Iolanda, sem perder tempo, tomou outra direção. O suor ameaçava a pintura em seu rosto, e ela ansiava deixar Grande Chifre e o Reino. Mesmo que não soubesse exatamente o que havia para além das águas do mar.

Quando os casarões de pedra e tijolo se transformaram em casebres de madeira ou pau-a-pique, as bandeiras com águias sumiram e algumas cobras começaram a surgir. Ara sentiu, observou, em menor quantidade, ainda outro símbolo do qual não tinha qualquer memória ou referência, outro anel, mas este formado por nove pequenos círculos. Não tinha ideia do que se tratava.

— Como vamos saber qual barco é o certo? — Iolanda perguntou.

O plano envolvia embarcar Iolanda escondida em um navio mercante, que primeiro viajaria até a ilha de Ícarus, e depois deixaria o reino que os humanos chamavam de Carstvo. Havia sido uma decisão curiosa para Ara, que nunca ouvira falar que, além do mar, existiam outros reis, outras terras, outros povos, e descobrira que Carstvo e Talmhainn, no fim das contas, não significavam a mesma coisa. Talmhainn era tudo, Carstvo era limitado pelo controle de Lázaro e Valéria.

Ara tinha ficado bastante curiosa com essas outras terras. Por que não havia mapas, livros, ou até músicas em Lannuaine sobre tais lugares misteriosos? Havia elfos por lá? Maguí, mente por detrás da maior parte do plano, não soubera responder, mas imaginava que sim. A humana também tinha poucas informações, apenas conhecia histórias de navios que viajavam até portos estrangeiros para negociar tecidos, óleos, e armas, com humanos de pele estranhamente clara, olhos sempre azuis, cabelos e sobrancelhas tão loiros que por vezes pareciam brancos. Ara se lembrava da descrição de elfos que moravam nas montanhas do norte, era bastante parecido, fora o detalhe das orelhas. Imaginava se haveria algum motivo para isso.

Iolanda também era loira e com olhos claros. Talvez por isso Maguí tenha decidido mandá-la para tais terras.

— As bandeiras do navio. Vai ter uma igual a todas as outras, com o brasão da família real, mas também outra da Ilha de Ícarus. É um sol laranja em um fundo preto. E então procuramos pelo homem usando um gorro verde escuro.

Iolanda assentiu, voltou a baixar a cabeça, escondendo-se por debaixo do capuz, e caminhando em uma velocidade tremendamente comum.

Andaram pelas pequenas vias apertadas, cortando caminho entre carretas, porcos e lama, até voltarem para uma área mais organizada, com pavimentação de pedras, casas de tijolos, apesar de ainda humildes. O cheiro do mar se esgueirou pela via, atingindo-as, e logo podiam ver a água.

O porto era ainda mais cheio que o resto de Grande Chifre. Ara estava tonta. A quantidade de seres que caminhava pelo píer lhe parecia maior do que toda a população de Lannuaine.

E os navios. Ela nunca tinha visto nada igual, barcos sim, vários, mas aqueles eram diferentes. Construções gigantescas, altos, longos, pesados, uma confusão de cordas, tecido, madeira e gente. E atrás de tudo isso, a água.

Ara também nunca tinha visto o mar.

Distraída pela paisagem, em vez de caminhar até os navios e procurar pela bandeira com o sol, Ara desceu escadas de pedra que levavam à areia e à praia desocupada. Afastou-se do píer até conseguir uma visão mais limpa.

— Primeira vez que você vê? — Iolanda, que a seguia, perguntou.

Ara assentiu, hipnotizada pela imensidão à sua frente.

— Já tinha lido sobre. É difícil de imaginar como realmente é.

— Eu cresci perto da água. — Iolanda falou. — Sempre esqueço que muita gente passa anos sem conhecer o mar. É uma visão e tanto.

Elas ficaram em silêncio por um tempo, observando o movimento das ondas, e depois voltaram para procurar o homem com o gorro verde.

Não foi difícil, Ícarus é uma ilha de tamanho médio, com pouca população, e apenas dois navios carregavam sua bandeira. O homem vestindo o gorro verde organizava o carregamento do navio, parado ao pé da rampa que levava à embarcação e ditando ordens.

Ara cumprimentou-o, e disse que Maguí mandava lembranças. O homem as analisou de cima abaixo e respondeu, olhando para Iolanda:

— Você tem uma pequena cabine a boreste, mas chegando em Kuhlmta, eles costumam pedir papéis. Se você não tiver, vai ter que sair carregada dentro de um caixote.

Sem dizer nada, Ara retirou os papéis de sua mochila, entregou para Iolanda.

— Pode subir. Assim que der te mostro a cabine. — o homem falou.

Iolanda pousou seu olhar em Ara, com um sorriso. Também não falou, apenas assentiu, e subiu a bordo.

Ara voltou para a praia, sentou-se na areia e esperou o navio partir. Pôde enxergar a capa acinzentada de Iolanda dentro da embarcação que se afastava.

Suspirou. Iolanda não estava morta, mas havia sumido.

Issolhe dava tempo.

Livro 1 - A Elfa, O Homem e a Ordem [completo]Unde poveștirile trăiesc. Descoperă acum