REENCONTRO SEM SEGURO

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"Concentre-se na Sílvia e apresente o melhor para o dono da Ótica Borges."

Repito, enquanto caminho para a sala de reunião, desde que comecei a trabalhar na Roval, é a primeira vez que tenho receio de enfrentar um cliente.

Esqueci o documento de propósito na minha sala, querendo ganhar tempo para o inevitável. Relutante com a mão na maçaneta, repito mais uma vez o comando, suspiro e abro a porta.

Busco Sílvia, enquanto peço desculpas, porém quase solto o documento ao ver o par de olhos sobre mim, mesmo sem me tocar sinto suas mãos no meu pescoço me sufocando. Busco o ar com dificuldade, Filipe praticamente me coloca na cadeira.

"Ele não podia adoecer." Penso em responder a Guedes. Não consigo estender a mão para Sílvia, embora sinta um enorme alívio ao ouvir sua explicação de que não tem contato com a sua ex-patroa, ela parece compreender minha aflição. Sílvia não representa mais perigo, mas o homem ao seu lado é o próprio fogo que me queimava, mesmo com o olhar frio me avaliando.

Meus lábios teimavam em não obedecer o encorajamento de Filipe, já as minhas pernas queriam correr, fugir da sala. Cinco anos escondida, mesmo numa cidade vizinha, um encontro apenas no aeroporto era prova suficiente para me sentir segura.

"Somos estranhos." Entendi seu recado.

Nossos olhos se cruzam, a hostilidade evidente nele, mágoa, desprezo e ressentimento. Em mim, desespero por saber o que fiz com o homem que eu amo, a distância e o tempo não foi capaz de me fazer esquecê-lo.

- Primeiro, temos que fazer um novo contrato - pigarro a garganta, para desfazer o nó e disfarçar a emoção. -, com as empresas franqueadoras, deixar de cobrar a renovação de franquia.

- E por que? - ele pergunta.

- Hoje não agimos mais com essa cobrança - Guedes se antecipa. - É um incentivo para as franqueadoras continuarem com o contrato.

Tentando recuperar o autocontrole e fazer as pernas pararem de mexer, pego uma pasta de documentos, mas não evito o tremor das mãos.

- A empresa anterior estava cobrando uma taxa abusiva - completo a explicação, entregando um relatório para ele e Sílvia. - Além de não repassar para o seu pai a rentabilidade, esses valores eram maquiados.

- Heloísa é ótima nisso. - fala Filipe.

- Eu alertei seu pai, sobre isso, recebi algumas reclamações de que taxas estavam sendo cobradas em um contrato adicional.

- Meu pai vai perder dinheiro com um novo contrato - Ele curva o corpo sobre a mesa e fala com desdém. - Dinheiro, Heloísa, que ele trabalhou para ter.

- Seu pai exigiu atenção máxima às franquias - respondo olhando para ele, em geral mantenho um controle nestes tipos de reunião, mas não é qualquer cliente na minha frente. - Caso fosse preciso, assumiria o prejuízo.

Por um instante, ele apenas me encara. Não consigo sustentar o seu olhar. Respira Heloísa - Ordeno - não olhe para ele. Endireito os ombros, o choque inicial, cedeu lugar ao orgulho.

- Ele também deseja renovação da marca, mas não é coisa que se possa fazer de uma hora para outra, minha equipe precisa fazer uma pesquisa de campo, a Roval oferece um serviço de Marketing, o que pode diminuir custos, além de todo o material usado nas campanhas.

- Alberto não quer mudar o amarelo. - fala Sílvia.

Peço que Filipe explique suas ideias de designer, ganho tempo para respirar e organizar os pensamentos, disfarço que estou lendo, enquanto o diretor de campo também fala que será preciso visitar a loja.

Amor ValiosoWhere stories live. Discover now