94 - Reencontrando o passado;

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...

Quando Benício finalmente desligou o carro na conhecida rua de paralelepípedos vazia e estreita, meu coração pareceu se acelerar ainda mais. A viagem até ali, embora relativamente rápida, pareceu ser uma pequena tortura, já que tudo que havia feito durante o percurso foi imaginar o que falaria para as pessoas que estava prestes a reencontrar.

Não apenas isso. Eu tinha que explicar a elas por que sumi e não dei notícias. Tinha que explicar o que havia acontecido comigo durante aqueles meses. Tinha que pedir desculpas por ter sido completamente negligente. E não sabia como fazer tudo aquilo.

Mas era a sensação de estar ali de novo que mais mexia comigo. Aquele lugar me trazia lembranças, quase todas ruins. Ainda assim, não havia como esquecer que foi exatamente ali que minha vida começou a mudar. E lidar com tantas sensações ao mesmo tempo estava fazendo com que eu ficasse, no mínimo, confusa.

- Elas deviam ter ido na nossa casa. - Benício falou de repente, me assustando um pouco - Não devíamos ter vindo aqui.

Reparei que ele olhava fixamente para o volante, e tive a certeza que aquilo era apenas uma estratégia para não olhar em volta e lembrar do tempo em que ele também andava por ali. Estava óbvio que ele não estava confortável e que não queria tocar outra vez nesse ponto do passado. Um ponto que tínhamos em comum.

Mas eu tinha que enfrentar aquilo. Era algo pelo qual eu sabia que teria que passar, se quisesse superar de uma vez tudo que me prendia àquele lugar.

Me limitei a negar com a cabeça, e mesmo que seus olhos não saíssem do volante, sabia que ele podia me ver pela sua visão periférica. Testei minha respiração algumas vezes, tentando me acalmar e lembrando que minha filha não tinha absolutamente nada a ver com o que quer que me tirasse o controle e incomodasse sua paz.

- Vai ficar tudo bem. - Falei, querendo convencer a ele e a mim mesma que aquilo era verdade. Ele não respondeu. Quando entendi que aquela ansiedade só passaria quando finalmente fizesse o que tinha que ser feito, desafivelei o cinto de segurança e abri a porta. Benício repetiu meus movimentos logo em seguida, e foi exatamente nesse momento que Rosa saiu para a rua através da porta que dava para a cozinha, segurando um cigarro recém acendido e se virando na direção oposta à que estávamos, sem nos ver ali.

Ela caminhou despreocupadamente pela calçada, a passos lentos, tragando o cigarro e assoprando para cima a fumaça de forma distraída.

Enchi os pulmões de ar e de coragem, apenas para chamar a atenção dela.

- Rosa? - Chamei em um tom que ela me ouvisse, e imediatamente Rosa se virou para ver a quem pertencia o chamado.

Quando me encarou, parou de soltar a fumaça do cigarro no meio do processo, e eu até poderia imaginar que sua expressão de absoluta surpresa se dava simplesmente porque ela estava me vendo ali, depois de tantos meses sem ter notícia alguma minha. Mas eu sabia perfeitamente que metade daquele olhar de incredulidade se dava por Benício estar parado a alguns metros de mim, encarando-a também. A outra metade era por causa do tamanho da minha barriga, agora discretamente visível até mesmo por debaixo do casaco que eu vestia.

Depois de algum tempo - o que parecia ser uma eternidade - ela conseguiu voltar a si, talvez pela percepção do resto da fumaça que deveria ser expelida queimando seus pulmões. Fosse qual fosse o caso, ela resolveu falar também.

- Lís... - Rosa começou, repetindo o mesmo caminho que fazia entre meu rosto, o rosto de Benício e a minha barriga - Oi!

- Oi. - Respondi, me sentindo estranhamente calma.

- Você... - Ela recomeçou, agora encarando apenas minha barriga - Por onde você esteve? Nós te procuramos tanto...

- Me desculpem... Eu não queria que vocês se preocupassem... - Respondi, caminhando na sua direção e fazendo com que a distância entre nós diminuísse. Durante todo o percurso, seus olhos se mantiveram congelados no meu umbigo. Foi só quando eu já estava parada diretamente à sua frente que ela se mexeu de repente.

De Repente, Amor ❲✓❳Where stories live. Discover now