Romance LXXVIII ou de um tal Alvarenga

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Veio por mar tempestuoso
a residir nestas Minas:
poeta e doutor, manejava
por igual, as Leis e as rimas.
Desposara uma donzela
que era a flor destas campinas.
Andava por suas lavras
- como eram grandes e ricas!
Mas o ouro, que altera os homens,
deixa as vidas intranqüilas,
levava-o por esses montes,
a sonhar por essas Vilas...
Em salas, ruas, caminhos,
foram ficando dispersas
as histórias que sonhava,
- e iam sendo descobertas
as mais longínquas palavras
das suas vagas conversas.
E por inveja e por ódio,
confusão, perversidade,
foi preso e metido em ferros.
Um homem de Leis e de Arte
foi preso só por ter sonhos
acerca da Liberdade.
E sua mulher tão bela,
e sua mulher tão nobre,
Bárbara - que ele dizia
a sua Estrela do Norte,
nem lhe dirigia a vida
nem o salvava da morte.
A morte foi muito longe,
numa negra terra brava,
Tinha tido tal nobreza,
tanto orgulho, tantas lavras!
E agora, do que tivera,
a vida, só, lhe restava.
Assim dele murmuravam
os soldados, no degredo,
sabendo quem dantes fora
e quem ficara, ao ser preso,
- tão tristemente covarde
que só causava desprezo.
Era ele o tal Alvarenga,
que, apagada a glória antiga,
rolava em chãos de masmorra
sua sorte perseguida.
Fechou de saudade os olhos.
Deu tudo, o que tinha: a vida.

Romance da inconfidência (Completo)Where stories live. Discover now