Capítulo 97

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Thiago narrando

Desde que saí do hospital minha vida tem sido um inferno, principalmente por eu estar com esse gesso na perna me tornando totalmente dependente da minha mãe, coisa que eu odeio. Carioca voltou a pesar na minha cabeça com umas idéias de dar golpe de estado no L7... Admito que o plano é bom mas a Heloísa jamais me perdoaria e eu já me deixei levar demais pelas ideias desse desgraçado.

Eu nunca tive laço de família com ele, tá ligado?! Ele sempre foi invejoso pra caralho, dizendo que eu ia ter que ralar pra ter o morro se não ele ia passar pra qualquer um, era rígido pra caralho comigo, fez da minha infância/adolescência quase um inferno.

Mãe: Já tá com fome? -me jogou uma blusa-
- Porra mãe, tá chatinha hoje, hein. Já não falei que tô tranquilo? Quando eu tiver com fome vou avisar. -bufei-
Mãe: Olha o jeito que tu fala comigo, hein Thiago. Termino de quebrar o resto do teu corpo em dois tempos! -ela saiu do quarto-

Coloquei a blusa e levantei da cama com a ajuda das muletas e saí do quarto devagar.

- Vou sentar aqui no portão, tem como pegar uma cadeira pra mim? -falei com a minha mãe assim que cheguei na sala-

Como eu sou filho único, minha mãe me paparica pra caralho. Desde que meu pai morreu, nunca mais vi ela com namorado firme, tinha uns maluco que ela ficava mas nunca era nada sério e ela sempre disse que era pq não queria que ninguém tomasse o lugar do meu pai na minha vida. Acabou que a presença masculina que eu tive foi do meu avô, que me ensinou tudo desde menorzinho, e o Carioca.

Mãe: Vai indo lá que daqui a pouco eu levo. -assenti-

Eu ainda tava cheio de hematomas pelo corpo, no rosto principalmente, aquilo doía pra caralho às vezes.

Cheguei no portão reparando que o sol tava dando moca, a criançada brincando na rua, como sempre, e os soldados pra cima e pra baixo pelo morro. Cumprimentei uns que estavam do outro lado da rua e sentei na cadeira que minha mãe tinha acabado de me trazer.

Bryan, um menor de 10 anos, que tava correndo na rua com a molecada assim que me viu chamou todo mundo e veio correndo até mim. Ele é uma das crianças daqui do morro que eu ajudo a família, dou cesta básica, gás e essas paradas, o pai dele meteu o pé quando ele tinha 2 aninhos. Teve até uma vez que ele me disse que era meu fã e queria ser igual a mim quando crescer, vê se pode.

Bryan: Fala aí, meu parceiro. -fez o toque comigo-
- Eai, como tá a escola?
Fael: Mesma chatice de sempre, né? -fez uma careta e eu ri-
- É mais tem que estudar pô.
Bryan: E vc, quando vai poder jogar bola com a gente de novo?

Lembrei que pelo resto do mês eu iria usar esse gesso e assim que eu tirasse eu ia colocar o plano de fuga em ação. Ainda não tinha parado pra pensar como iria ficar a família do Bryan e dos outros na minha ausência mas vou dar um jeito de resolver.

- Assim que eu consegui me livrar disso, -apontei pro gesso- vou voltar a ganhar de vcs. -eles riram debochando-
Bryan: Saí daí, perna de pau. -ri- A gente vai poder desenhar no teu gesso?
- Vai lá arrumar uma canetinha, que eu deixo.

Eles ficaram murmurando animados e correram pra não sei onde pegar a canetinha, fiquei rindo lembrando da minha época de moleque até sentir meu celular vibrar no bolso, peguei-o e desbloqueei.

(13:16) xxxx: Vou precisar de uma garantia que isso não é marmelada.
(13:16) xxxx: Se vira

Com certeza era o L7, a reunião com ele foi há uns dias, foi bem difícil entrar em consenso com ele... Fora que eu já tava no stress pq foi difícil pra caralho sair do morro.

Xt: Eai, irmão. -parou a moto na minha frente me dando um susto-

Guardei o celular no bolso e direcionei minha atenção a ele.

- Tá na paz, cria? -fizemos um toque-
Xt: Paz e tu?
- Na mesma. -dei os ombros- Tava até querendo trocar uma ideia contigo, bagulho sério.
Xt: Mas já tá nessa de bagulho sério? Mal chegou porra, tu precisa descansar. -sentou na calçada-
- Vou descansar quando eu morrer, porra. -ele riu fraco- Não quero que tu conte isso pra ninguém, Xt. Papo é um só!
Xt: Vou espalhar pro morro todo, foda-se. -deu os ombros- Até parece que eu sou algum fofoqueiro porra, fala logo animal!
- Eu vou meter o pé do morro! -falei baixo e ele me olhou incrédulo-
Xt: Vc vai o que??? -falou alto-
- Fala baixo, porra. Quer que o morro todo fique sabendo?
Xt: Quero mesmo é dar uma paulada na tua cabeça pra tu tomar juízo, filho da puta. -falo seco- Quer o que? Que o L7 te pegue de novo e dessa vez te mate???? Carioca perdeu uma puta grana pra te trazer de volta e vc nessa!

Sermão é com esse filho da puta mesmo.

- Cala a porra da boca e me ouve. -olhei pros lados- Eu não tô nem aí pro Carioca, Felipe, vc sabe disso. Só preciso que vc continue cuidando das crianças que eu cuido daqui do morro, vou deixar uma grana boa pra suprir as necessidades deles e só confio em tu pra isso. -falei sério-
Xt: Porque tu quer fazer isso, cara?
- Vou ter um filho, cara. -ele me olhou surpreso- Heloísa tá grávida, maior barrigão já. -ri fraco-
Xt: Não acredito que tu vai fazer isso. -passou a mão na cabeça desviando o olhar de mim- Dessa vez o pai dela vai te matar mesmo!

Prefiro não falar pra ele sobre o golpe de estado no Carioca e eu tô fechando com o L7 pra isso acontecer, capaz dele cortar minha cabeça de tanta porrada. Se tem uma parada que Xt preza é pela lealdade.

Xt: Tava querendo matar ela e agora tá querendo fugir com ela? Que merda vc tem na cabeça? -me olhou-
- Tu sabe que meu sonho sempre foi ser pai fi, e agora que eu vou ser, não vou abrir mão do meu filho por nada. Só vou precisar da tua ajuda pra sair do morro no dia da fuga, devo ficar lá no apê até ela chegar... -ele negou-
Xt: Carioca vai te caçar até o inferno e outra, essa porra vai dar merda pra mim pq ele vai associar que eu sei alguma coisa do teu sumiço! -falou inquieto-
- Relaxa, tudo vai dar certo. Tudo vai mudar depois que eu meter o pé!

Olhei as crianças voltando correndo na nossa direção.

- Não quero que tu se envolva em nada, só que tu cuide deles e saia do morro comigo no dia que rolar tudo.
Xt: Não acredito que tu vai me deixar aqui nessa porra. -levantou-
- Isso é ciúme? -ri e ele chutou minha perna boa- Vou te mandar as fotos do teu afilhado quando ele nascer.

As crianças chegaram, cada um com uma canetinha de cor diferente, imagina como esse gesso vai ficar... Puta merda.

Bryan: Eai tio Xt. -fez um toque com ele-

Eles sentaram a minha volta e começaram a se organizar pra ver quem ia fazer primeiro e onde, só conseguia achar graça da confusão deles.

Xt: Duvido que tu vai conseguir viver sem isso. -falou subindo na moto- Depois a gente conversa melhor! -assenti quieto-

Ele me analisou e ligou a moto metendo o pé.

Um pouquinho do Thiago pra vocês... O que acharam?

Julgando pelas coisas que ele já fez, merece segunda chance ou não? 

Votem e comentem muito, amores.

Do Asfalto ao Morro 2 Where stories live. Discover now