30/11/2018(Continuação)

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Voltei à atenção pra dentro do carro e vi Natalia jogada ao chão atrás do banco de Edinho, me agachei atrás do banco de Barbara para tentar me proteger das balas e procurei ver se alguém havia sido atingido.

Eu não conseguia pensar, fui arrancado de um estado inerte de pensamento para um momento de alta tensão, o choque da adrenalina no meu organismo foi tão grande que eu mal conseguia lidar com todas aquelas sensações.

Minha cabeça girava. Ao mesmo tempo em que eu parecia estar super atento eu também mal conseguia focar a atenção em algo. Meus olhos fitavam freneticamente todos os lugares que minha vista alcançava, os prédios ao nosso redor, os becos, as ruas, até os postes passando roubavam minha atenção. Vi Natalia deitada a minha frente chorando e levei as duas mãos à cabeça, preciso me focar, eu pensava.

Olhei pra frente e vi Barbara com dificuldades pra dirigir o carro, ela quase bateu ao fazer uma curva e só conseguiu evitar o acidente porque Edinho a ajudou a girar o volante.

- Eu fui atingida! – Barbara disse com uma voz refletindo dor.

- Eu sei. Eu sei. Mas você precisa continuar, precisa tirar a gente daqui. – Edinho a apoiou moralmente enquanto continuava com as mãos no volante a ajudando a manter o carro na estrada.

Meu coração estava super acelerado e minha respiração também. A essa altura, após dobrarmos uma esquina, os tiros pararam de nos acertar mas não podíamos sequer pensar em baixar a guarda. Eu estava travado no chão do carro fazendo todo o esforço possível para reagir mas meu corpo parecia ter entrado em pane.

Bati com as duas mãos na cabeça repetidamente como se isso fosse me fazer voltar a funcionar e de alguma forma me ajudou a voltar a mim e eu enfim consegui fazer algo. Minha primeira reação foi ir até Natalia e ver se ela estava bem. Graças a Deus ela não foi atingida, estava apenas assustada como eu.

Levantei-me e me inclinei entre os dois bancos da frente para ver como Edinho e Barbara estavam.

- Tá tudo bem com você? – Perguntei primeiro a Edinho.

- Sim e aí atrás?

- Estamos bem.

- Eu não. – Barbara falou em meio a um gemido de dor.

Ela segurava o volante com o braço ferido enquanto a outra mão pressionava o ferimento do braço machucado na altura do bíceps. O sangue já havia encharcado parte da manga de sua camisa e eu rezava pra que o disparo tenha acertado apenas o seu braço.

Voltei a me sentar no banco de trás enquanto Barbara dirigia o mais rápido que podia. Rasguei um pedaço da minha camisa e voltei a me inclinar entre os bancos para amarrá-la sobre o ferimento de Barbara.

- O que você tá fazendo? – Ela perguntou.

- Tentando estancar isso aqui.

- Para o carro Barbara. – Edinho falou. – Vai lá pra trás e deixa que eu cuido de tirar a gente daqui.

Barbara olhou pra Edinho e por um momento eu pensei que ela não fosse aceitar a proposta, mas depois de uma contida careta de dor ela acabou cedendo. Parou o carro e passou em meio aos bancos e se sentou ao meu lado na parte de trás enquanto Edinho tomou o volante.

Em cerca de segundos já estávamos de novo em fuga e eu estava aliviado que não estávamos mais sobre a mira de ninguém. Foquei-me em estancar o sangramento de Barbara e pude notar que a bala havia transfixado, isso é bom, já que não precisaremos mais mexer no ferimento, agora era apenas parar o sangramento e evitar que infeccione.

Natalia demorou um pouco mais do que eu mas também se recuperou do choque e passou a ajudar a acalmar Barbara e prestar os primeiros cuidados.

- Nós precisamos largar esse carro. – Edinho falou olhando pra nós pelo retrovisor central.

Balancei a cabeça positivamente mesmo sabendo que aquele carro era nossa melhor chance de alcançarmos nossa família, mas infelizmente realmente era perigoso de mais mantê-lo conosco.

- Não! – Babara surpreendeu a todos sendo contra a decisão de Edinho. – Não podemos largar o carro. Precisamos dele pra chegar ao litoral.

Mesmo ferida ela ainda manteve a posição de nos ajudar a encontrar nosso grupo, eu sabia que Barbara era uma mulher corajosa e aquele ato nobre apenas reforçou ainda mais sua imagem pra mim.

- As pessoas que estão atrás de nós só irão nos reconhecer por causa desse carro, é um perigo continuar com ele. – Edinho reforçou.

- Nem sabemos quem atirou em nós. Não vimos nada, pode ter sido qualquer um. – Natalia se posicionou.

- Não vamos largar o carro. – Barbara afirmou novamente em meio a bufadas de dor.

- O que precisamos fazer é sair das ruas. – Interrompi a discussão. – Edinho você tem que encontrar um lugar para nos escondermos. Temos que parar e prestar os devidos cuidados a Barbara.

- Eu sei. É isso que eu to fazendo. – Após um curto período de silencio Edinho continuou. – Ali.

Edinho reduziu a velocidade e entrou a esquerda numa ruela que mal cabia o nosso carro. Mais a frente ela se dividia e ele pegou a direita dessa vez terminando num estreito beco sem saída completamente fora do alcance de visão de quem passasse pela via principal por onde vínhamos.

Descemos todos e entramos num casebre mal acabado um pouco mais a frente no beco. Edinho foi primeiro e certificou-se que o local era seguro, logo depois acenou para que entrássemos e é aqui onde vamos dar um jeito de nos esconder e cuidar de Barbara.

Diário de Um SobreviventeWhere stories live. Discover now