FALSAS IMPRESSÕES

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- Está esperando alguém entrar?

-Por que, não posso olhar para minha porta?

Repreendo o Tomás, sentado na cadeira à minha frente, ele bate com a caneta no documento em sua mão. Sinto seu olhar sobre mim, para disfarçar busco uma planilha no computador.

- Poder pode, mas depois não me culpe se algum número estiver fora do lugar.

- Repita os dois últimos, vou avaliar e pedir uma reunião com os clientes.

- Sua mãe é ótima nisso, em conquistar novos clientes. O que aconteceu, ela não quer mais participar?

- Ela não gostou por eu dar abrigo a Brenda.

Ele volta sua atenção ao relatório e eu tento prestar atenção no que ele fala, não mais olhar a porta e não mexer os pés sob a mesa. Eu sei que Isa já passou pela minha sala no período da tarde, o cesto de lixo vazio e o banheiro perfumado denuncia seu trabalho bem feito. Mais de vinte e quatro horas que eu a vi e não consigo acreditar que era ela.

- Qual será a estratégia para ganharmos essa conta?

- Você reúna todos esses dados, informe o setor de vendas e o diretor de marketing para uma reunião amanhã a tarde. Mais alguma coisa?

- Não, senhor diretor, nós terminamos por hoje - ele levanta e arruma seus papéis. - Vou pegar um livro seu emprestado.

Também levanto para alongar o corpo, fim de tarde, me aproximo da janela e vislumbro o céu refletido na fachada do shopping.

- Sairei mais cedo - ele fala, volto para a cadeira. - Hoje tenho compromisso com a noiva.

- Vai fazer alguma especialização? - pergunto apontando para o livro.

- Não, vou emprestar a Heloísa...

- Por que vai emprestar meu livro a faxineira, ficou maluco? - tomo o livro de sua mão. - Essa gente vai danificar.

- Obrigado por me lembrar de quem é filho!

Com rapidez pega sua pasta e antes que alcance a porta eu o interrogo.

- Por que ajudar uma desconhecida?

Ele apenas dar meia volta no corpo.

- Sou negro, sei o que passei na universidade por ser diferente - ele fecha o punho e dar um golpe na pasta. - Ela não é negra. - ele antecipa minha observação. -, mas é pobre, um agravante para pessoas sem empatia. Não, você não sabe o que é isso!

- Pegue antes que comece com seu discurso de bom samaritano. - Estendo o livro para ele.

Com um meio sorriso ele anda, pega o livro, porém o devolve à estante.

- Vou dar um jeito de continuar ajudando a garota, até amanhã, senhor, Borges de Mello.

- Não precisa ficar magoado.

Ele bate a porta, me deixando sem resposta, esqueci que ele passou por situações de preconceitos, embora sendo de uma família de classe média, não impediu de ser ofendido por causa da sua cor.

- Você está enganado, eu sei o que é sofrer por ser diferente. - respondo, para diminuir minha grosseria.

Permaneço olhando a porta fechada, ainda não me recuperei de encontrar Heloísa no meu escritório, vestida com uniforme da equipe de limpeza e o fato dela ficar um mês responsável para mantê-lo limpo. Sento e giro a cadeira para a estante atrás da minha mesa, duas prateleiras repleta de livros especializados em administração.

Amor ValiosoWhere stories live. Discover now