— Seu tio está dominando cidades demais. Até Ghrèin faz sua vontade. Ele está assassinando seres e mais seres por toda Talmhainn, a Virtude tem um exército cada vez maior e está agindo com violência.

Raquel a encarava, incapaz de responder.

— Ele quer poder. Cada vez mais. Tome cuidado, blinde-se contra ele. — Ara alertou.

— Meu tio vai ficar longe do poder enquanto eu tiver o trono. — Raquel falou. Sua voz saiu mais forte do que esperava. Ela inspirou fundo, mordeu o lábio inferior. Ainda tinha muito de força em si, mesmo que a morte do pai a deixasse abalada.

Ara sorriu, sem saber o porquê, seus olhos também estavam mareados.

— No que eu puder ajudar, só me chamar. — a elfa disse.

Raquel assentiu, tentando sorrir. Colocou a mão no ombro da elfa, apertou uma vez, e foi embora.

Ara decidiu que confiava em Raquel como Rainha. Pena que não podia confiar em seu próprio líder.

Os últimos sóis tinham sido dedicados à desobediência das ordens de Ghrèin. Ajudar Iolanda à ir para outro continente não era exatamente o que Ghrèin tinha em mente ao dizer que Ara precisava "sumir com ela". Essa parte estava resolvida. Tinha evitado cometer um assassinato. E quanto aos próximos?

Ara começou a subir pelas rampas de madeira que contornavam a grande árvore, indo contra o fluxo da maior parte dos elfos que saíam de Lúchairt carregando caixas e mais caixas de suprimentos para a viagem.

Queria ir para uma das praças que, em uma raridade, deveriam estar vazias devido a toda a movimentação ao redor da princesa — ou melhor, rainha. Precisava pensar. Qual era o próximo passo, confrontar Ghrèin? Ara não tinha qualquer relevância em Lannuaine, sua palavra nada significaria. Imaginou se teria a oportunidade de falar para todos os elfos, e se eles a escutariam. Achava que não.

Chegou à praça, sentou-se em um dos bancos de madeira, e quis saber onde Anluath poderia estar. Ele era mais importante, tinha mais voz, era inteligente também, talvez soubesse o que fazer. Imaginou que os outros ouviriam, se fosse o arqueiro a falar. Pensativa, Ara não prestou atenção de imediato na chegada de Blath e Gaoth. Em Lannionad, em sua casa, não se preocupava em perceber todos os movimentos e estar pronta para reagir, não costumava ser necessário. Distraída, demorou a levantar o olhar e conferir quem chegava, e viu tarde demais que algo estava errado.

Blath carregava uma expressão atormentada, comprimia os lábios, tinha o cenho franzido, olhava de forma obstinada para o chão. Gaoth, em vez do sorriso leve que costumava apresentar, tinha o rosto impassível. Disse:

— Ara, você precisa vir conosco.

Confusa, Ara se levantou, e perguntou:

— Aconteceu alguma coisa?

Sem responder, Gaoth segurou Ara pelo braço e passou a guiá-la pelos corredores da grande árvore. Ara não sabia ao certo para onde estava sendo levada, mas tinha uma ideia. Também imaginava o porquê de tudo aquilo, mas surpreendia-se por ter sido descoberta, e tão rápido. Todo o cuidado, seu esforço, de Anluath e Maguí, todos os três excelentes em manter um segredo — e , pelo visto, tinham falhado.

Percorriam os caminhos de Lúchairt e, a cada elfo por quem passavam, Ara sentia uma nova tortura. Os olhares, o julgamento. Estava claro para todos que Ara havia feito algo de errado, não tinham noção do que poderia ser, mas toda a comoção lhes dava a certeza de ser algo terrível, e a encaravam cheios de ressentimento.

Chegaram nos cantos mais altos da grande árvore e Gaoth lançou Ara em um dos cômodos mais abandonados pelos elfos — uma cela. Um buraco oco na madeira, vazio, sem um banco sequer, separado do mundo por barras de ferro escuro. Trancafiada, Ara assistiu seus companheiros deixando-a para trás, Gaoth pela primeira vez permitindo que seus sentimentos transparecessem, e o que Ara viu nos olhos da amiga foi repulsa.

Livro 1 - A Elfa, O Homem e a Ordem [completo]Where stories live. Discover now