Capítulo 29

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Estava acontecendo de novo, aquela sensação impetuosa acelerando as batidas de meu coração imortal. Sentei na cama respirando com dificuldade, olhei para o lado encontrando o rosto sereno de Lucien, dormindo com tranquilidade, seus cabelos flamejantes espalhados no travesseiro branco.

Ele se ofereceu para dormir comigo desde que chegamos na Corte Primaveril, assim nenhum de nós se sentiria sozinho. Isso tornou meu banheiro um canto frequente todas as madrugada nesses últimos três meses.

Decidi não acordá-lo, mesmo que essa seja a milionésima vez que confundo o quarto escuro com as masmorras de Amarantha. Apesar de morta, aquela desgraçada continua acabando comigo. Levantei cambaleando, me enfiando no banheiro com urgência, caindo na frente da privada para vomitar tudo que comi durante o dia.

Quando as gorfadas cessaram, me afastei com cuidado repetindo um exercício de respiração. 1... 4... 8... 12... Sugando pelo nariz e soltando pela boca. 16... 20... 24... Segurando a respiração por três segundos e soltando pela boca.

Sentei no chão encostando na parede, puxando os joelhos para o peito. As sombras subiram pelos meus braços, acarinhando minha pele tremente. É real. Sussurraram. É real... É real... Você sobreviveu.

Assenti me acalmando um pouco, estou livre daquele lugar, aqui posso ver as estrelas. Ninguém mais se machucará.

Me levantei devagar aproximando da pia, encarando meu rosto opaco no espelho, pareço exatamente como me sinto, horrível e completamente destruída. As bordas da pia racharam com meu aperto, tirei as mãos como se tivesse levado um choque.

Força imortal era mais uma maldição que um dom. Amassei e dobrei todos os talheres em que toquei durante três dias depois de voltar, tropecei tantas vezes que Alis retirou qualquer bem de valor de meu quarto, ela ficou especialmente ranzinza quando derrubei uma mesa com um vaso de oitocentos anos.

O que me deixa ainda pior é a forma como Tamlin tenta manter minha irmã afastada de mim, escutei ele discutindo com Lucien sobre eu acabar machucando Feyre por sua fragilidade humana. Fiquei com muita raiva e sem querer acabei tocando fogo no meu quarto.

Eu nunca machucaria Feyre, ele não tem que proteger ela de mim como se eu fosse um monstro prestes a explodir.

Eu estou tentando me conter, não sou um monstro. Não sou...

Hipócrita. Minha mente voltou para Sob a Montanha repassando cada partícula de sangue derramado. O dia em que a humanidade se esvaiu do meu ser, um lembrete enraizado por todo meu corpo refeito. Assassina.

Talvez eu realmente seja um monstro egoísta.

Meus olhos pousaram na tatuagem do acordo, um vinco se formando em minha testa. Não tenho notícias de Rhysand à três meses, nenhuma palavra, aparição ou sinal, apenas silêncio. As vezes desejei interna e tolamente, que ele viesse para me buscar, o sentimento tão forte que chegou a me sufocar.

Parei de chamar por ele depois das duas primeiras semanas sem resposta, essas crises frequentes se tornaram minha maior preocupação. Talvez ele nem se quer me escute, e se escuta tenho certeza que ignora. Não importa mais, não tenho o direito de interferir em sua vida justo quando ele deve estar seguindo em frente.

Voltei para cama, deitando com as costas grudadas nas de Lucien, minha cabeça encostando embaixo de seu ombro musculoso.

— Senti você saindo da cama. Conseguiu se acalmar? — Ele perguntou grogue de sono.

— Consegui fazer parar, volte a dormir.

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CORTE DE PAIXÕES E SACRIFÍCIOS | ʳʰʸˢᵃⁿᵈWhere stories live. Discover now