minha única vontade então fora sumir do mundo, encolher a ponto de desaparecer e ninguém conseguir presenciar o fracasso em que eu havia me transformado. Entretanto, por mais que eu ansiasse por aquilo, nunca aconteceu. E eu fui obrigada a lidar com todo aquele caos emocional e suas consequências sob os olhos atentos de mamãe, para onde fugi quando acabei descobrindo sobre a tal aposta, no dia seguinte ao baile de formatura. Na manhã seguinte à noite na qual eu me entregara completamente a ele.

Dulce: sabe no que eu não consigo acreditar? - a voz dela me trouxe de volta a realidade e eu reabri os olhos, percebendo seu olhar fixo em meu rosto. - Ele não se lembrar em momento algum de você. Quer dizer, não perceber na Ana nada que o leve à Anahí de antes...

Anahí: para você ver o quanto eu devo ter sido importante na listinha das mulheres com quem ele já dormiu na vida - desdenhei.

Ok, aquilo fora mais um desabafo amargurado que algo em que eu realmente acreditasse. Digo, algo lá no fundo queria que ele me reconhecesse assim que me visse, que lembrasse de mim ou do que vivemos, que suas lembranças fossem o suficiente fortes para transpassar todos aqueles anos de afastamento. Mas eu tinha plena consciência de que eu estava completamente diferente do que havia sido naquela época, quando ainda tínhamos algum contato. Algo que nem eu conseguia negar era que meu passado condenava. E muito. Há dez anos eu não era nem sombra da mulher que era agora; não sabia me vestir, não conseguia me maquiar e não tinha lá muito dom para reconhecer as últimas tendências da moda. Todos os tipos de moda, eu diria. Além do aparelho ortodôntico que deformava meu sorriso e do óculos fundo de garrafa que compunha o figurino. Não seria de se estranhar se alguém que me conhecera antes passasse por mim hoje e fizesse a mínima para quem eu era. Porém, de certa forma, doía que ele fosse uma dessas pessoas. Por tudo.

Dulce: ou então ele tem probleminhas - disse, tentando quebrar o clima. - Por que, né, nem como a loira da festa ele te reconheceu.

Eu sorri ante a tentativa de brincadeira, mas não foi algo sincero. Minha cabeça estava um verdadeiro turbilhão doido.

O Pecado Mora Ao LadoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora