Pensamentos em Ordem;

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»Kim Dahyun«

— Sim, boba, sou eu.

O tom risonho usado pela intercambista me fez ter certeza que, do outro lado da linha, ela estava sorrindo. E se a ocasião fosse diferente, eu também estaria; afinal, estava falando novamente com uma amiga sobre a qual eu nem tive notícias durante muito tempo, não seria nada fora do comum. Só que Any deixara de ser uma “simples” amiga no momento em que me beijou.

Foi algo ainda mais estranho porque há tempos em nem pensava mais em Any, pelo menos não na mesma frequência em que costumava pensar após todo o ocorrido que simplesmente virou a minha vida de cabeça para baixo. Eu a esqueci momentaneamente, minha cabeça se ocupou com outras coisas, como a perna machucada e as dificuldades que isso acarretou; as responsabilidades para com meu time; preocupações referentes à minha fé, assim como questionamentos quanto a minhas convicções; uma preocupação intrigante sobre o que Momo sentia por mim, e pior: o fato de que a ideia de eu estar me apaixonando por Sana se tornava cada vez menos difícil se se provar verdadeira.

Me senti péssima ao notar que, mesmo tendo sido levada ao acampamento por causa de Any, eu a havia esquecido por um período de tempo, cegada pelas novas experiências que Minatozaki Sana me proporcionava e me apegando a ela de uma maneira que eu nunca fiz ou faria com Any.

Ela tinha ido atrás dos meus amigos buscar informações sobre mim, pois com certeza não fora alertada sobre eu ter sido obrigada a abdicar de um verão preguiçoso com meus amigos idiotas e suas piadas estúpidas para me isolar no meio do nada com outros adolescentes problemáticos — não que agora eu possa reclamar disso, o verão que se desenrolava no acampamento já tinha entrado para a minha lista dos melhores que eu tivera, e ele nem tinha chegado ao fim.

Mas eu não podia dizer a ela que escutar sua voz no momento fora uma inconveniência que eu gostaria que não tivesse ocorrido, pois eu teria muito mais a pensar e repensar acerca dos meus sentimentos, então forcei um tom ligeiramente surpreso — não que fosse algo difícil, porque surpresa eu realmente estava — e contente ao responder:

— Caramba! Como você tá?

Eu poderia — deveria — ter dito qualquer outra coisa, mas meu cérebro não trabalha bem sob pressão. Ela obviamente não estava bem, pois, como eu já comentei antes, enquanto minha caixa de mensagens lotava com pedidos de redenção e votos de melhora, Any teve que lidar com pessoas que ela nem conhecia julgando-a por supostamente corromper uma boa alma. Era até impressionante que ela ainda estivesse disposta a me procurar pela falta de apoio que eu lhe dei.

— Tô sobrevivendo — respondeu, mas sem deixar-se abalar. — Mas e você, como tá? Imagino que não seja muito legal ser obrigada a passar o verão isolada do resto do mundo com um monte de crente.

Sua voz demonstrava hesitação, ela obviamente não estava segura no que dizia, talvez achando que os “crentes” do acampamento já tivessem finalizado sua lavagem cerebral em mim e agora eu a odiava e a sua existência.

Não soube o que responder: como diria a ela que, na verdade, enquanto ela possivelmente tinha passado por um verão medíocre, recebendo críticas de pessoas que não se importam realmente com ela, eu estivera cercada de pessoas que não apenas me entendiam, mas estavam dispostas a me ajudar quanto aos meus pensamentos confusos e entorpecentes? E, além disso, estava me apaixonando por uma garota, enquanto a esquecia lentamente? Transcrever esses pensamentos já me faz sentir suficientemente um monstro, não precisava dizê-los em voz alta também.

— É, aqui é realmente um pesadelo. Não vejo a hora de voltar à Seul.

— E eu não vejo a hora de te ver de novo.

Acampamento A.GWhere stories live. Discover now