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Luna Oliveira

Lara me fitou com seus grandes olhos brilhantes e parecia tão sem reação quanto eu. Arrisquei dar alguns passos até onde ela estava parada, perto da cozinha, e meu coração doeu ao ver como ela estava magra e abatida, mas um pouco melhor do que quando ela sumiu.

Era uma cena surreal, como se tivesse voltado de um passado distante para me assombrar.

— Oi, Luna. — Ela sussurrou, abrindo um sorriso pequeno e limpando com o canto da mão uma lágrima que escorreu de seu olho direito.

— Por que, Lara? — Apesar do choque, eu ainda consegui indagar. Ela estava tão perto de mim que, se eu esticasse o meu braço agora, eu a alcançaria. — Por que você fez isso comigo? O que aconteceu? — Falei aos prantos, não me aguentando mais e agarrando minha irmã em um abraço apertado, talvez ao ponto de machucá-la.

Lara não respondeu. Tão miúda e indefesa, ela me abraçou da mesma forma e escondeu o rosto no vão do meu pescoço. Eu estava tão feliz por ver com meus próprios olhos que ela estava viva, que foi como se um caminhão de toneladas tivesse saído de cima de mim.

— Achei que estava morta, eu... — Gaguejei, mal conseguindo respirar direito. — Você sumiu sem me avisar, ficou louca?! — A tristeza foi compartilhando espaço com a raiva e me vi chacoalhando-a pelos ombros.

— Você disse que eu era o seu problema. — Lara encolheu os ombros, com o rosto vermelho de vergonha.

— Me perdoa... eu não... — Fiquei sem palavras. A culpa de ela ter desaparecido realmente foi minha, fui cruel com as palavras e não me importei se a magoaria. — Eu estava com raiva e disse tudo da boca para fora. Você é a pessoa que eu mais amo nesse mundo, Lara, jamais iria querer que fosse embora daquele jeito.

— Não, não se desculpe. — Ela segurou meu rosto, suas unhas estavam sujas e a pele do seu rosto ressecada pelo uso excessivo de drogas. — Você estava certa o tempo todo, tinha razão em me falar aquilo. Eu fui um problema para você desde o momento que nossos pais morreram e ficamos sozinhas, e naquela semana percebi que se eu não fosse embora e te deixasse, eu acabaria com a sua vida da mesma forma que estava fazendo com a minha.

Apesar da sua aparência desleixada, as drogas envelheceram a minha irmã além da conta, a sua voz ainda era infantil. Ela só tinha dezesseis anos, precisava de mim e de cuidados.

Voltei a abraçá-la com força, com medo de fechar os olhos e me dar conta de que tudo aquilo era apenas um sonho. Mas o toque, a voz... era impossível não ser real, minha irmã estava ali depois de quase três anos sem dar notícias ou qualquer sinal de vida.

Aquele abraço foi diferente. Foi um abraço de reconciliação, de perdão mútuo e de recomeço.

— Eu pensei coisas horríveis... que o Russo... — Me forcei a parar de chorar. — Eu vi a pulseira que a mamãe te deu com ele, como ela foi parar nas mãos dele? — O rosto dela aqueceu.

— Eu dei. — Lara estava com vergonha ao admitir aquilo. — Antes de sair do morro, eu queria te ajudar a pagar a dívida e entreguei lá na boca. Me desculpe, não queria ter me desfeito de uma lembrança da mamãe.

— Está tudo bem, ela sabe que foi nas melhores das intenções. — Sorri e a puxei até o sofá da sala, que estava caindo aos pedaços de tão velho.

Na verdade, nada mudou aqui dentro. Talvez, só as pessoas. Lara não era a mesma de quando foi embora, e definitivamente eu também não.

— Você conseguiu? Pagar a minha dívida? — Ela sussurrou, me olhando sem graça.

Sombras do Amor [M]Where stories live. Discover now