Uma semana depois
Faziam quase dez dias que Marina Cook Muller estava desaparecida da cidade.
A última pessoa que a viu: Leon Lockhead.
''Bem depois que o Zero apareceu no telão, na homenagem para a Sra. Jennevive, ela ficou meio esquisita, então ela disse que iria no banheiro e não voltou mais... Eu até pensei que ela tinha ido para casa... A-a Marina não gosta muito der dizer Oi e Tchau, então eu não estranhei muito a sua atitude, na hora...''
Foi a história que ele repetiu mil vezes para cada um dos vigilantes que o interrogaram em busca de maiores respostas.
Galatia por sua vez tinha passado os últimos nove dias fazendo três, e apenas três coisas: A primeira era passar a manhã e a tarde atravessando a larga floresta que rodeava Bexley junto à equipe de busca formada por cidadãos que se voluntariaram para procurar pela garota. A segunda era sentar-se em silêncio na cama tentando juntar as peças daquele quebra-cabeça em busca de alguma nova pista que pudesse trazer sua amiga de volta.
A terceira, e a única que a mantinha sã, era passar a noite conversando com Colt Carlile no telefone. O rapaz, que estava em Burlington acompanhando o irmão mais velho e cuidando de suas despesas hospitalares - para que o pai, Charles, não fosse contatado - ligava para a garota todas as vezes em que tinha um tempo livre.
- Como estão as coisas aí? Aqui as coisas estão indo... Meu irmão ainda não acordou, mas... Os médicos falaram que é uma questão de tempo - Ele dizia, e então iniciava outro assunto mais leve para divertir Galatia.
As vezes partia para um quarto afazer, quando se cansava de olhar as redes sociais de Marina em busca de um sinal de vida, internet ou localização. Galatia Gray caminhava até o quarto da mãe para que Gisele acariciasse seus cabelos até que conseguisse dormir.
No décimo dia, despertou as cinco da manhã, com o céu ainda arroxeado pelo fim de madrugada. Embora o corpo estivesse pesado e os olhos caídos, não seria capaz de voltar a dormir, então levantou da cama dos pais e foi lavar o rosto no banheiro.
Galatia empurrou um amontoado de folhas com os pés. A vegetação que roçava contra sua perna estava gelada pelo vento frio daquele começo de manhã. Assim que acordou, trocou de roupa e sem ao menos colocar algo no estômago correu para o ponto de encontro do grupo de busca: A Praça dos Andarilhos.
Andarilhos, que engraçado.
O grupo que a cada dia que passava se tornava menor e mais desacreditado, percorreu a mesma rota da semana passada; o contorno do lago Champlain. Haviam alguns barquinhos de pesca sendo atravessados por Vigilantes, mas até estes tinham diminuído em quantidade, comparado ao dia do sumiço de Marina.
O peso da desnutrição e insônia pareciam puxa-la contra o chão com uma força maior que a da gravidade. Não tinha nem forças para gritar pelo nome da amiga, como tinha feito com fervor desde o primeiro dia de busca. Ninguém mais tinha forças.
Quando já caminhava com os olhos fechados e a cabeça baixa feito um zumbi, de volta para a Praça dos Andarilhos depois de mais uma busca mal-sucedida, uma mensagem vibrou em seu celular.
''Aonde vc está?''
Era de Colt, mas Colt não costuma digitar nenhuma sigla ou gíria da internet, então Galatia estranhou.
''Na busca, e você?''.
''Me encontre na feirinha''.
A notícia inesperada teve o efeito de um energético em Galatia. Feirinha, a essa hora da manhã? O que será que Colt tinha em mente? Por que não avisou a ela que voltaria hoje?
Sem pensar muito a garota traçou seu caminho até o local.
A feirinha era a poucos blocos de distância, e a pequena ruela que cedia espaço para que ela acontecesse estava bloqueada por alguns cones de rua. Galatia empurrou um deles, com facilidade, e buscou com os olhos o rapaz, em vão.
Quando prestes a dar um passo a frente, uma mão envolveu sua cintura com certa ardência. Ao virar-se de brusco para sua traseira o dono da mão, atrás dela, fez com que Galatia soltasse uma exclamação assustada.
- Bay!
Bay Bachmann assustou-se com seu susto enquanto dava um passo desajeitado para trás.
- Foi mal, garotinha! Eu achei que era outra pessoa de costas! - Ele implorou. Havia uma vergonha em seu rosto que era nova em todos os anos que Galatia o conhecia - Eu não sabia que era você! Eu nunca ia encostar em você desse jeito, em um milhão de anos! Quer dizer, não que eu não iria querer encostar em você por que se você quisesse você sabe que ia querer também, e muito, mas se além daquela história da Angela eu ir para cima de você acho que o Colt vai acabar mandando me matar. E eu não quero encher o saco dele! Eu gosto do Colt! Ele é o cara! Espero que um dia que ele me perdoe por ter pegado a mulher dele-
- Bay... Relaxa! - Galatia disse, surpresa pelo disparado de falas que o menino soltou só por uma confusão como aquela - Foi só um mal-entendido...
Bay respirou fundo e levou as mãos aos joelhos em um gesto quase teatral.
- Eu sei! É que... Eu não estava mais fazendo esse tipo de coisa, garotinha, mas a poucos minutos atrás eu recebi a mensagem de uma garota, pedindo para me encontrar aqui, e eu não poderia negar esse pedido, por mais que isso custe minha vida eterna. Namoral, não conta para ninguém lá da igreja. Porfavor!- Ele implorou, aproveitando que já estava com o corpo curvado para se ajoelhar no chão.
- Bay, pelo amor de deus, eu não vou contar para ninguém! - Galatia garantiu, com as mãos fazendo o garoto se erguer novamente - Não é nada demais, eu também vim encontrar o Colt... Só não encontrei ele ainda...
- Ah... - Bay abriu um sorrisinho lateral mais condizente com seu verdadeiro eu - Então você e o Colt também tinham um caso desde aquela época, igual eu e a Angela?
Quando estava prestes a responder um ''Não!'' impaciente, Leon Lockhead se aproximou correndo no horizonte.
- Oi, Gala... Bay?- Exprimiu, confuso, como se não estivesse esperando encontrar aquela segunda pessoa ali- O que vocês estão fazendo aqui?
- Bem, eu recebi uma mensagem do Colt pedindo para me encontrar aqui e o Bay também recebeu de alguém - Explicou - E você?
Leon balançou os cabelos negros, confuso.
- Eu recebi uma mensagem sua, Gala.
- Minha!?
- É! - Leon ergueu o celular até a altura de Galatia para que ela pudesse ler a mensagem, que dizia exatamente a mesma frase da mensagem de Colt: ''Aonde vc está? Me encontre na feirinha''.
- Eu não mandei isso! - Galatia garantiu então sacou o celular do bolso - Eu recebi a mesma coisa que você! Exatamente a mesma frase, mas supostamente vinda do Colt.
Bay apertou as sobrancelhas ruivas.
- Eu também recebi isso, só que da Blanche - Foi sua vez de estender o celular.
- A Blanche Balthazar?! - Leon perguntou, tomando o aparelho da mão do ruivo para ver a mensagem de perto.
- É por ela que você está virando herege? - Galatia brincou, risível.
- Não! - Tentou se defender, mas seu tom de voz infantil denunciou seus sentimentos - Talvez...
- Não é isso que importa agora - Leon relembrou - Que tipo de brincadeira é essa? Quem pode ter feito esse tipo de coisa?
Os três jovens passaram a escanear a rua deserta com cuidado, na tentativa de desvendar se aquilo era alguma espécie de armadilha. Leon recolheu uma larga tora de madeira do chão com dificuldade, pronto para estourar - heroicamente - a cara da primeira pessoa que aparecesse ali.
Mas essa pessoa foi Blanche Balthazar.
- Que merda você está fazendo com esse pedaço de madeira na mão? - Ela grunhiu enquanto se aproximava com sua expressão carrancuda de sempre.
- Blanche... O que você tá fazendo aqui? - Disse, devolvendo a tora ao asfalto, sem fôlego.
- Bateu a cabeça? Foi você que me mandou vir até aqui.
Leon e Galatia se entreolharam com expressões suspeitas. Bay demorou mais alguns segundos para acompanhar o raciocínio e fazer o mesmo.
- Deixa eu ver seu celular - Leon disse, tomando a liberdade de se aproximar da garota e mexer em sua bolsa - É exatamente a mesma mensagem! - Anunciou, mostrando-a para Galatia.
Enquanto Galatia e Leon analisavam o celular de Blanche, Bay Bachmann acenou para ela com um sorriso bobalhão, cujo ela respondeu com uma revirada de olho e um grunhido.
- Isso é muito estranho... - Galatia murmurou.
Do lado oposto da rua, antes que pudessem fazer mais perguntas, Angela Ashwood em sua saia de paetê e botas de frio, enfiou-se entre dois cones que isolavam a rua da feirinha do resto das ruas e analisou com insegurança aquele grupo de amigos.
- Achei que iria ser só nós dois, por que chamou outras pessoas? - Voltou a pergunta a Leon em um tom de voz temeroso. Galatia estranhou sua postura acanhada, mas era a primeira vez que via Angela interagindo com Leon sabendo do caso dos dois, então estava prestando máxima atenção.
- Não fui eu que te mandei essa mensagem - Respondeu de pronto, sua própria postura foi murchando em mágoa e uma pitada de raiva - Alguém mandou mensagens para todos nós fingindo ser outra pessoa. Deve ser algum tipo de brincadeira, você já pode ir embora.
Angela com uma expressão magoada no olhar impetuoso estava prestes a dar uma meia volta quando Galatia disse um;
- Espera!
O grupo se entreolhou e a própria Galatia continuou.
- Seja lá quem fez isso, deve ter feito por um motivo... E se...
- E se tiver algo haver com a Marina? - O próprio Leon completou.
Os cinco abaixaram a cabeça de forma pesarosa, mas Angela foi rápida em desviar o olhar e tentar esconder os sentimentos.
- Apesar de esperar que encontrem ela viva, eu não tenho nenhuma amizade com a Marina. Devo ir embora - Disse ríspida, mas seus olhos emitiam uma certa compaixão reprimida.
- Mas e se isso tiver vindo de alguém que saiba sobre ela? Ou sobre quem está fazendo isso com todo mundo? Você não quer tentar descobrir quem está atormentando a cidade? - Galatia perguntou, mas Angela continuou tentando se manter indiferente.
- Será que não é a própria Marina mandando essas coisas? - Blanche teorizou.
- Não, para alguém ter mandado mensagens pelos nossos números tem que ter sido alguém que sabe hackear e- - Bay se auto-interrompeu quando um pensamento novo brotou em sua cabecinha.
- Hackear... O Hacker, o Zero! - Leon materializou a idéia de Bay - Será que não foi ele?
Blanche e Bay concordaram com a possibilidade.
Galatia estava prestes a falar mais alguma coisa quando o Audi de Colt, em alta velocidade, cantou pneu ao estacionar bruscamente ao lado dos cones de plástico.
Não demoraram segundos para que o menino descesse do carro com o semblante pálido e apavorado.
- Galatia, o quê aconteceu!? - Ele perguntou, correndo em sua direção. Quando alcançou-a segurou a pelos dois braços a analisou com cuidado - Fizeram alguma coisa, com você!? Eu vim correndo de Burlington assim que eu recebi a mensagem!
Galatia balançou a cabeça confusa.
- Colt... Você recebeu alguma mensagem minha?
Colt saiu do transe de preocupação ao escutar aquilo e sacou o celular do bolso depressa.
''Socorro, acho que vão me matar, estou na feirinha de Bexley''
- Não foi você que me mandou isso...? - Deduziu.
Galatia negou e explicou a situação das mensagens. Então o grupo todo passou a analisar seus próprios integrantes, com incerteza. Angela soltou um grunhido agudo depois de alguns segundos.
- O que essa bobagem significa? - Ela perguntou retoricamente, cruzando os braços contra o estômago - É alguma brincadeira com a minha cara? - Apontou com a mão espalmada para Leon, Colt e Bay.
- Não é uma brincadeira só com a sua cara. A vida não gira em torno de você e dos meninos que você fez amor antes do casamento - Blanche rebateu, mas seu tom não era ofensivo e sim mecânico.
- Então por que é que alguém chamou exatamente esses três meninos e eu para o meio do nada?!
- Dois. Nós nunca - Colt deixou claro.
Angela revirou os olhos, sem graça.
Leon arregalou os seus, incrédulo.
Galatia desviou-os para outro lugar.
Bay Bachmann bocejou.
Blanche manteve sua cara de paisagem.
- Bom, pelo menos você ainda tem chances de ir para o céu - Blanche ressaltou, fazendo Colt piscar de forma rápida para Galatia com um pequeno sorriso no rosto.
- É... Talvez eu até já tenha estado lá - Ele respondeu.
Foi a vez de Galatia disfarçar um pequeno sorriso. Blanche apertou as sobrancelhas finas sem entender aquele comentário.
- Mas, afinal de contas, o que estamos todos fazendo aqui? - Bay retomou a discussão, passando as mãos pelo espetado cabelo ruivo.
- Ainda acho que tenha alguma coisa haver com a Marina - Leon comentou.
- Foi você que viu ela da última vez, não foi? - Colt questionou e Leon assentiu - Ninguém mais viu ela depois? Perto da escola?
O grupo balançou a cabeça em negativo.
- Eu fiquei pensando... Ela tinha me dito que ia no banheiro e nós estávamos no ginásio da escola. E se alguém sequestrou ela lá dentro? Eu lembro que mandei mensagens para ela quando percebi que ela estava demorando a voltar e lá mesmo o celular dela começou a dar como sem sinal - Leon retomou.
- Isso é só uma possibilidade entre milhares de outras. Ela poderia ter sido sequestrada a caminho de casa, um dia depois, etc. Além do mais como é que ela seria sequestrada dentro da escola e levada para fora de lá sem ninguém ver? - Angela acabou opinando.
- Exatamente. O portão está cheinho de guardas. Voltaram até a exigir nossas carteirinhas antigas para entrar. Não tem como ninguém ter pegado ela lá - Bay complementou.
- Na verdade... Talvez essa não seja uma ideia tão ruim - Galatia disse - No dia em que a Sra. Jennevive foi assassinada, eu tive a impressão que seja lá quem atacou ela correu por alguma outra saída. Alguma que talvez nós não saibamos da existência.
Colt concordou.
- O Lago Champlain também corta a parte detrás dos fundos do colégio. Aquela vez no noticiário os Vigilantes falaram que é provável que quem fez aquilo com a Pao fugiu nadando - Leon adicionou.
- Tá brincando? Dá para passar uma barca por lá de tão extenso, não tem como alguém atravessar nadando o lago atrás da escola! - Bay bradou - Acredite em mim, uma vez eu levei uma mina lá e quando nós começamos a fazer-
- Bay, nos poupe dos detalhes - Galatia pediu com um sorriso.
- Ainda assim, não custa tentar. Nós podemos ir lá no final de semana e ver se da para atravessar - Leon sugeriu, animado. Colt concordou com a idéia.
- Se nós conseguirmos descobrir o caminho que essa pessoa está percorrendo para cometer os assassinatos, talvez a gente consiga pegar ele e achar a Marina - Foi a vez de Colt.
- Isso! Achar o covil dele! - Leon concordou, entusiasmado.
- Nós meninas podemos ir no colégio... Ver o que da para descobrir - Blanche sugeriu.
- Vocês podiam tentar dar uma olhada nas câmeras de segurança de lá, também. Os Vigilantes disseram que não tinha nada demais mas ainda assim não liberaram a filmagem. Eles estão fazendo um trabalho de merda - Leon reclamou - Sem ofensas, Bay.
Bay deu de ombros, não-ofendido.
- Não sei por que estão agindo como se eu fosse participar disso - Angela protestou. O rosto empinado em uma de se manter esnobe - Não vejo nenhum motivo para isso.
- Que tal sua amiga Poppy? - Leon retrucou.
Angela calou-se por um instante então perdeu a postura, vencida.
- Tudo bem... Final de semana, então?
- Sim. Todo mundo vai participar? - Colt questionou, o restante não hesitou em assentir.
O grupo todo concordou então discorreu o planejamento do que fariam no final de semana e como fariam aquilo escondidos dos Vigilantes, se esquecendo completamente das circunstâncias misteriosas que os colocaram juntos.
- Uma investigação de verdade! Como é que não pensamos nisso antes? - Leon comentou enquanto estavam no tópico de horários.
Colt e Galatia se entreolharam por um pequeno instante de forma divertida.
Como não?
Desculpem se tem algum errinho, to morta de sono mas queria postar um hoje ainda, amanhã vou corrigir sem falta!
Não esqueçam de dizer o que acharam.