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Bernard Chapman: É engraçado. Hoje em dia, as pessoas quase não falam mais sobre o caso de Fallpound. Não por terem se esquecido do que aconteceu, mas por medo. Como se tocar no assunto pudesse desencadear uma nova onda de assassinatos. Da mesma forma que você não fala de um pesadelo que teve durante a noite. Você simplesmente levanta da cama, toma um banho e o sonho ruim vira névoa em sua memória antes mesmo de você sair do chuveiro. Isto é, se você não ficar pensando nele. O tempo quase sempre faz o trabalho todo, e é bom esquecer certas coisas. É bom não falar sobre elas. Palavras dão força ao mal.

"Mas não era assim no começo. Na época em que capturamos Abukcheech e sua seita, ninguém falava sobre outra coisa. Todos os olhos do país se voltaram para Fallpound. Lembro-me de chegar em casa cerca de uma semana depois daquela merda toda acabar, ligar a televisão e ver noticiário após noticiário, canal após canal mostrando sem parar as fotos das vítimas. Os rostos das 39 crianças assassinadas. Eram fotografias bonitas, preto e branco e 3x4 cheios de carinhas sorridentes, com dentes de leite faltando, bochechas gordas e olhinhos apertados para a câmera. Nada de olhos arrancados, línguas bifurcadas ou pele maculada por símbolos satânicos. Meu Deus, acho que passei um ano inteiro sem ligar a porcaria da televisão depois disso. As chamadas das matérias me deixavam enjoado: 'Tragédia No Interior da América: Mais de 180 Pessoas Mutiladas', 'O Massacre da Inocência: Crianças São Oferecidas ao Diabo por Seita Satânica', 'Sangue No Jardim de Infância'. Cacete, como se soubessem do que estavam falando. Como se tivessem mergulhado na escuridão comigo e minha equipe. Construíram até mesmo um monumento para os mortos em Fallpound. A estátua de um garotinho que tem aos pés os nomes de todas as vítimas. Imagino que tenha visitado o local".

Justin Pullman: Visitei. É claro que visitei.

B.C: Havia flores, como antes? Velas e buquês?

J.P: Aos montes. Mesmo agora, cinco anos depois.

B.C: Bom. Que bom.

(Silêncio).

B.C: Tudo sobre aquela noite é muito confuso. Como eu disse: um pesadelo que desaparece com o tempo. Mas posso afirmar a você com toda a certeza, Sr. Pullman: no final, Abukcheech não era um homem. Era alguma coisa completamente diferente. Tive um vislumbre dessa coisa antes e, até hoje, mantenho o que eu disse na época. Em Fallpound, nós enfrentamos algo que não era desse mundo. 

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