Get Me Out

By ownthe-night

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Nos últimos dois anos tudo o que eu mais queria era não ter que ir àquele manicômio todos os meses para visit... More

Shadows
Loud Thoughts
Unplanned Changes
Church Bells and Phone Calls
Acknowledging Madness
Dream up, Dash off
Catalyst
Highways, Neighborhoods and Lies
Everything I Want, Everything I Need
Antidepressants and Sense of Humor
Taped Confessions
I Dont Want You To Leave
Wait Outside
Forget the Shelves, See the Irony
Brittle it Shakes
Karma
Take Shelter
One love, one house; No shirts, no blouse
Dazed and Kinda Lonely (part I)
Strung out, a Little bit Hazy (part II)
Telekinesis
When did We Grow Old?
Concilium
Tic-Tac
Rewind
I didn't mean to fall in love tonight
Over (part I)
Red Liquors and Silver Keys
Wednesdays
Hi
Until You Come Back Home
Write it down
Caos, herself

In the Clear Yet? Good.

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By ownthe-night

As luzes se apagam, cortinas se fecham e o público aplaude.

É geralmente isso que pensamos quando alguém fala a palavra "encerramento".

Finais, lágrimas e abraços de despedidas. Uma sensação melancólica no ar acompanhada de um breve tapa nas costas como quem diz "foi bom enquanto durou".

Eu penso muito nisso. Despedidas. Sobre o legado que eu vou deixar. Sobre quem eu vou deixar. Se meu nome vai ser lembrado. Como ele vai ser lembrado. E é engraçado, porque quanto mais eu penso nisso, mais assustada eu fico.  A mera possibilidade de eu partir antes de poder fazer o que eu tenho em mente me tira o sono. E se não der tempo?

Tempo. Não há tempo.

A lista é infinita: A quantidade ridícula de "eu te amo"s que não foram ditos por medo. Anos desperdiçados em coisas que apenas uma troca de olhares resolveria. Os inúmeros sorrisos travados pelo orgulho e pretensão. A ociosidade de deixar tudo para depois.

Isso tudo me faz refletir e a única conclusão que eu encontro é que, eu não tenho mais tempo. Não a perder ou desperdiçar, e sim pra passar horas ao seu lado. Ouvir sua voz, te ver sorrir ou rir histericamente de algo tolo. Te dar colo, acordar ao seu lado e sentir a sua respiração quente contra minha pele. Dividir minha vida, minhas conquistas e perdas, alegrias e tristezas, momentos bons e ruins. Independente do que for, desde que seja ao seu lado.

O meu tempo não acabou. Nós não estamos encerradas.

E eu te amo além da vida.

~~

A dor do peso metálico esmagado sobre minha perna beirava o insuportável. Eu ouvia gritos abafados de todos os lados. Hora aumentavam, hora diminuíam, mas eu realmente não sabia dizer o que estava acontecendo.

Um clique familiar seguido de uma voz ecoou em meu lado direito.

"Você está bem?!"

Lado direito.

Camila.

Virei meu rosto à procura dela e arregalei meus olhos ao vê-la encolhida no banco. A dona da voz desconhecida parecia ter dificuldade em soltar o cinto de Camila e a sensação agonizante de impotência me matava pouco a pouco.

"Ca-camila... Camila..."

"Moça, eu preciso saber se você está bem", a voz da estranha voltou a soar. Meu peito parecia que ia explodir a cada vez que eu puxava o ar para dentro dos pulmões.

Um par de olhos negros encontraram os meus por breves segundos.

"Sua amiga desmaiou, ok? Ela está ilesa e eu estou tentando tirar ela daqui o mais rápido possível pra poder te ajudar depois", explicou finalmente soltando o cinto. "Você consegue falar?"

Afastou-se rapidamente para segurar o corpo inerte de Camila e, devido à altura do veículo, sumiu de meu campo visual quando a deitou sobre o asfalto. Pude ouvir uma segunda voz, só não consegui identificar quem era.

"Camila... Onde ela..." A queimação em meu peito não permitia formular frases grandes. Isso me irritava.

"Camila está com minha outra amiga agora", explicou. "É apenas um desmaio, fique tranquila. Agora me diga seu nome", soou enérgica ao subir no veículo novamente e ficar de joelhos sobre o banco.

"Lauren", balbuciei.

"Normani", sorriu soltando meu cinto e levantando meu rosto com a ponta dos dedos. "Fique com o rosto assim e tente não se mexer. A senhora do carro de trás já chamou uma ambulância e eu vou ficar aqui com você até os paramédicos chegarem, ok?"

Assenti debilmente. Deus, meu corpo todo doía.

"Eu não... Eu não sinto meu braço esquerdo", admiti trêmula. "Está tudo dormente e eu não tenho c-coragem de olhar para o lado e ver o meu estado."

"Você está em choque", falou assentindo enquanto levantava meu rosto novamente. "A porta foi amassada e seu braço está preso entre ela e o banco."

"Então ele ainda está no lugar?" Pisquei incrédula. A dor insuportável em meu ombro agora finalmente explicada. "Meu braço ainda está no lugar?"

A risada melódica de Normani ecoou no interior do veículo.

"Sim, Lauren. Seu braço ainda está no lugar."

"Eu sinto gosto de sangue", falei. "Estou com hemorragia interna, não?"

Suas feições suavizaram. Crispou os lábios e abriu o porta-luvas.

"Você tem algum kit de primeiros-socorros por aqui?" Indagou enquanto revirava o compartimento.

"Embaixo do meu banco", falei. "Normani, me responda."

Esticou o braço à procura do kit em silêncio.

"Meu irmão é médico", falou colocando o estojo recém encontrado em seu colo. Puxou dois pacotes de gaze para fora e desembalou os itens. "Ele atende pessoas como você todos os dias e eu meio que aprendi bastante com os casos que ele me conta quando chega em casa."

Puxei o ar por entre os dentes ao sentir a gaze encostar em minha têmpora esquerda.

"Já percebi que você gosta de enrolar", rolei os olhos a fazendo rir.

"Você não vai morrer", falou. "Isso é o suficiente por enquanto, ok?"

"Como você sabe disso?"

Sorriu de forma travessa. Eu conhecia aquelas feições de algum lugar.

"Eu vejo algumas coisas aí."

Isso só pode ser piada.

"Minha namorada já acordou?" Senti uma pontada em minha perna esquerda apenas com a menção da morena.

"Quem?"

"Camila. Camila é minha namorada."

O sorriso casto que se formou nos lábios da mulher em minha frente, tiveram uma espécie de efeito calmante em meus nervos. Foi ali que soube que estávamos em ótimas mãos.

"Bea, como estamos aí?" Perguntou ainda sorrindo e com a voz elevada para que a amiga do lado de fora do veículo conseguisse ouvi-la.

"Tudo sob controle", uma voz mais jovem do que eu imaginava soou há alguns metros. Normani voltou a encostar a gaze em meu rosto, dessa vez em determinado ponto em minha testa.

"Ouviu isso, Lauren?" Indagou piscando o olho direito de forma divertida. "Tudo sob controle."

~~

"Amor?"

A voz angelical foi a primeira coisa alta e clara que meus ouvidos conseguiram processar. A exagerada claridade somada com a predominância da cor branca no quarto me fizeram piscar diversas vezes e a dor que eu sentia em meu corpo todo, era similar a de ter sido atingida em cheio por um carro.

Ironicamente falando.

Grunhi sentindo minhas pernas formigarem. Eu tinha a sensação de ter dormido por dias, mas contraditoriamente me sentia exausta.

"Amor..."

A voz soou novamente. Eu ainda não conseguia manter meus olhos abertos por mais de três segundos sem sentir uma pontada na parte de trás da cabeça. Talvez tenha sido a pancada sofrida na hora do impacto, pensei.

Alguns segundos se passaram e a linha tênue de silêncio no lugar onde eu estava me alarmou.

Era tudo muito claro, muito branco, muito vazio.

"Lauren."

Pisquei novamente. A figura familiar parada em minha frente possuía um sorriso triste nos lábios. Agradeci mentalmente ao notar que, de fato, ela se encontrava ilesa.

"Sofremos um acidente."

"Sim. Sofremos um acidente", pousou a mão sobre meu braço direito.

"Você está bem?"

Riu enquanto fechava os olhos e sacudia a cabeça em descrença.

"Você estava em cirurgia há cinco horas atrás, e você pergunta se eu estou bem?"

"Mas você desmaiou", tentei justificar minha preocupação. "Eu vi! Você desmaiou, amor!"

"E você fraturou duas costelas e um braço", estalou a língua. "Isso não é uma discussão, meu anjo."

Rolei os olhos em irritação ao ouvi-la rir novamente.

"Eu fiquei tão preocupada com você", admitiu em voz baixa ao sentar delicadamente na beira do colchão.

"Eu estou bem", sorri.

"É... dá pra ver."

Ri mentalmente.

"Não consigo lembrar de muita coisa. Mas Normani... A moça que nos ajudou lá..."

"Ela ainda está aqui", sorriu. "Eu fiquei conversando com ela enquanto você estava em cirurgia e... Preciso dizer que ela é encantadora."

"Encantadora, é?"

"Idiota", riu cobrindo o rosto. "Você entendeu o que eu quis dizer."

"Sobre o que vocês conversaram?"

"Quando nós chegamos aqui, eu ainda estava desmaiada. Então quando eu finalmente acordei, ela me contou tudo o que havia acontecido e ficou do meu lado até que eu me acalmasse."

"Isso foi... Extremamente gentil da parte dela", falei surpresa.

"Sim. Inclusive ela me obrigou a fazer uma bateria de exames apenas pra checar se estava tudo bem."

"E como foram os resultados?"

"Todos ótimos. Aliás, meu tornozelo está intacto e totalmente no lugar."

"Isso tudo... É bom ouvir", sorri. "É ótimo, pra falar a verdade."

"Eu me senti cuidada e amparada. No início foi estranho porque eu realmente não sabia o porquê de ela estar fazendo tudo aquilo, mas depois... Depois foi bom."

"Você ainda não se acostumou com pessoas cuidando bem de você", ponderei.

"Não", riu. "É estranho demais."

"Bom, você deveria. E... Se eu lembro corretamente, Normani também falou sobre uma tal de Bea", falei entrelaçando minha mão com a dela.

"Beatrice..." Sorriu ternamente. "Essa é outra que eu preciso manter por perto. Não parava de perguntar se eu estava bem e me oferecia um copo d'água a cada dez minutos.  Sem contar que ela também perguntou por você umas mil vezes toda vez que um médico aparecia no corredor."

"Oh Deus..." Levantei as sobrancelhas sentindo minhas bochechas esquentarem. "Eu queria agradecê-las."

"Você pode agradecer amanhã. O horário de visitas já acabou há horas, meu amor."

"Mas você está aqui..."

Sorriu travessa.

"Concílio em médicos funciona tão bem, você não faz ideia."

"Camila..." Franzi o cenho. Meio que sorri, meio que fiquei chocada.

"Não me olhe assim. Foi você que insistiu pra que eu praticasse isso com aqueles muffins na cafeteria. Não é minha culpa se eu já sei usar isso de forma idônea. Sem contar que você precisa descansar. Ally e Taylor já sabem o que aconteceu e vão vir aqui amanhã também—"

"Taylor!" Arregalei os olhos apenas com a menção da caçula. Senti uma pontada no ventre ao tentar erguer a coluna e sentar na maca. "Cristo, eu preciso... Eu preciso ir—"

"O que... O que pensa que está fazendo?!" Camila balbuciou. As duas mãos firmes mantinham meus ombros colados ao travesseiro, o que consequentemente não me permitia levantar. Ou me movimentar no geral. "Lauren, você não vai à lugar algum."

"Ela está sozinha, Camila. Ela odeia ficar sozinha, eu preciso ligar pra ela..."

"Você está hiperventilando, oh meu Deus", senti o indicador levantar meu queixo e duas órbitas castanhas me fitarem da forma mais intensa possível. "Antes de mais nada, eu preciso que você se acalme. Caso contrário essas máquinas vão começar a apitar e eu não sou muito boa com eletrônicos."

"Camila—"

"Eu liguei pra Ally. Taylor não está sozinha. Nesse momento ela provavelmente está brincando com Violet ou tendo uma conversa sobre futebol americano com Troy", selou meus lábios em um beijo estalado. "Taylor não está sozinha. Eu já cuidei disso, ok?"

"Mas..."

"Olhe pra você", grunhiu. "Você tem uma perna e um braço enfaixados, duas costelas fraturadas e o rosto coberto de arranhões. Eu quero cuidar de você, mas é quase impossível fazer isso quando você só pensa nos outros."

"Ela é minha irmã."

"E minha cunhada, além de melhor amiga", falou como se não fosse óbvio o suficiente. "Eu já cuidei disso, Lauren."

"Ok."

"Mais alguma coisa?" Ela indagou como se soubesse que eu estava aflita por algo a mais.

"Dinah. Você chegou a ligar pra ela?"

"Não", falou séria. "Eu liguei pro celular dela dezenas de vezes, mas... Nada. E você sabe que seria suicídio e muita cara de pau da minha parte se eu ligasse para a clínica."

"É, eu sei."

"Mas não se preocupa, ok? Eu vou cuidar disso."

"Eu te amo", sorri.

"Eu também te amo. Agora por favor, tente pensar em flores, unicórnios ou borboletas por alguns segundos e descanse, pelo amor de Deus."

Rolei os olhos ligeiramente irritada. Eu sabia que ela tinha razão.

"Mas é lógico que eu tenho razão", falou rindo. "Cristo, você pensa em coisas tão óbvias."

Eu realmente não sei como eu continuo esquecendo que ela também lê mentes.

Flores, unicórnios e borboletas.

Deus, eu preciso dormir.

~~

Quarta-feira, 28 de dezembro de 2011 – um dia após o acidente


"Posso entrar? Estão decentes?" A voz risonha, e já extremamente familiar a meus ouvidos, soou através do feixe minúsculo da porta antes de abri-la por completo.

Camila riu ao reconhecer a figura. O fato de que ela parecia tímida e hesitante ao me ver pela primeira vez após o acidente me fez sorrir.

"Pode sim. Eu vou deixar vocês duas conversarem", levantou caminhando em direção à porta. Sorriu ao pousar gentilmente a mão no ombro da morena antes de sair do quarto.

Minha garganta secou no segundo em que o clique da fechadura estalou e eu me vi sozinha com ela.

"Eu não sei nem o que dizer."

"Obrigada geralmente funciona", sorriu faceira ao cruzar os braços.

"É sério. Quer dizer, nós éramos duas estranhas, você não tinha obrigação nenhuma de fazer o que você fez."

"Eu estava há dois carros atrás do seu quando o impacto aconteceu. Eu não sei porquê, mas eu realmente senti que precisava ir até lá. Eu precisava me certificar."

"Por quê?"

"Intuição", sorriu. "Eu acho."

"Você é inacreditável, mas... Obrigada. De verdade, Normani. Eu não sei nem como te agradecer."

Se aproximou da maca e apoiou as duas mãos sobre a grade que ficava aos meus pés.

"Nós podemos ver isso mais tarde. Mas o que eu quero saber mesmo é como você está se sentindo."

"Dor. Não há morfina suficiente nesse mundo que faça meu ombro parar de doer."

"Não é por nada não... Mas isso só significa que seu braço ainda está no lugar."

Rolei os olhos tentando conter o sorriso.

"O mesmíssimo senso de humor de Camila. Agora eu entendo o porquê de ela falar tão bem de você."

"Ela falou bem de mim?"

"Se Normani fosse uma marca, Camila seria sua garota propaganda."

Riu extasiada jogando a cabeça para trás.

"Você é uma graça, Lauren."

"É... Eu tenho meu charme", minhas bochechas pareciam esquentar a cada segundo que passava, mas eu precisava manter a postura. E talvez corar faça parte do charme.

A morena estava prestes a responder quando a porta do quarto se abriu novamente. Franzi o cenho ao notar a figura incerta ao entrar.

"Hey! Eu procurei você por toda parte antes de entrar aqui!" Normani exclamou ao ver quem era.

Alta, magra, cabelos loiríssimos na altura dos ombros. Apesar de vestir preto da cabeça aos pés, possuía uma aura ridiculamente angelical.

"Lauren", Normani sorriu guiando a desconhecida até a maca e fechou a porta com o pé no processo. "Essa aqui é a Bea."

Bea.

Era tão estranho associar a voz de alguém com a imagem quase um dia depois. Eu jamais imaginaria que a dona do "tudo sob controle" se parecesse assim. No bom sentido, obviamente.

"Normani, eu disse que eu iria ao banheiro e você sumiu da recepção", rolou os olhos antes de me oferecer uma careta. "Desculpa aparecer assim, ela realmente não sabe a definição da palavra esperar."

"Bea, se eu não estivesse com o braço enfaixado e completamente imobilizada, eu juro por Deus que levantaria dessa maca e te daria um belo abraço."

Sorriu largo ao ouvir aquilo. A expressão hesitante dos primeiros segundos, agora desfeita por completo.

"Não queremos você com mais dor, então por favor, não se mexa", falou sorrindo. "A propósito, você e Camila fazem um belo casal."

"E não aja como se não fosse verdade", senti minhas bochechas esquentarem com o olhar divertido que Normani me lançou.

"Vocês duas precisam parar com isso", usei a mão direita para cobrir o rosto. "Eu sou tímida."

"Uma péssima mentirosa também", Bea riu. "Como você está?"

"Com dor, o que segundo sua amiga, apenas quer dizer que meu braço ainda está no lugar."

"É um bom sinal", assentiu tentando não rir. "Cristo, Normani. Você realmente falou isso?"

"Eu estava sendo sincera", rebateu.

"Ela tem razão. É um bom sinal sim", sorri. "E... Eu sei que é cedo demais pra eu me preocupar com isso e vocês provavelmente vão me chamar de materialista e tal, mas eu preciso perguntar... O que aconteceu com meu carro?"

"Foi guinchado, óbvio", a morena respondeu séria.

"Ok, e vocês acham que tem concerto?"

Franzi o cenho ao ver a loira escondendo o rosto no pescoço de Normani e tentando controlar o riso. No meu dicionário, rir de perguntas sérias era um péssimo sinal.

"Digamos que... Nós estamos muito felizes por você estar viva."

"O quê?"

"Compre um carro novo, Lauren."

~~

"Eu queria te bater, mas no momento não tenho coragem de fazer isso", falou me fazendo rir.

"Vem cá."

Tremeu o queixo ao segurar o choro e caminhar em minha direção. Sorri quando beijou minha testa e tocou meu rosto com a ponta dos dedos examinando meus machucados.

"Deus, você teve tanta sorte."

"Acho que depois disso a minha sorte quebrou", falei arrancando um sorriso sincero da advogada.

"Não diga isso", alertou. "Nem de brincadeira, está me ouvindo?"

"Eu sei. Eu sei disso."

"Como você está? Camila não conseguiu me contar tudo por telefone."

"Eu dormi por quase doze horas e mesmo assim me sinto exausta", confessei. "E dor. O tempo todo. Acho que as enfermeiras já estão de saco cheio de vir aqui e dizer que preciso esperar mais quatro horas até a próxima dose de morfina."

"Queria poder fazer algo", falou.

"Todo mundo diz isso. Mas... Vai passar. Eu já me sinto bem melhor."

"Você me surpreende, garota."

"Eu sei. Aliás, por falar nisso, eu preciso falar com você sobre uma coisa que está me incomodando muito."

"A fuga? Eu literalmente tive um mini ataque cardíaco quando eu soube."

"Ok...  Isso e mais outra coisa."

"Não me diga que tem outra coisa."

"Antes de Camila e eu sairmos do apartamento de Dinah, ela mandou uma mensagem de texto pra nós. Depois do acidente, quando Camila acordou e começou a ligar pra todo mundo avisando o que tinha acontecido, ela não conseguiu falar com Dinah. Até agora não sabemos o que aconteceu e isso realmente está me incomodando."

"Eu vou tentar falar com ela."

"Camila já tentou isso, Ally."

"Camila ligou para o celular dela. No dia do acidente com Austin, eu acabei pegando o número de um funcionário lá dentro apenas por precaução de precisar usar algum dia. Aparentemente esse dia chegou."

Eu não sabia o que dizer.

"Você não sabe como me irrita o fato de você pensar em todos os detalhes o tempo inteiro", rolei os olhos. "Sério, obrigada."

"Obrigada?" Riu. "Achei que te irritava."

"São dois sentimentos em conflito no momento."

"Você está sob efeito de alguma medicação?" Indagou divertida.

"Eu bem que queria", puxei o ar por entre os dentes ao sentir a dor em meu ombro aumentar gradativamente. "E tem a outra coisa também."

"Diga."

"Eu quero saber porque raios o monsenhor mandou uma equipe buscar Camila em meu apartamento hoje. O acordo não falava em datas. Ele acha o quê? Que eu tenho cinco anos?"

"Eu revisei os documentos", Ally explicou. "Quando Camila me contou sobre isso, eu abri o arquivo em meu computador na mesma hora, e de fato, não há data alguma. O que pode ter acontecido foi que tudo não passou de um mal entendido."

 Franzi o cenho sentindo uma nova pontada em meu ombro.

"Você só pode estar de brincadeira comigo."

"Eu queria estar."

"Fugimos por nada? Você realmente está me dizendo que Camila e eu sofremos um acidente de carro por nada?"

"Eu posso entrar em contato com ele e—"

"Sim! Por favor, faça isso. Camila não vai voltar pra lá. Ela não pode."

"Lauren, eu odeio dizer isso, mas o acordo falava claramente que Camila só podia ficar com você até que ela se recuperasse do acidente. Se alguém da clínica visse a hiperatividade que ela se encontrava hoje, eu não creio que nós poderíamos fazer alguma coisa pra impedir que eles a levassem."

"Não. Eu não..."

"Eu sinto muito querida, mas se eles comprovarem que ela já está recuperada, não há mais nada que nós possamos fazer."

"Adie isso", pedi em um fio de voz. "Estenda esse acordo, fale com alguém, eu não dou a mínima se o que você fizer novamente seja ilegal ou não. Só não deixem eles levarem ela."

Piscou algumas vezes. Era visível que ela não esperava ouvir aquilo vindo de mim. Logo eu, a politicamente correta que quase teve um surto ao descobrir que os documentos entregues por Dinah eram de sigilo absoluto da clínica.

"Você tem certeza?"

"Tanto quanto eu amo ela."

Permaneceu em silêncio por alguns instantes até assentir com uma expressão neutra.

"Tudo bem."

"Tudo bem?"

"Você quer ou não, Lauren?"

"Você consegue fazer isso?" Uni as sobrancelhas. Era difícil saber quando Ally blefava ou não.

"Você está me ofendendo ao perguntar isso", riu.

"Desculpa, mas eu realmente não achei que isso fosse possível."

"Eu tenho alguns contatos que podem vir a calhar no momento. Confesso que vai ser divertido fazer algumas ligações."

"Você me mantém informada?"

"É... Eu vou pensar nisso", respondeu sentando na beira do colchão.

"O quê?"

"Você sofreu um acidente e precisa se recuperar. Informações desse naipe são um pouquinho pesadas para alguém como você no momento."

"Não me faça rir, Allyson."

"Não me faça rir você, Lauren", rebateu. "Você se estressa com muita facilidade. Eu te conheço. Quando as coisas saem do seu controle, você também perde o controle sobre si mesma. Você quer abraçar Deus e o mundo, mas não consegue. Isso te aborrece. E todo mundo sabe o que acontece quando você se aborrece."

"Eu não sei do que você está falando."

"Sabe. Sabe sim. E é exatamente por isso que você precisa focar na sua recuperação."

"Eu queria minha afilhada aqui", grunhi. "Você fica menos chata com ela por perto."

"Não me provoque, Michelle."

"Aliás, como ela está?" Perguntei sorrindo. Irritar Ally era um dos meus passatempos preferidos.

"Bem, eu acho. Queria ter trazido ela, mas eu não tinha certeza se me deixariam entrar aqui com um bebê."

"Foi melhor assim. Eu provavelmente iria ficar agoniada por não poder pegar ela no colo."

A texana sorriu triste ao pousar os olhos sobre meu braço.

"Você não faz ideia de como eu fiquei quando Camila ligou. Sinceramente, Lauren, você e ela são literalmente dois ímãs para problemas."

"O casal perfeito", ri baixinho. "Por falar nela, você sabe onde ela foi?"

"Recepção. Está conversando com Taylor e tal."

"Oh... Ela não vai entrar?"

"Ela ia. Mas aí a enfermeira chegou dizendo que você já podia nos receber e ela congelou. Disse que eu podia ir na frente e que logo em seguida já entraria também. Quando eu passei pelo corredor, eu vi Camila indo até ela e as duas começaram a conversar."

"Eu odeio ver ela assim. Tudo isso... Pelo amor de Deus, ela saiu de uma clínica psiquiátrica. Ela não deveria me ver assim. Não deveria passar por isso."

"Ela vai ficar bem. Isso tudo que está acontecendo é apenas uma fase ruim. Coisas assim acontecem o tempo inteiro e ela sabe disso."

"Eu sei, mas..."

"Camila está conversando com ela. Por favor, quando ela entrar por aquela porta, coloque o sorriso mais lindo que você tem e abrace ela. Vai ser o suficiente."

~~

Sexta-feira, 30 de dezembro de 2011 – três dias após o acidente


"Eu quero ir embora."

"Eu sei."

"Pra nossa casa."

"Eu sei."

"Camila..."

Riu se aproximando. Senti um arrepio percorrer meu corpo inteiro quando segurou meu queixo e me beijou inesperadamente. Não fiz a menor questão de conter o riso quando Camila deu um salto para trás no segundo em que a máquina de batimentos cardíacos começou a apitar ao nosso lado.

"Oh Deus..."

Eu estava vermelha. Mas eu realmente não ligava.

"Precisamos ter cuidado com isso", ela diz endireitando o moletom que usava. Um sorriso divertido esboçando as feições delicadas. "Seu coraçãozinho anda muito frágil nos últimos dias."

"É de te amar muito."

Rolou os olhos se afastando da cama.

"Você é uma idiota", caminhou até os pés da cama e pegou um biscoito do pote recheado de guloseimas que Ally havia trazido pela manhã. "Mas eu te amo."

"Eu sei", sorri vitoriosa.

"Como está sua dor? Em uma escala de 1 à 10?"

"Depois desse beijo... Talvez quatro."

"É esse o seu jeito sutil de dizer que o meu beijo tem o mesmo efeito da morfina que andam injetando em você?"

"Você é muito presunçosa, sabia?"

"Sabia", mordeu o biscoito. O sorriso bobo ainda presente nos lábios. "Mas você me ama, então eu não ligo."

"Ridícula."

"Sua irmã ligou dizendo que vai passar aqui de novo no final da tarde. Me chame de ridícula, mas me agradeça por te passar recados."

Foi a minha vez de rir.

"Okay, Srta. Cabello. Mais algum recado?"

"Sra. Jauregui", me corrigiu. "Eu ainda pretendo ter seu sobrenome, só pra constar."

"Você não facilita minha vida, Camila."

"O que foi que eu fiz?"

"Eu estou com o braço imobilizado e completamente impossibilitada de levantar."

"Okay... E?"

"Você está longe. E eu não posso te beijar."

Mordeu o lábio desviando o olhar.

"Sou sua secretária no momento. Me trate como tal."

"Responda minha pergunta então."

"Que pergunta?" Franziu o cenho. "Ah! Ok. Não, não temos outros recados."

"Ainda não conseguiu falar com Dinah?"

"Ela não atende a droga do celular. Ally já tentou, mas ainda não me avisou se conseguiu ou não, então é impossível saber."

"Talvez tenha acontecido algo", uma batida impaciente ecoou do outro lado da porta.

Arregalei os olhos ao ver quem era.

Incrível como isso sempre acontecia.

"Por favor, me diga que você tem uma explicação lógica pro seu sumiço", Camila falou ao enlaçar o corpo da amiga em um abraço.

A mesma sorriu ao perceber que eu assistia a cena completamente perplexa.

"Eu tenho, Mila", respondeu depositando um beijo na testa de Camila e caminhou em minha direção. "Eu sinto muito pelo que aconteceu, Laur."

Balancei a cabeça. Ainda não conseguia falar ou formular absolutamente nada coerente.

Estendi o braço direito e sorri, ainda extasiada pela presença dela, ao receber um beijo estalado no dorso de minha mão.

"Eu mandei a mensagem pra vocês na quarta-feira, mas não esperava que vocês fossem me ligar ou coisa assim, então não me preocupei. No dia seguinte, eu fui trabalhar como faria em qualquer outro dia, mas fui barrada na entrada por um funcionário. Eu perguntei por que ele não me deixava entrar, e tudo o que eu ouvi foi que, aquele lugar não tinha espaço para traíras. Só depois eu fui descobrir que tinha esquecido meu celular em minha sala e que alguém resolveu bisbilhotar minhas coisas. Provavelmente leram as últimas mensagens e chamadas e isso acabou chegando aos ouvidos do monsenhor. Até então ele não acreditou em tal possibilidade e me deixou entrar. Quando eu encontrei meu celular, ele estava desligado, provavelmente sem bateria e eu não liguei ele durante o dia todo porque estava ocupada demais cuidando de Beth. Na minha cabeça, vocês estavam bem, sãs e salvas, então ligar pra vocês ou tentar contato nem passou pela minha cabeça. No final da quinta, quando eu estava prestes a ir embora, o monsenhor me chamou dizendo que as provas que essa tal pessoa havia mostrado a ele, eram de fato, verdadeiras e que eu havia traído por completo a confiança dele. Eu fiquei tão aturdida que fui pra casa e só liguei meu celular hoje no início da tarde. Eu vi mais de 40 chamadas não atendidas, li todas as 13 mensagens que Camila havia me mandado e corri pra cá o mais rápido que pude. Me desculpem se demorou todo esse tempo."

Fazia total sentido.

E eu me sentia uma idiota por não pensar que algo muito errado – nesse mesmo patamar – poderia ter acontecido. Afinal de contas, já era pra eu estar acostumada com as coisas dando errado ao meu redor.

"Dinah... Eu não sei nem o que dizer."

"O que o monsenhor falou com você?" Camila indagou inquieta.

Dinah sorriu. Colocou as mãos nos bolsos e me lançou um olhar indecifrável.

"Eu fui despedida."

A lógica disso tudo implicava três coisas:

1) Nesse meio todo, por um mero descuido, eu fiz com que minha amiga perdesse o único emprego que tinha; 2) Para aumentar meu desespero, Beth estava completamente sozinha e desassistida em um lugar como aqueles; e 3) Se Camila voltasse para lá, ela só sairia morta.

E isso... Isso era o meu pior pesadelo.


————

A/N: @gay_harmony & ask.fm/gay_harmony :)

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