Capítulo 22

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←Dia 10→

   Acordo pela manhã mais cedo que Vicente, isso é um milagre, já que todas as manhãs eu acordava cedo, mas Vicente acordava ainda mais cedo que eu. Então arrumo meus cabelos todos cheios de nós e com cachos desfeitos, faço uma breve higiene e me arrumo, ainda na cama ele ronca baixo e sussurra algumas coisas, não sei se está tendo algum pesadelo, mas eu espero que não e se sim, tomara que isso não afete seu dia ou seu humor. Percebo que dentro do armário não há nada, na geladeira havia algumas coisas que podem até servir para o café, mas se vamos passar mais seis dias aqui, precisamos de umas comprinhas. Recentemente deve ter vindo aqui, para negócios da sua empresa ou por alguma coisa que não sei qual, mas ainda tinha alguns ovos e fiz torradas com o pão que já estava perto de ficar inválido para nosso consumo. Quando termino de fazer a última torrada sinto um abraço por trás. 
   — Bom dia! — me viro para olhar seus olhos e pela primeira vez vi Vicente totalmente relaxado, em roupas de dormir, rosto inchado de sono e cabelos um emaranhado de pequenos cachos com pontas claras para um lado e outro.
   — Bom dia — sua voz sai baixa e rouca, sorri com esse mero detalhe e coloco nosso pequeno almoco na mesa.
   — Precisamos de uma ida ao mercado — Vicente concorda com um aceno e se senta na cadeira, desleixado. — À noite foi boa? — o mesmo balança a cabeça negativamente, parece ainda pensar no que poderia ter sido um pesadelo, parece triste.
   — O que você acha sobre uma visita? — fico confusa o olhando, uma visita a quem? Ou a que? Me sento na sua frente e o olho. — Ao meu pai — meus olhos logo se abrem junto as minhas sobrancelhas que ficam arqueadas.
   — Eu não sei, você tem que pensar muito. Aliás, seu pai foi alguém que fez mal a você e consequentemente matou sua mãe, por mais que você faça uma visita para se sentir bem, isso pode te fazer mal. — Não sei se isso é o que ele quer ouvir, mas pediu minha opinião e essa é a minha — e se você for lá e ele nem lembrar de você como você mesmo disse? Ou se, mesmo se você for conversar com ele, se sentirá bem? Você não tem que perguntar para mim se deve fazer essa visita, você tem que se perguntar. Você, Vicente está pronto? — suspira e se debruça sobre a mesa.
   — Não — por fim diz, sério e decisivo. Isso é bom, ele não se força a nada, não diz 'sim' para qualquer coisa que não lhe faça bem. Como eu fiz várias vezes. Sorrio para ele querendo passar segurança. — Hoje quero te levar a um lugar que minha mãe me levou na primeira vez que viemos para cá, esse lugar ficou na minha cabeça e sempre que venho eu vou lá, lembra-me o cheiro dela — sorri com isso, eu não me lembro mais da minha mãe e nem do meu pai, os sonhos são apenas borrões que me causam ainda mais medo, eu queria poder ter alguma lembrança da minha família. No entanto, querendo que isso não atinja meu dia, arrumo minha postura e abro um largo sorriso enquanto Vicente come uma torrada a olhar o dia.
   — Irei por um vestido lindo! — me olha de imediato e abre um largo sorriso sem dentes e termino de comer indo até ele dando um beijo em sua bochecha, corro entre o corredor até chegar na sala e subo as escadas, são poucos degraus até chegar na porta do nosso quarto. Abro a minha mala e vejo um vestido amarelo, ficará bom.

   Andamos pelas ruas da França, Vicente a me dizer sobre alguns lugares e eu a admirar a boa vista. Andamos por muito tempo, diz Vicente que a pé é melhor que de carro, e concordo. Podemos nos aproveitar e aproveitar o passeio e ele aproveitava para apontar para todos os lugares e me dizer o que eram ou suas lembranças, ali eu vejo a sua versão mais feliz e retrospectiva de lembranças boas e até mesmo diz as ruins, mas depois de um bom tempo andando, de saborear um sorvete chegamos à floricultura. Parecia mais um grande jardim, ali pude me perder no melhor cheiro de natureza, nos perfumes de rosas e na maravilha de cores e formatos, tivemos uma boa lição de vida sobre o tempo, que muitas vezes poderia ser de longo ou curto período, aprendemos que às vezes devemos o respeitar, devemos esperar florescer, mas que também o tempo nem sempre precisa ser longo para conhecemos os privilégios da vida, mesmo tendo aquele ditado "só o tempo dirá!" ou até mesmo "o amor aparece com o tempo" sim, é o tempo que decide, isso me fez pensar em relação a eu e Vicente, o tempo para nós foi curto, mas ainda precisamos dele para nos conhecer ainda melhor.

   No fim ganhei um lindo buquê, sai com lindas reflexões e curtir um pouco do meu dia ao lado de uma ótima pessoa, hoje é o tipo de dia que foi longo e memorável, era o tipo de dia que eu repetiria mais cem vezes sem enjoar, tudo para que ficasse na minha memória sem que eu esquecesse uma só parte, o bom disso, é que tenho mais vinte dias com essa pessoa, e dele tenho muitas coisas memoráveis, e me surpreendo ser o seu bom humor, sorriso e gentileza, não seus beijos e toques, isso também, mas há algo nele maior que sua cede insaciável, ele próprio é insaciável. No entanto, eu descobri que não só de sexo, de abraços, de sorrisos e de momentos bons. Volto com Vicente e já é fim de tarde, falamos sobre alguns lugares que eu memorizei e gostei.
  — Amanhã será um dia longo. Voltamos cedo para que descanse, quero que aproveite cada segundo — olho para ele, mas não me olha, analisa o por-do-sol enquanto andamos em uma avenida repleta de árvores e carros enfileirados, um sol no fim da estrada e pouco movimento.
   — Eu estou aproveitando muito bem — sorri, e volto a olhar para frente. Para o sol. Me deixou a porta do hotel onde estamos hospedados e me disse que pegaria o carro para ir ao mercado e chegar a tempo de fazer um jantar comigo, me convidou para cozinhar com ele, e sinto medo, Vicente é mil vezes melhor que eu nisso. Então assim que entrei em casa fiz questão de arrumar a cozinha de um modo que parecesse um jantar, sorri deixando as velas sobre a mesa com um forro vermelho que economizei, subo as escadas às pressas para um banho e uma troca de roupa, visto algo mais elegante, a visão que temos da janela é de privilégio grande e isso é bom, Vicente fez tanto por mim que nem sei se um jantar seria algo que recompensasse a ele, mas era o mínimo que eu poderia fazer agora.

   Assim que ouço a porta ser aberta sorri, não pus salto, porque corri entre o corredor até chegar na beira da escada e analisa a sala de jantar enquanto anda para a cozinha, lá depositou as compras sobre o balcão e voltou a olhar a mesa, entretido.
   — Me convidou para cozinhar com você, eu te convido para um jantar com uma bela vista e uma boa música — minha voz ecoa pela sala vazia e tenho a sua atenção do meu pé à minha cabeça, mostro o CD que tenho em mãos. — Você aceita ou é muito pouco para você? Se quiser vamos a um restaurante — recito o que me disse na feira e o mesmo sorri.
   — Eu aceito — mordo meus lábios reprimindo um sorriso. 


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Meia NoiteWhere stories live. Discover now