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Eu tenho um problema.
Eu sempre me considerei uma pessoa otimista... Copo meio cheio e tudo mais. Parte de mim sempre busca acreditar que tudo vai ficar bem.
Bom... Pelo menos é assim que eu penso quando eu não estou envolvida. Eu acredito no melhor para as pessoas que eu amo... Que Liam e Sky terão um futuro feliz, que Maya vai ser uma psicóloga de sucesso, que Niall vai continuar sendo uma das almas mais puras que já conheci.
Mas quando eu penso em mim, no meu futuro, as coisas ficam complicadas.
Por muito tempo a culpa me fez pensar que eu não merecia ser feliz. Isso fez com que eu me sabotasse várias vezes, destruindo qualquer caminho que eu pudesse trilhar. Eu afastava as pessoas boas, me aproximava de quem eu sabia que não me fazia bem... Basicamente, fui minha pior inimiga.
Por isso os momentos felizes sempre pareceram nostálgicos pra mim. Mesmo no instante em que eles estavam acontecendo. Enquanto eu sorria nesses momentos, meu peito se apertava e meu sorriso doía. Machucava porque, no fundo, eu sabia que não ia durar. Que era passageiro. E que logo eu estaria de volta à minha realidade triste. Se o universo não estragasse, eu mesma estragava.
Mas aí, aquele verão chegou.
Harry apareceu.
E depois de muito trabalho, brigas, confrontos e incertezas... Finalmente, por um breve momento, nós fomos felizes. Eu fui feliz.
Feliz como eu mesma, a verdadeira Melissa.
E talvez me desprender da culpa e do meu trauma, fez com que eu baixasse a guarda.
Eu me permiti ser feliz, de verdade, sem pensar no fim.
Talvez seja por isso que eu não percebi quando as coisas começaram a dar errado... Porém, pensando agora, eu consigo lembrar perfeitamente quando tudo começou a desmoronar.
O começo do fim.
Estávamos todos na sala da casa da fazenda, assistindo um dos vários DVDs antigos de Harry.
Alguém deu a ideia de colocar um dos colchões de casal no chão, então Liam e Sky estavam de conchinha entre os lençóis, enquanto Niall e Maya estavam em um dos sofás e eu e Harry no outro.
Era um fim de tarde calmo, de algum dia da semana que eu não conseguia lembrar... Era difícil ter o controle de qual dia era, o tempo perdia o sentido quando não tínhamos afazeres. Era verão, fazia calor, então nós nos mantínhamos ocupados nadando, acampando, fazendo fogueira, jogos de bebida, idas ao bar, filmes juntos na sala...
Estava sendo divertido. Harry e eu quase não brigávamos... Só quando Babe fazia xixi no quarto e ele teimava que nós precisávamos deixar o porquinho no chiqueiro. Ou quando ele fingia de sonso quando eu perguntava onde estava a droga da minha calcinha da pantera cor de rosa.
Na última semana tudo estava bem e nós tínhamos uma rotina de não ter uma rotina... Harry conseguia sempre me pegar desprevenida. Seja invadindo meu banho, preparando um piquenique para nós dois no lago ou me abraçando por trás forte o suficiente para tirar os meus pés do chão quando eu quase ganhava dele nas corridas matinais.
Nunca era chato com Harry, nunca era entediante... E eu não conseguia ter o suficiente dele. Mesmo agora, que ele estava tão perto, os dedos correndo por meu pescoço em um carinho de vai e vem.
— Tá acordada? – Harry sussurrou no meu cabelo.
Respirei fundo e me ajeitei no sofá, segurando firme em sua blusa xadrez e usando seu ombro como travesseiro. Não era exatamente macio, mas estranhamente confortável.
— Sim – respondi sem tirar os olhos da televisão.
Harry remexeu ao meu lado e, bom, quase que embaixo de mim, visto que eu estava quase sentada em seu colo.
— Bom. Eu tenho uma coisa pra você.
Arregalei os olhos quando senti algo duro entre nós.
— Harry! – sussurrei com mais urgência, me afastando levemente para conseguir olhar em seus olhos.
Mas, para o meu alívio, Harry tirou uma caixa retangular do bolso da calça.
Percebendo a minha cara, seus lábios se entortaram em um sorriso convencido.
— Vamos lá, você sabe que eu sou mais grosso que isso...
— Cala a boca – empurrei seu ombro, ganhando mais um sorriso como resposta.
— Sh! – um dos casais censurou, mas não pude identificar quem era.
— O que é isso? – diminui ainda mais o tom, sem querer atrapalhar o final do filme para meus amigos. Por mais que já tivéssemos visto aquele 3 vezes naquelas férias. A coleção de Harry era um tanto quanto limitada.
O capiau passou a língua nos lábios e deu os ombros.
— Bom... – suspirou, a voz soando um pouco mais séria. — Eu sei que você usou aquele colar de coração por muito tempo... Eu vejo como você corre as mãos pelo próprio pescoço às vezes, procurando por algo, mesmo sem perceber... E aí eu vi isso e pensei que poderia ajudar como um substituto.
Meus olhos desceram para a caixinha quando ele abriu, me permitindo ver um cordão prateado com um pequeno pingente. Mal percebi meu sorriso quando notei que era um focinho de porco.
— Babe?
— A ideia foi minha, mas eu deixo ele ter alguns créditos de inspiração.
Eu ainda estava rindo quando dedilhei o colar. Era delicado e lindo... Eu tinha adorado.
— Eu sei que é estranho eu estar te dando agora, do nada, mas quando estamos sozinhos eu sempre acabo esquecendo... Você me distrai demais.
— Ah, né? – ergui as sobrancelhas, observando Harry tirar o colar da caixinha e abrir, passando ao redor do meu pescoço.
— Sim. Mas eu te perdoo por isso... Confesso que fiquei em dúvida sobre esse ou um que tinha uma ferradura de cavalo.
— Ferradura? – franzi o cenho.
— Bom, você gosta de cavalos de novo agora e nós dois sabemos que você sabe cavalgar muito bem.
— É claro – estreitei os olhos, tentando inutilmente esconder o sorriso enquanto ele ajeitava o colar em mim.
— Mas achei que podia passar a ideia errada, como se eu tivesse te chamando de potranca ou algo do tipo.
— Que atencioso.
Harry finalmente terminou de ajeitar o colar e me olhou, os olhos verdes brilhando contra os meus.
Subi os dedos pelo colo até encontrar a correntinha, sentindo meu coração disparado contra a minha palma.
— Obrigada, Harry – fui sincera, agradecendo por mais do que aquele colar... Por tudo o que ele tinha feito por mim naquele verão. — Obrigada de coração.
Ele sorriu de volta, se aproximando para dar um beijo quente na minha testa, voltando a passar o braço por mim e me puxando para ele.
O filme continuou o seu desfecho, mas eu não prestei atenção. Estava ocupada dedilhando o meu novo colar e sentindo o peito de Harry subir e descer sob minha bochecha.
Quando dei por mim, os créditos já estavam subindo.
— Alguém pega um lenço pra mim – Sky pediu, desgrudando de Liam e se sentando no colchão.
— Você chorou? – Niall estranhou, levantando para pegar o que ela tinha pedido.
— Não, é pra secar o meu cabelo, Liam chorou em cima de mim. Juro que tem baba na minha roupa.
— Bom... – Liam fungou, também se sentando. — Você não pode me culpar, é emocionante.
— É um filme sobre carros.
— E daí? – o garoto se defendeu, esfregando os olhos. — Eles pegando estradas separadas no final... Isso é lindo, cara.
— É a terceira vez que assistimos só esse mês, precisa mesmo chorar em todas? – Sky rolou os olhos, aceitando o lenço que Niall ofereceu a ela.
— Deixa o Liam expressar sentimentos – Maya riu, abraçando Niall de volta no sofá. – Não é como se fôssemos assistir de novo, de qualquer forma...
— Por quê?
— Porque não temos tempo – Maya disse como se fosse óbvio. — Estamos indo embora semana que vem, então não dá pra assistir a coleção do Harry de novo.
Franzi o cenho, observando um ponto aleatório na sala.
Eles continuaram conversando sobre os preparativos da nossa viagem de volta, mas eu parei de ouvir, os dedos congelados na correntinha.
Nós íamos embora semana que vem?
O verão tinha acabado?
Como eu não percebi isso?
Harry tinha percebido? Ele sabia?
Eu me perguntei se ele sentia como meu corpo tinha ficado tenso rente ao seu, mas não tive coragem de levantar o rosto para conferir.
Ele não tinha se mexido um milímetro sequer, permanecendo imóvel. A única coisa que mudou foi que, alguns minutos depois, seu abraço se apertou ao meu redor.
E foi aí que eu devia ter percebido que algo estava errado.
Primeiro, Harry me segurou com força, mas então, ele me soltou.
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