50 - Fragmentos do passado.

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– Você é um idiota.

Hitoshi deu de ombros, te entregando o pacote de açúcar. Embora estivesse agindo como sempre, você estranhava a feição indecifrável em seu rosto.

– Não faço ideia do que está falando. – ele disse, com um fantasma de sorriso em seu rosto.

Hitoshi usava um pijama – ele claramente não esperava encontrar com ninguém, vestido com roupas antigas e confortáveis. Você inconscientemente passou o olho por ele, e percebeu que ele usava as pantufas que você havia o comprado.

Suas sobrancelhas levantaram levemente, e um leve rubor veio ao seu rosto. Shinso não parecia ter percebido, mas viu o jeito que seus lábios se encurvaram.

Embora sua mãe tenha convidado Hitoshi a entrar na casa, ele não entrou, justificando-se que ele tinha uma consulta no dentista para em poucos minutos – mas que hoje mais tarde, ou amanhã, poderia vir.

Você colocou o pacote de açúcar na cozinha e voltou para a sala com passos rápidos, parando incrédula do lado da sua mãe:

– Então o "ele" que tinha de vir entregar o açúcar era o Hitoshi?

– Você não parece feliz com a surpresa. – ela riu.

Você se sentou do lado dela, e despausou a série.

Alguns momentos se passaram com vocês em silêncio. Não era para ser um silêncio estranho, pelo menos não parecia ser para sua mãe, era uma coisa sua: um sentimento de inquietude caminhando por dentro da sua pele te irritava, e você pensava em um jeito bom de colocar seus incômodos em palavras.

A entonação da sua mãe quando ela pediu especificamente por Hitoshi para entregar o açúcar era bem clara: ela já fez menções e brincadeiras anteriormente por mensagem sobre como ele seria um bom genro. Você nunca gostou do jeito que as pessoas normalmente te empurravam para cima dos seus amigos homens, como se uma amizade sincera entre vocês não pudesse ocorrer, por serem de gêneros opostos.

"Se bem que não me importonão, não não não não. [Y], nós temos os nossos princípios, okay? Não vamos passar pano só porquê é o Hitoshi. E por que eu passaria pano só por que é o Hitoshi hahahahaha o que??? Cérebro estúpido estupido, estúpido"

– Eu só... Não gostei da entonação da coisa toda. Não gosto que você me empurre pra cima dele, eu sei que é brincadeira, mas me incomoda.

Sua mãe pausou a série – aparentemente vocês não iriam termina-la nunca – com um olhar de preocupação no rosto.

– Não- [Y], eu não quis te incomodar. Não foi minha intenção te deixar desconfortável, me desculpe. – ela colocou uma mão sob a sua, te olhando no fundo dos olhos.

– Não precisa se desculpar. Eu sei que você não quis, e eu sinceramente nem sei por que 'to falando disso, eu só...

Você olhou para cima, incerta do porquê você sequer começou a falar sobre isso. Era só uma brincadeira, e ela sinceramente não te incomodava tanto assim quando se tratava dos seus outros amigos. Então por que agora você se sentia tão inquieta?

– Eu sei que eu não deveria ficar me metendo assim, filha, é só que... essa situação me lembra de mim, quando era mais nova.

Ela também olhou para cima, e sem tirar as mãos das suas, soltou um suspiro preso.

– Com seu pai.

Seus olhos imediatamente caíram sobre ela, um pouco incrédulos. Depois de vários longos anos, essa era a primeira vez que a sua mãe trazia o assunto de seu pai por vontade própria: normalmente ela respondia perguntas que você tivesse, ou era como daquela vez no sótão onde não havia para onde correr.

𝑰𝑵𝑺𝑶𝑵𝑰𝑪𝑶 | Shinso HitoshiOù les histoires vivent. Découvrez maintenant