UMA LUZ NAS REVELAÇÕES

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- Pai, não estou doente..

Ele segura meu queixo e examina meu rosto e toca nos meus cabelos úmidos.

- E essa barba por fazer? - ele se afasta e puxa meu moletom. - E ainda diz que não está doente.

- Não estou com vontade de me arrumar - respondo, colocando a mão em seu ombro e levando-o à mesa para tomar café. - Vou trabalhar à tarde.

Maria termina de pôr a mesa ouvindo os elogios do papai pelo café. Enquanto nos servimos, reforço que apenas trabalhei até mais tarde, os olhos cansados são consequência de ficar muito tempo na frente do computador desenhando - e não de mais uma noite inquieta e quando adormeci, o pesadelo destruiu a vontade de ficar na cama.

Papai fala da ansiedade pelo desfile. E me olha como se estivesse comprovando que estou bem.

- O motivo desse rosto amassado é Heloísa. - Desvio o olhar para o prato. Ele usou a voz mais mansa do que de costume.

Ao sair do hospital, desolado, fui procurá-lo, porém usei o contrato como o motivo da discussão, não quero envolvê-lo nesta questão, embora as perguntas sobre sua esposa assaltam minha mente desde que ele chegou.

- Comparada às nossas discussões anteriores, essa é diferente. - Olho para o lado, os raios que atravessam a parede de vidro brincam no piso.

Ele assentiu e ficou esperando eu explicar, demoro mais do que o necessário mastigando pão.

- Conversei com ela ontem.

Ele dá o troco pegando uma fatia de queijo sem pressa, abre o pote de geléia, mas torce o nariz desistindo e serve-se de ricota.

- Pai, como ela está?

- Comendo, não quer Kiara fazendo ela comer a cada três horas e como sempre, foi atenciosa.

Todas as noites em que falo com Carina, Heloisa me responde e me deixa ouvir sua voz. Tem sido meu alento nas longas noites.

Não é o suficiente para mim.

- .... Carina tentou mostrar seus passos de dança... - Papai relata sua conversa com a neta sem tirar o sorriso dos lábios.

Falamos da sua apresentação de dança na escola e da minha decisão de ir mais vezes a Santana do Livramento, para ficar perto delas.

- Acho que até eu vou ter que mudar, Brenda não tem outro lugar para ir.

Papai fala com orgulho da caçula, porém admite que não tem controle sobre ela, e talvez ganhe um neto, pois conheceu João. Manifesto minha preocupação com essa relação por causa de mamãe já que está ficando séria.

- Eu resolvo isso - ele fala com firmeza, como não havia ouvido antes. - Quando ela volta?

- Prometeu que estaria na festa da Solis. Por quê?

Pergunto servindo-me do suco de laranja. Por seu silêncio olho para ele.

- Vou me separar da Virgínia.

- Pensei que essa frase não sairia de sua boca. Qual o motivo dessa mudança?

- Meus filhos merecem um pai melhor- Com olhar triste acrescenta. - E verdadeiro.

Examino seu rosto, nada de diferente nele, rugas a mais, menos cabelos. Nos encontramos pouco, porém estamos mais próximos do que quando morávamos juntos.

- Mamãe não vai aceitar.

- Tentei conversar antes de sua viagem. Ouvi as mesmas ameaças de anos - ele toca a aliança, eu sinto a sensação ruim das longas discussões que eles tinham - Você ainda sonha com seu avô?

Amor ValiosoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora