Capítulo 16

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Saber que iria ver Nico, acendeu uma pequena luz diante de mim, como um solitário vaga-lume na escuridão. A mente dramática que possuía naquela idade, tinha me feito crer que nunca mais iria vê-lo.

— Cê é besta, Catarina? — Meu pai riu — Como cê achou que nunca mais iria ver ele?

— Uai, já tem quase seis mês que num vejo!

— Melhor assim. — Minha mãe interferiu — Tô achando é muito bom cê longe de menino. Quero ver se vai comportar que nem moça na festa.

Mantive a boca fechada e abri um sorriso angelical, prometendo por todos os santos do mundo que seria a própria imagem da realeza. Ademais, disse a mim mesma que faria de tudo para não dar nenhum motivo para que minha mãe se irritasse comigo naquela semana.

Ao chegar o tão aguardado sábado, acordei animada e falei sobre a festa o dia todo, mesmo minha mãe não prestando a menor atenção em mim. Tomei banho e vesti uma camiseta branca junto da jardineira florida que tia Lenira havia costurado para mim. Era minha roupa favorita, mas tinha de mantê-la escondida de minha mãe, que queria de todas as formas queimá-la, por ter sido presente de minha tia.

— Vai me desobedecer? — Ela estava arrumando Jaime e parou assim que me viu sair do banheiro — Pode tirar essa roupa agora.

— Deixa a menina, Leda. Ô muié chata! — Meu pai estava abotoando a camisa e começou a discutir com minha mãe.

Deixei aquela cena habitual para trás e desci até o quintal, indo direto para a casa de Lilica, que havia prometido arrumar meu cabelo para a festa. Àquela altura, já éramos amigas e sempre víamos tevê juntas no início da tarde. Adorávamos novelas mexicanas e nos tornaríamos, em breve, duas das milhares de pessoas a se debulhar em lágrimas com Marimar, Maria Mercedes e Maria do Bairro.

Minha mãe havia tentado me persuadir a ficar longe de Lilica, por meio de suas convincentes e sempre eficazes chineladas. Contudo, depois de ser frustrada diversas vezes por minha teimosia continental, acabou desistindo e fingindo não ver que eu visitava a vizinha todos os dias.

— Cê precisa dar um jeito na vida, Catarina. — Lilica ficou me dando sermões enquanto modelava cachos em meu cabelo — Todo dia essa mesma cara de cachorro sem dono.

Ela me fez sentar entre suas pernas, passando algum creme muito perfumado na minha cabeleira embaraçada. Dizia treinar comigo para quando tivesse seu próprio salão.

Lilica sonhava em ser cabeleireira e vendia cosméticos em casa para juntar o suficiente para pagar um curso. Sempre me dizia que não adiantava sonhar e não trabalhar.

— Existe dois tipos de gente, Catarina: o tipo que reclama e o tipo que faz alguma coisa. — Ela me ensinava — Qual tipo cê quer ser?

— Sei lá. 

Ela me deu um tapinha ardido no braço.

— Ai! Num faz isso.

— Então responde que nem mulher! — Lilica era tão brava quanto boa — Levanta essa cabeça, estuda e mostra pra sua mãe que cê num é pouca coisa.

— Vai ver que a mãe tá certa e eu num sirvo pra nada.

Lilica me deu outro tapa ardido.

— Ai! — Fiz cara feia — Para de me dar tapa!

— Num paro!

Ela puxou um parte de cada lado do meu cabelo e prendeu, deixando o restante solto. As mechas reluziam com os produtos dela, que eu chamava de "poções mágicas".

Bem Me QuerWhere stories live. Discover now