Parte 23

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O comboio que chegou à cidade do Porto Austral mais parecia uma procissão — e talvez fosse mesmo. Leonel cavalgava ao lado de seu tio, Zaras, e atrás de um número considerável de padres. Um deles carregava o estandarte da Virtude e o outro, já que Leonel estava presente, carregava a bandeira com o símbolo real. O príncipe não tinha certeza se era o procedimento correto levar o brasão de sua família, sem o pai ou a mãe presentes, mas imaginou que ele e o tio bastassem. Eram da realeza também, afinal de contas.

O que mais incomodava Leonel não era o uso talvez inadequado do brasão, mas sim o cântico interminável. Os padres e monges não paravam com sua música sem graça, em uma harmonia sem fim e bastante monótona. Era estranho, toda aquela demonstração da religiosidade, acompanhada do número de soldados que os seguiam. O braço armado da Virtude vinha em grande quantidade, marchando, cavalgando, as armaduras fazendo barulho e se confundindo do entoar dos religiosos. Leonel não sabia exatamente o porquê de todos aqueles guerreiros, pareciam muitos só para a proteção dos membros da ordem. Mas, sem dúvidas, era poder.

O comboio cruzou as ruas estreitas e lamacentas de Porto Austral, se aproximando em passos lentos do mar. A cidade era movimentada, repleta de trabalhadores, muitos deles humanos, levando produtos de um lado para o outro, carregando barris, carroças, cestas. O cheiro era desagradável, óleo, peixe, urina, mas haviam outros odores para disfarçar, laranjas, flores, senhoras elegantes perfumando tudo ao seu redor.

O barão morava em um palacete próximo ao porto, para onde se dirigiam. Uma enorme construção de pedra branca, com colunas altas e grandes janelas de vidro. Sem dúvidas, aquela moradia havia custado uma fortuna. Leonel olhou para seu tio, Zaras exibia um sorriso diplomático no rosto esquelético, cumprimentava todos os humanos — bem vestidos — por quem passava. O príncipe pensou no exército, pensou nas amizades poderosas de Zaras, e se viu impressionado com a relevância que seu tio havia criado para si, apesar de não ter sido o herdeiro do trono.

Chegaram ao cais e Leonel se esqueceu por um momento de poder e política, sorriu. A vista para o mar era belíssima, o dia estava ensolarado e a água refletia o astro como se estivesse polvilhada de diamantes. O príncipe pensou em como a tarde seria agradável, naquele lugar magnífico, conversando com pessoas interessantes, com boa comida e bebida. Caso se comportasse bem, quem sabe não poderia começar a ser incluído nesse mundo? Fazer o mesmo que o tio. Não era o herdeiro do trono, mas poderia ser uma parte relevante da alta sociedade. Um intelectual? Leonel gostava de ler, era curioso. Ou quem sabe um estrategista? Uma mente para o comércio? Haviam muitas possibilidades para se viver bem em Carstvo, sem depender do título de rei. Ser um príncipe, Leonel imaginou, não poderia fazer mal.

A porta do palacete se abriu e Al Mahir, o barão e mestre dos portos, os cumprimentou com os braços abertos. Criados surgiram, receberam os cavalos, levaram as bagagens. Zaras deu ordens a um de seus homens e os soldados se dispersaram, os padres ficaram, se aglomerando em frente ao palacete. Logo, Leonel se viu de pé, ao lado de seu tio, e em frente à Al Mahir.

— Zaras, meu querido! Estava ansioso por sua chegada. — o barão pausou, examinando Leonel. — Você não me disse que viria acompanhado de nosso príncipe, mas que honra!

Al Mahir fez uma reverência para Leonel, que sorriu, desconfortável.

— Linda casa. — foi tudo o que Leonel pensou em dizer.

O barão olhou para trás, admirando se próprio palacete, antes de responder:

— É uma beleza mesmo. Mas teremos tempo de conhecê-la mais tarde! Agora, meu amigo, — ele se virou para Zaras — arranjamos o lugar perfeito para vocês. Vamos, é um pouco mais adiante na via, a praça em frente ao grande porto.

Livro 1 - A Elfa, O Homem e a Ordem [completo]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora