31 de março - ano II após a guerra

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Vamos de mais um capítulo? 

Abri os olhos quando a fresta de luz se tornou incômoda demais. Que horas serão? Desde que sai da vila ainda criança, me acostumei a dormir bem pouco. Precisava estar sempre vigilante, afinal as circunstâncias exigiam isso de mim. E haviam os malditos pesadelos que volta e meia me tomavam de assalto. Quando era bem mais jovem, a noite do massacre de minha família frequentemente retornava para me assombrar. Com o passar do tempo, todas minhas péssimas escolhas acrescentaram mais espectros ao abismo tortuoso da minha mente. Essa é a primeira vez em muito tempo que me sinto plenamente revigorado ao acordar. Devo ter dormido bastante. E pesado. Talvez a culpa seja desse aroma de lírio que agora impregna o quarto que já foi dos meus pais. Faz lembrar um pouco da minha mãe. Ela também cheirava a flores, mais precisamente as rosas do canteiro nos fundos da casa. Será que ainda existem? Não. A essa altura não deve restar nem vestígios do jardim bem cuidado que oka-san mantinha ali. Já Hinata cheira a lírios. De um jeito suave e natural. Nada enjoativo como as fragrâncias exageradas que sinto quando estou perto das outras moças que conheço. Será que ela já acordou?

O lado que ela ocupa no futon está vazio e não ouço nenhum som vindo do banheiro. Já que se levantou e nem teve a cordialidade de me chamar, podia ter levado esse aroma entorpecente com ela também. Onde terá ido? Por mais que eu queira levar esse assunto com a seriedade que toda missão exige, não consigo evitar esses sorrisos que escapam quando percebo seus esforços para se manter no controle da situação. Suas ações são tão contraditórias que revelam muito mais do seu caráter do que acredito que ela deseje. Um dia me propõe casamento do nada, com a firmeza de uma negociadora, depois se preocupa com o que as pessoas vão pensar se souberem que dividimos o mesmo aposento. Concluo que ela é apegada a suas convicções, disposta a arriscar e pagar preços altos por seus objetivos, porém incrivelmente retraída. Sei que tem muitos amigos, a maioria dos que compareceram ontem só foram por ela. Entretanto, parece não gostar muito de ser o foco das atenções. Acho estranho isso, ainda mais vindo de uma princesa do clã mais esnobe da vila. Mas o que eu sei desse assunto? Depois que perdi minha mãe, só convivi com figuras femininas que fazem questão de atrair todos os olhares para si.

Nossa "noite de núpcias" foi no mínimo engraçada. Tive que me conter para não acabar rindo ou dizendo algo que lhe deixasse mais desconfortável do que estava. Depois que chegamos em casa naquele silêncio profundo, sugeri que fossemos logo nos recolher. Estava exausto e sem a menor disposição para continuar aquela encenação. Suigetsu nos contemplou com uma de suas bobagens cheias de malícia, Karin saiu bufando e pisando duro e Orochimaru beijou a mão da minha noiva com certo exagero, se retirando após nos recomendar que não fizéssemos nada que ele não faria. Ok, me incomodou o olhar dele. Somente Juugo permaneceu na sala. Assim que todos saíram, ele a cumprimentou com uma leve reverência e muita sinceridade. Creio que Hinata percebeu que era autêntico, pois o abraçou quando ele disse "Seja bem vinda a nossa estranha família!". Depois que ele sumiu de nossas vistas, minha noiva parecia colada ao assoalho. Quem visse acharia que tinha virado uma estátua. Toquei seu ombro e pedi que me seguisse. Na verdade, praticamente ordenei. Não podia simplesmente deixar ela ali, estática. Ou podia? Não, não podia. E não quis.

Quando entramos no cômodo que iremos partilhar pelos próximos meses, foi que a coisa ficou divertida. Por desconhecerem a razão de nossa união, as senhoras que vieram trazer as coisas de minha tímida esposa preparam um cenário romântico em nosso quarto. Ela corou tão intensamente que temi que desmaiasse ou tivesse um treco. Se isso acontecesse, como eu ia explicar? Ninguém acreditaria em minha inocência. Procurei ser o mais objetivo possível. Indiquei onde fica o banheiro, onde ponho minhas coisas e onde seria o espaço das dela. Enfatizei que não gosto que mexam no que é meu, especialmente nas minhas armas. Supus que me ater a questões objetivas em um tom frio e formal lhe deixaria mais à vontade. Ledo engano. Hinata espremia as mãos tão fortemente, que não sei como não quebrou. Eu não sabia o que fazer. Minhas estratégias haviam acabado. Não eram muitas, eu sei. Só que eu nunca tive que lidar com uma situação como essa. Nunca me passou pela cabeça ter que acalmar uma mulher a beira de um ataque de nervos. Afinal para que tanto constrangimento? Ela é uma ninja, oras. Se eu tentasse algo inconveniente bastava me golpear. Ou tentar. Eu ainda sou Sasuke Uchiha, ninguém me atinge assim tão fácil.

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