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(Nove meses antes)

Numa manhã de um sábado qualquer, Any acordou cedo para levar Cauê e Luca à natação. Então se arrumou rapidamente e saiu rumo ao quarto dos meninos.

Acordar Cauê nunca era uma tarefa fácil, por isso, optou por ir chamar Luca primeiro, mas se surpreendeu quando o encontrou ajoelhado ao lado da cama assim que abriu a porta do quarto. Luca tinha as mãos juntas e os olhos fechados, e mesmo que ele sussurrava, Any foi capaz de ouvir sua pequena, mas sincera, oração:

Luca- Jesus, abençoa o meu irmão e faz com que ele fique bom logo, porque eu sinto muita saudade dele. E também abençoa a tia Ny, porque ela é muito legal e eu não gosto quando ela fica triste por causa do Josh. Por favor, Jesus não deixa ela ficar triste nunca. Amém... Ah! E abençoa eu também.

Lu a abriu os olhos e, ao ver Any em pé na porta do quarto com um pequeno sorriso, saltou alegremente e disse com simpatia:

Luca- Bom dia, tia!

A morena, não se aguentando com tanta fofura e ingenuidade, aproximou-se de Luca e deu-lhe um abraço materno. Como ainda era possível existir um coraçãozinho tão puro?

(Dias atuais)

(Quatro dias depois)

Any observou a pequena tatuagem que tinha no antebraço direito, tratava-se dos nomes dos seus filhos. O nome de Letícia, evidentemente, havia sido gravado ali há pouco tempo, enquanto o nome de Joaquim foi o primeiro a ser escrito. Então, passando os dedos sobre a tatuagem, pensou que, de todas as tatuagens que possuía, aquela era a única da qual não se arrependia de vez em quando.

A primeira tatuagem que fez na vida estava localizada no tornozelo, um pequeno desenho de uma âncora. Na época, com 15 anos, depois de muito insistir com seus pais, Any julgou que aquilo poderia ter um significado relevante e tatuou. Mas, agora, em retrospectiva, percebe que era um símbolo vazio. Uma âncora... E daí?

Mais tarde, aos 17, não satisfeita, procurou seu amigo tatuador novamente e pediu-lhe que desenhasse uma discreta flor de lótus em sua nuca, apenas porque leu por aí sobre o seu significado e achou interessante. Porém, assim como foi com a âncora, com o passar dos anos, aquela imagem tornou-se mais um símbolo vazio em seu corpo. E daí que aquela flor significava pureza? Do que adianta tê-la gravada na pele se, na prática, não procura purificar sua alma? Any se arrependeu.

Então, quando Joaquim nasceu, apaixonada por aquele rostinho tão bonito e aqueles olhos tão verdes, escreveu seu nome no antebraço direito e, ao lado, sua data de nascimento em algarismos romanos: XXXI-VII-MMII. Ao contrário de suas aventuras anteriores, aquela simples tatuagem nunca perdeu seu significado. Mesmo depois de 16 anos, seu amor continuava o mesmo. Pois âncoras e flores de lótus são passageiras, mas o amor por um filho é feito para durar a vida inteira.

Mas e quando esse amor é surpreendido por circunstâncias adversas? A âncora, ainda tatuada em seu tornozelo, não era capaz de mantê-la estabilizada diante do vendaval de emoções que a atormentava. Símbolo vazio.

Uma semana sem o seu filho. Impossível dimensionar sua dor. Seu remédio foram as fotos.

Joaquim, às vezes, sequestrava seu celular e tirava fotos ou gravava vídeos aleatórios. Uma ou duas vezes, brigou com o filho por causa disso. Mas, agora, sentada na cama dele, sentindo saudades, foram aquelas fotos que a impediram de afundar. Em um curto instante riu, chorou e recordou.

Então, sozinha ali, com o coração partido em mil pedaços, Any apenas sussurrou para Deus, pedindo o seu auxílio. Os pensamentos negativos até tentaram convencê-la de que, para ser ouvida, ela devia dizer mais, fazer uma oração longa e bonita. Porém, não era preciso. Suas palavras podem ter sido curtas, mas foram sinceras. Estava desesperada.

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