Capítulo 37

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Há pouco tempo tínhamos chegado em casa, porém eu não estava sentindo mais tanto à vontade como já me senti um dia. Era como se algo faltasse, não só dentro da casa, mas sim dentro de mim. Comecei a olhar cômodo por cômodo, tudo da mesma forma de antes, da última vez que estive aqui, os móveis, os quadros, os porta retratos, até o relógio quebrado na parede que eu mais Gabriel quebramos jogando bola sem permissão dentro de casa, um sorriso se fez em meus lábios ao me lembrar daquele dia, em como mamãe ficou brava com a gente, papai nem ligava, dizia que deveríamos mesmo aproveitar nossa infância. Papai.... ele era um homem bom sem a bebida por perto, era a melhor pessoa, meu herói, mas meu pai parecia ter duas identidades, meu pai e o alcoólatra agressivo, eu conseguia ver em seus olhos que não era mais a mesma pessoa quando colocava uma gota de álcool na boca.

Continuei andando pela casa, e lá estava a mesinha com vários porta retratos da família, eu e Gabriel bem pequeninos, outra de nos 4 pescando na represa que tem logo abaixo de nossa fazenda. Algumas lágrimas caem com as recordações... Tento afastá-las e me fazer de forte.
Entro no lugar que até então era meu quarto e de Gabriel, depois de uma certa idade ele quis ter seu próprio quarto e então fiquei com aquele.
Olho para o armário ainda com algumas roupas minhas, era aqui que eu me escondia quando meu pai chegava em casa bêbado e minhas crises de ansiedade e pânico atacava, eu entrava aqui dentro abraçada com meu ursinho e rezava para que tudo desaparecesse, e aqui eu ficava por um bom tempo achando que era meu ciclo de proteção.

São muitas recordações, nem todas são boas, mas são minha vida, a vida que eu tentei esquecer. As lembranças estão por toda parte, estou enlouquecendo com tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo.

Desço novamente para a sala escuto conversas na cozinha de mamãe e Gabriel, eles preparavam o almoço. Ando um pouco mais a frente e vejo meu piano, esquecido e empoeirado, dava para ver que ninguém o usava há bastante tempo, quem me ensinou a tocar foi meu pai, muitas vezes ele tocava e eu cantava, logo depois ele me ensinou a tocar também. Lembro que tínhamos uma musica, que era a preferida de papai, a primeira que ele me ensinou: Bohemian Rhapsody - Queen. Essa era nossa música, antes de qualquer outra, tocávamos essa sempre.

Tiro o pano branco de cima do piano. Passo os dedos por cima da madeira antiga, sentindo as marcas de uso, solto um suspiro pesado, era aqui que passava a maior parte do meu tempo livre, talvez todo o meu tempo livre, revesando entre o piano e o violão, a música era minha paixão. Levanto a tampa mostrando assim o teclado do mesmo. Deve estar desafinado, logo penso, toco uma nota qualquer para me certificar, e para minha surpresa não estava. Mamãe deve ter mandado afiná-lo quando eu estava fora. Sento no banquinho e automaticamente já estava tocando nossa música, muito tempo sem praticar achei que não ia conseguir, mas isso é como andar de bicicleta, a gente nunca esquece. E no momento que os acordes vão formando o som da música, eu entro em um mundo totalmente meu, como se não existisse ninguém, se não houvesse nenhum problema no mundo. Como senti falta disso.

(vídeo da música na mídia, é assim que imagino a voz de Diana, logo abaixo a tradução da música)

Isso é vida real?
Isso é só fantasia?
Preso em um desmoronamento
Sem escapatória da realidade

Abra seus olhos
Olhe para os céus e veja
Eu sou só um pobre garoto
Eu não preciso de compaixão
Porque eu sou fácil de lidar
Alto nível, baixo nível
Vou pra onde o vento me soprar
Não tem nenhuma importância
Para mim

Mamãe, acabei de matar um homem
Coloquei uma arma na cabeça dele
Puxei o gatilho, agora ele está morto
Mamãe, a vida tinha acabado de começar
Mas agora eu me perdi, joguei tudo fora

O PolicialWhere stories live. Discover now