Parte 27

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O Rei estava morto.

Após um dia agonizante na sua confortável cama em um quarto de Lúchairt, Lázaro sucumbira durante o sono. Uma elfa chamado Luibhean cuidara do Rei, havia dado chás e passado uma mistura de ervas em sua testa, depois disso Lázaro tinha conseguido dormir. Raquel ficara ao seu lado, compartilhando da dor, segurando sua mão. Quando o pai finalmente adormeceu, ela, exausta, também descansou. Tinha acordado pouco antes de Lázaro ir, assistiu às últimas inspirações desajeitadas, e então o fim. Não soube dizer se era melhor ou pior do que despertar com o pai já morto.

O sol passou como um borrão, Raquel permaneceu sentada em sua cadeira, junto à cama do pai, e seus sentidos se desligaram. Olhava sem enxergar, escutava apenas murmúrios abafados, o ar era estagnado e o cômodo ao seu redor sumiu, desapareceu por detrás de uma cortina de névoa. A princesa deu pouca atenção quando Luibhean voltou para checar o estado do Rei, encontrando-o já falecido. Mal reparou quando Ghrèin, Ilirian e Blath entraram no quarto, não escutou o que disseram, as palavras respeitosas. Voltou a si apenas quando viu elfos mexendo no corpo, levantou-se e disse que faria ela mesma o que pudesse. O pai não estava tão pesado, tinha perdido muito peso nos últimos ciclos da lua.

Quando Raquel chegou ao chão de Lannuaine, já havia uma carruagem preparada. Era linda, alta, a estrutura formada com galhos pintados de branco, lenços da mesma cor escondendo o interior. Era adornada com flores e mais flores, de tons claros, amarelos e azuis. Tinha espaço o suficiente para deitar o Rei, por cima de um acolchoado também enfeitado com plantas. Era pacífico, ao menos. Raquel, com a ajuda de dois elfos, ajeitou o corpo de seu pai e parou, mais uma vez segurando sua mão, observando o rosto que parecia tranquilo.

Havia uma segunda carruagem para levá-la e uma comitiva já preparada. Os guardas reais que tinham ficado em Lannuaine montavam em seus cavalos, elfos também vestindo armaduras subiam em cervos e corcéis, outros com vestidos longos preparavam-se para ir a pé, entoando uma linda canção que Raquel não conseguia compreender, mas cujo significado atingiu sua alma.

Ara chegou em Lannionad no momento em que a comitiva se aprontava para sair. Tinha ficado confusa com toda a comoção, mas ao prestar atenção no que se falava, logo compreendeu. E entendeu que tinha pouco tempo. Precisava achar a princesa. Ara caminhou por entre os muitos elfos, procurando, se aproximando da carruagem maior. Ali viu Raquel, ainda ao lado do pai, a mão sobre a dele. Ara não se aproximou de imediato, ficou um tempo observando, temendo desrespeitar a dor da princesa.

Sentiu pelo Rei, era um bom homem, amado, gentil. Odiou-se por ter de atrapalhar a filha em seu momento de luto, mas temeu não ter outra oportunidade.

— Com licença, Raquel? — Ara chamou, ainda uns passos para trás da humana.

Tratou a princesa pelo primeiro nome sem perceber, só depois pensando que poderia ser um erro. Sequer sabia se Raquel lembrava-se dela.

Raquel se virou, os olhos estavam mareados, mas já conseguia prestar atenção ao seu redor, estava atenta, e reconhecimento preencheu seu rosto.

— Ara, oi. Não te vi muito desde que chegamos.

Ara abriu um sorriso triste, apologético.

— Passei muitos sóis fora da floresta. Escute, Raquel, posso falar com você, um pouco afastado dessa gente toda?

A elfa olhava ao redor, preocupada com as orelhas pontudas por perto.

Raquel estranhou o pedido, mas assentiu. Ara guiou-a alguns passos de distância da agitação. Quando tinha certa segurança de que não a escutariam, falou:

— Raquel, principalmente agora, você precisa ter muito cuidado com o Príncipe Zaras.

— Agora? — A princesa perguntou, e a elfa assistiu enquanto a compreensão de que seu titulo de nobreza, em verdade, não era mais o de princesa, surgia em seu rosto. A boca ficou entreaberta, olhos arregalados.

Livro 1 - A Elfa, O Homem e a Ordem [completo]Donde viven las historias. Descúbrelo ahora