Miguel

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Capítulo 38

- Madu... – Robin murmurou entre um suspiro prazeroso e outro. A Rainha havia descoberto o quanto Robin ficava sensibilizada ao ser tocada na região do pescoço e tirava proveito da situação explorando seu ponto de pulso. A médica trazia um cheiro natural bastante agradável e naquela região o aroma parecia ser mais concentrado que o resto do corpo. Cada vez que sua língua e lábios tocava a pele de Robin, Madu tinha anseio de tocar mais e mais permanecendo em um delicioso ciclo sem fim. Mordeu suavemente o pescoço da médica pouco se importando se Robin ficaria marcada ou não. – Madu!
- A culpa é sua... – Madu acusou Robin. – Quem mandou deixar de ser aquele chatinho pra se tornar essa doutora tão linda e cheirosa? Fica difícil de resistir. – Madu comentou enquanto selava a pele de Robin com seus lábios. Aproximou-se da boca da médica. Robin não tirava os olhos dos lábios da Rainha, que já estavam inchados de tantos beijos que Robin roubou de Madu. A médica apenas deu uma trégua quando realmente precisou de ar. Maria Eduarda, sempre faminta, aproveitou que Robin recuperava o fôlego para descobrir seu corpo e “conhecer" a doutora. Explorou seu pescoço, colo, fez Robin se arrepiar com suas carícias e agora roçava seus lábios sobre os da médica com aquela conversa de resistência. – Muito difícil.


“Principalmente quando a personificação da tentação está sentada em cima de você", Robin pensou de imediato. Madu sorriu para a mais velha, encostou seus lábios aos de Robin e passou a envolver a língua da médica de forma sensual. As mãos da doutora que seguravam a cintura de Madu passaram a excursionar pelo restante do corpo provocando um verdadeiro tufão em no estômago de ambas.
O frio que visitava a ilha não chegou aos aposentos reais de maneira alguma. As duas mulheres trocavam beijos e carícias tão apaixonados que as roupas passaram a se tornar motivo de grande incômodo. Robin, mais tímida ainda tentou agir de forma ponderada. Madu,  sempre visceral e a flor da pele com suas emoções, deixou qualquer discrição de lado e jogou-se no amasso escaldante e rápido, forçando Robin a escancarar de uma vez seu desejo.

Apesar de mais calada, Robin não permitiu que sua timidez a limitasse. Fechou seus olhos e deixou que os seus sentimentos de paixão e desejo pela Rainha viessem á tona por meio de beijos e carícias. Robin sentia a aprovação de todos seus atos por meio dos alaridos prazerosos e preguiçosos que Maria Eduarda deixava próximo de seus ouvidos. Os beijos quentes que Madu deixava sobre sua pele descoberta e os arranhões nas costas. Quando suas mãos descobriram os rijos seios da Rainha, a resposta foi ligeira. Os dedos ligeiros de Madu passaram a desabotoar a fileira de botões do pijama que usava. Embora fosse aquela a primeira vez que se permitiam a um contato tão íntimo, Madu tinha confiança o suficiente para se entregar por inteira.

Em um lapso de sanidade, Robin conseguiu separar-se de Madu o suficiente para se olharem nos olhos. No ritmo que estavam as coisas, logo perderiam o restante das roupas e dariam vazão de uma vez ao tesão acumulado de todos aqueles meses. Ela estava certa do que queria. Cada pedaço de seu corpo ansiava por Maria Eduarda. Robin tinha experiencia o suficiente com outras mulheres para saber que Madu não estava em estado diferente que o seu, no entanto, com medo de um possível arrependimento, a médica resolveu questionar a Rainha.

- Tem certeza que você quer isso?

Madu abriu um sorriso sacana.

- Oras, Robin... Acho bem improvável você não ter estado com outra mulher antes de mim, pelo que acabei de constatar... – Robin sentiu sua pele esquentar. Madu estava encaixada sobre suas pernas, fazia uma carícia de leve na nuca de Robin. - Duvido que não perceba os sinais de quando uma mulher te deseja...


Robin sorriu. Mirou os olhos de Madu.

- Eu apenas quero... Que você esteja certa do que está fazendo... Você tem ideia do que alguém como você pode fazer com uma mulher, como eu?

Madu compreendeu a insegurança de Robin. Naqueles meses todos, em toda oportunidade que tinha, Madu arrumava um jeito de alfinetar Robin. Boa parte das críticas era apenas uma maneira de chamar a atenção, mas Robin era um tanto avoada algumas vezes para perceber uma segunda intenção. Com toda a calma do mundo, Madu dominou os lábios da médica e a beijou prazerosamente. Envolveu Robin no beijo, segurou a mão da doutora e guiou por seu corpo. Repousou a mão da outra entre suas pernas, sobre sua virilha, onde encontrava-se em temperatura quase febril.
Robin mordeu os próprios lábios, não resistiu e pressionou sua mão contra o sexo da Rainha. Maria Eduarda estava de calcinha e camisola, mesmo assim Robin poderia senti-la vibrar em suas mãos, fato que atiçava seu lado mais animalesco. Sua boca buscou a de Madu selvagemente. Ela a queria e pelo seu estado a queria demais. Quando se separaram em busca de ar, Madu devolveu a perguntou de Robin.


- E você... Tem ideia o que uma mulher como você pode fazer com uma garota como eu? – Disse baixinho, bem próxima de Robin que parecia hipnotizada por sua boca. – Eu quero muito você...

Sem nenhum resquício de insegurança, Robin voltou a juntar seus lábios aos de Madu. Dessa vez a mais velha se jogou junto ao seu desejo, puxou Madu para mais próxima de si, encaixando os corpos e desceu as alcinhas da camisola deixando Maria Eduarda nua da cintura para cima, já que a Rainha havia dispensado o sutiã. Em resposta, Madu jogou a camisa de flanela que compunha o pijama emprestado bem longe.
Pele com pele, os toques se tornavam ainda mais escaldantes. Estavam no meio de um beijo tórrido quando ouviram ruídos do corredor. Primeiro passos seguido de um barulho de louça quebrando. Depois vozes e em seguida gritos. Robin e Madu não queriam parar o que estavam fazendo, mas os gritos desconcentraram as duas.

- Eu vou ver o que é... Me aguarde aqui. Não leve a mal, mas não quero que saibam que passou a noite aqui. Uma gota de água vira um oceano na vida de uma Rainha... Não quero bisbilhoteiros falando sobre nós.

Robin fez um gesto afirmativo. Também preferia ser discreta por enquanto. No entanto, a atitude de Madu lhe preocupou.

- Madu, você vai lá sozinha? E se tiver algum bandido?
- Você invadia esse Palácio sozinha... Não tem perigo.
- Oras, eu sou uma capoeirista de muitos anos, sei me defender, agora você...

Madu riu. Robin a observava procurar um roupão adequado para ir até o lado externo.

- Capoeirista? É tipo comunista?

Foi a vez de Robin rir.

- Digamos que é uma arte marcial brasileira. Eu pratico desde criança.

- Aaaah... Aquela luta que parece dança que o Peste Rubra faz. – Madu se corrigiu. – Que a Peste Rubra faz... Eu adoro aquilo. – Robin sorriu. – Mas acho que não vou precisar me proteger de um invasor... – Ouviu as vozes de Juanito e Juan Batista. – Pelo jeito os únicos bandidos acordados são os da casa mesmo. Meu pai e Juanito.
- Tem certeza que quer que eu fique?
- Sim. Até porque o único invasor... Invasora... – Madu mais uma vez se corrigiu. – É você mesmo. Eu não demoro.

Deu um beijo rápido na médica e se despediu. A frase de Madu trouxe uma expressão séria no rosto da doutora. Madu falava em tom de gracejo, mas Robin lembrou de algo bem sério. Certa noite invadiu o Palácio para roubar alguma coisa que desse dinheiro. As crianças da escola estavam sem merenda e Anahí já não sabia mais o que fazer para alimentá-las. Ela se queixou com o “doutor" Robin que decidiu colocar Peste Rubra em ação. Com a cobertura de Leão que sempre ficava de vigia dos guardas, Peste Rubra invadiu o Palácio, fez uma limpa na dispensa e depois seguiu para o segundo andar.
No segundo andar fez uma limpa nos quartos. Quando estava prestes a escapar do palácio, ouviu passos pelo corredor e se escondeu. Pela brecha da porta do cômodo que usava como esconderijo temporário, viu de relance um vulto protegido por um capuz preto passar correndo. Em seguida um ruído de louças se quebrando e passos apressados pôde ser ouvido. Quando a situação se acalmou, Robin saiu de seu esconderijo. Viu uma bandeja e cacos de vidro no chão do corredor próximo a cozinha. Provavelmente o vulto se chocou com alguma empregada. Robin saiu do Palácio antes que mais alguém acordasse e a encontrasse ali. Comentou com Leão sobre o que aconteceu e foram embora. O grandalhão sempre fazia sua retaguarda nos ataques do Peste Rubra. Deixaram as comidas na porta da escola e seguiram cada um para sua casa. Horas mais tarde do mesmo dia, Leão a acordou afoitamente.


- Você quase derrubou a porta da minha casa... – Robin resmungava sonolenta. – Espero que tenha justificativa para isso!
- Tenho e uma boa. Você quase foi testemunha ocular de um crime.
- O que? – Robin questionou confusa.
- Você quase foi testemunha ocular de um crime. – Leão repetiu. – Lembra que você disse sobre o vulto que viu de madrugada no Palácio? Tudo indica que você viu um assassino.
- Assassino? Quem morreu?
- A Rainha. – Robin arregalou os olhos. – Maria Elis está morta.

A morte da Rainha deixou Robin chocada. Era o segundo caso de regícidio que acontecia em Ursal. A primeira Rainha assassinada havia sido Alba, do lado Norte. Robin conhecia bem aquela história. A segunda era Maria Elis.

- Juan Batista está viúvo de novo.
- Você acha...
- Não acho nada, Leão... E esqueça essa história de testemunha ocular. Eu não vi nada. Quem viu foi Peste Rubra e Peste Rubra é um fora da lei. Lembra disso? Foras da Lei não são testemunhas.
- Mas Robin, houve um assassinato.
- Eu não posso me arriscar, Leão... Se vierem esmiuçar a minha vida e descobrirem meu passado? Estou perdida! Eu gostava de Maria Elis, não tenho nada contra ela, mas é uma questão de segurança. Você sabe muito bem. – Leão teve que dar a mão a palmatória. Robin corria mesmo risco se seu passado viesse á tona. – E outra. A pessoa trombou com uma empregada do Palácio. Eu vi a bandeja no chão e as xícaras quebradas. Ela também é testemunha ocular.

Leão concordou com Robin. A polícia cuidava do caso e ninguém tinha informações ao certo em que pé andavam as investigações. Robin resolveu esquecer aquela história, já que nada poderia fazer. Quando ouviu a discussão nos corredores do Palácio, lembrou-se daquela noite. Queria continuar com aquele assunto esquecido, mas agora que estava se entendendo com Madu, viu que não conseguiria deixar aquela história para trás. Antes de qualquer coisa precisava falar a verdade a Madu.
A Rainha não demorou para voltar ao quarto e quando chegou trouxe explicações.

- Era Juanito acordado. Ele vai para o Porto buscar uma encomenda que esta chegando de Havana e não pode esperar. Acordou a Paloma para fazer seu café da manhã uma hora dessas porque ele precisa partir cedo... Juanito não tem mesmo noção de nada e... – Madu percebeu o desconforto de Robin. – Que foi? Você está sério. Séria... Perdão.

- A gente precisa conversar...
- Estávamos nos entendendo tão bem...O que aconteceu? – Madu se sentou no colo de Robin. – Acho que paramos aqui...

- Espera, Madu... É sério, precisamos conversar... – Madu fitou Robin. – É sobre a morte da sua mãe...

(...)

O sol mal havia nascido no lado Norte da Ilha e Antônia já estava de pé. Aquela era uma de suas horas preferidas do dia. Com a casa em silêncio podia ouvir o cantar dos pássaros e meditar em paz no quintal, na parte de trás da casa onde se tinha uma bela vista do oceano. Enquanto terminava sua uma hora de meditação, Antônia ouvia Heloísa descer do quarto e preparar o café da manhã. Após o término da meditação, Antônia entrou na casa pela porta dos fundos. Ganhou um beijo com gosto de hortelã. Heloisa havia acabado de escovar os dentes.

- Bom dia, meu dengo.
- Bom dia, minha margarida. E nossa menina?
- Está na sala assistindo TV com Batman. Sabe o que ela me pediu? Uma coleira pra passear com o Batman. Você já viu gato de coleira? – Heloísa disse entre risos. – E nossa outra menina? Já foi trabalhar?
- Acho que Robin não voltou para casa.

Heloísa se assustou.

- Ai, meu Deus, será que aconteceu algo com meu caruruzinho? Será que fizeram alguma maldade com ela? - Afligiu-se. Antônia riu. – Você ri, Antônia? Se encontrarem o corpo de Robin por aí...

No mesmo instante ouviram o ruído de chaves e passos entrando pela casa. Antônia reconheceu Robin pois a médica assobiava uma música antiga de Dalva de Oliveira. Heloísa era fã da cantora, Robin cresceu ouvindo aquelas músicas. Robin entrou na cozinha com um semblante bem disposto. O calor havia voltado a Ursal, a médica trazia o paletó pendurado nos ombros e a plenitude no olhar.

- Bons dias! – Robin disse animada. – Estou faminta, já tomaram café?

Antônia fez um comentário em tom de gracejo.

- Pelo jeito encontraram o corpo de sua filha sim. E pela cara boa dela, encontraram em cima da cama de uma bela dama...
- Antônia!
- Robin não é exatamente uma Virgem Maria... – Antônia disse em tom humorado. – Diga, minha filha, tia Tônia está certa sobre a bela dama?
- Bela dama é pouco, tia... – Robin disse sem esconder sua felicidade. – Ela é uma verdadeira Rainha...

Antônia e Heloísa se entreolharam e riram ao identificar a inspiração para tanta animação. Mariele logo se juntou as três mulheres e tomaram café enquanto Robin contava entre risos sobre a serenata e o convite de Leão para Augusto acompanhá-lo. Depois Robin revelou que também iria acompanhada a festa. As mães da médica logo concluíram que ela e a Rainha haviam combinado de irem juntas, mas nada disseram a Mari, apesar das perguntas da garota. Mari era criança e poderia facilmente dar com a língua nos dentes. Robin entendia que sua situação com Madu devia ser levada com discrição. Ela era a Chefe de Estado e mulheres sempre são vítimas de fofoqueiros. Não queria se tornar sinônimo de problemas para Madu.
Com um sorriso nos lábios, pediu licença a Antonia, Mariele e Heloísa e foi deitar em seu quarto. Permitiu-se tirar aquela manhã de folga,  havia passado boa parte da noite acordada e precisava repor as energias, embora tivesse apenas trocado beijos com Madu.
No Palácio das Laranjeiras, Madu tomava atitude parecida com a de Robin. Tinha trabalhado a semana toda, estava exausta. Passou boa parte da manhã em sua banheira, repousando em um banho relaxante de sais e em seguido dormiu por algumas horas. Acordou com Paloma em sua porta. A criada trazia um convite de Juan Batista. Maria Eduarda devia se juntar a ele, Inácio e Juanito para almoçar.

- Confesso que pretendia almoçar aqui em meu quarto mesmo, ouvindo música...
- Trata-se de um almoço especial, majestade. Senhor Juan Batista pediu para que não faltasse.

Um tanto ressabiada, Maria Eduarda desceu no horário marcado pelo pai e encontrou de Juan Batista e os irmãos, mais duas companhias. Marcela, sua amiga e noiva de Juanito e um rapaz moreno, queimado de sol, de cabelos negros presos em um rabo de cavalo. Ele era forte, bonito e usava cavanhaque. Era alto e tinha algo de familiar em seu rosto.

- Boa tarde á todos... Eu não sabia que tínhamos convidados...
- Oras  minha prezada irmã... São todos de casa... – Disse Juanito. - Marcela e Miguel, recorda-se de Miguel, nosso primo?
- Impossível ela recordar... A última vez que nos vimos éramos muito moleques... – Miguel se manifestou. - Lembra-se, Maria Eduarda? Vivíamos para baixo e para cima...

Maria Eduarda lembrava sim de Miguel. Era o garoto mais bonito que tinha conhecido na vida até seus treze, catorze anos. Era filho de uma irmã de Juan Batista que vivia na Espanha. Certa vez ele veio passar férias em Ursal e ficou quase dois meses na Ilha. Ele e Madu se tornaram grandes amigos, quando Miguel foi embora, foi um chororô danado. Trocaram cartas por algum tempo até perderem o contato quando Madu foi para os Estados Unidos e Miguel entrou na faculdade.

- Claro que lembro de você, seu tratante! Que saudade, me dê um abraço! – Os dois se cumprimentaram de forma esfuziante. – O que faz aqui?
- Tio Juan Batista me convidou para passar uma temporada por aqui... Eu não dei muita sorte na faculdade e mamãe foi incomodá-lo.
- Incomodo nenhum, meu sobrinho. Você é muito bem vindo nesta casa!
- Verdade! – Madu afirmou. – Estou muito feliz que você se juntou a nós! Seja bem vindo, Miguelzinho! – Olhou para o primo com carinho. – Meu Deus, você é um homem feito!
- Não chego a altura da linda mulher que você se tornou...
- Deixe de bobagem... Me dê mais um abraço.

O almoço que Madu achou que seria motivo de aborrecimento foi extremamente agradável. Miguel contou um pouco de sua vida na Espanha enquanto Inácio  Juanito e Madu falavam sobre a rotina de Ursal, sobre a família e suas vidas. Marcela ora ou outra também participava da conversa. Em certo momento Juan Batista se afastou para ir ao banheiro e observou os jovens a distância. Miguel e Madu pareciam se divertir na companhia um do outro. O homem abriu o sorriso. Tinha certeza que seu plano daria certo e em poucos meses Madu e Miguel estariam casados.

(***)

As horas correram em uma velocidade que Madu não conseguiu alcançar, quando se deu conta o dia já havia terminado. Entre reuniões, papeladas e intromissões de seu pai em tentativas óbvias de inserir o primo recém chegado em todo o assunto possível.

Mesmo em um sufoco tremendo e abarrotada de afazeres, a Rainha não esqueceu da conversa que teve na parte da manhã com Robin, pelo contrário, as palavras da médica não saiam de sua cabeça.

As peças não se encaixavam e Maria Eduarda se negava a acreditar que alguém tivesse a coragem de matar sua mãe. Maria Elis que sempre fora tão boa com todos que tiveram a sorte de conhecê-la, teve um fim precoce e agora cercado de mistério.

Quem poderia ter a coragem de tentar contra a vida da Matriarca mais querida de Ursal?

Entre perguntas sem respostas, Madu rememorou o episódio que trouxe á tona toda a tempestade que se alojou em seu peito.

- Foi isso que aconteceu.

Robin finalizou seu relato da forma mais suave que pode, diante do mutismo  e falta de ação de Madu, a médica manteve-se quieta, apenas segurando sua mão em forma de apoio. Desde a infância Robin sabia qual era a dor de perder entes queridos de forma brusca e impiedosa, forçada a fugir da ilha com sua tia, não teve outra alternativas a não ser partir.
Mais do que nunca, Madu era compreendida em sua dor. Dor essa que se transformou em grossas lágrimas e soluços sofridos, saber que sua mãe teve a vida ceifada. A dor da perda que aos poucos minimizava pelo tempo, naquele momento,  tinha voltado com força total. O peito doía de tristeza e revolta.

- Você poderia ter segurado esse encapuzado e o impedido de fugir. - A Rainha murmurou assim que encarou Robin.

A médica, no primeiro momento, ficou sem reação diante da constatação e concordava com Madu, quantas vezes já tinha se reprovado por não ter feito nada? Precisava proteger sua identidade,  mas se pudesse ter salvado a vida da Rainha, não se importaria de sacrificar seu segredo. Condenava-se internamente por isso.

- Eu não sabia que tinham feito algo com sua mãe, pensei que fosse apenas alguém apressado, por isso me escondi e acabei presenciando a fuga pela fresta da porta. Eu juro que, se soubesse , eu teria feito algo....

Sem perceber, Robin também chorava ao pronunciar suas últimas palavras. Os olhos molhados se encontravam e deixavam claro toda a sinceridade proferida. Madu reprovou-se por acusar a médica por algo que não era culpa sua.

- Des- Desculpe-me... Eu não queria acusa-la de nada...

- Ei, você não precisa se desculpar por nada...Vem aqui... - E assim Madu foi acolhida por um abraço terno e acolhedor.

Após sentir os braços de Robin circular seu corpo, Madu suspirou e se aconchegou melhor ao corpo que se mostrava uma verdadeira fortaleza ao amparar sua dor com tanta habilidade e destreza. Entre suaves carícias nos cabelos trançados da Rainha e palavras de carinho, assim mantiveram por minutos incontáveis. Até que Robin teve a estapafúrdia ideia de comentar sobre algo que há dias estava para falar.

- Sabia que Gabi é ótima com Dreads? - Sem entender o porquê da pergunta que parecia afirmação, Madu se afastou o suficiente para encarar Robin afim de incentiva-la a continuar a falar, para assim, quem sabe, entender o comentário totalmente esporádico e sem nexo. - Ela chegou a fazer uns trançados no meu cabelo, mas puxava um pouquinho e sou mole pra dor,  só fiquei com três tranças do lado esquerdo que ela teve que desfazer no mesmo dia. - Constatou sem graça enquanto Madu ria. - Mas ficaram lindas, posso garantir.
- Imagino que sim, Gabi parece ser uma moça cheia de talentos...
- Ô se é!

A constatação de Robin não agradou muito Madu que logo fechou a cara e tentou se levantar da cama para se afastar de Robin,  tentativa que não deu muito certo, pois a médica a segurou em seus braços a mantendo levemente presa.

- Ei, me  deixa terminar.
- Hummm...Eu só queria ir ao banheiro. - Respondeu a Rainha empurrada.

- Tudo bem, depois eu termino de lhe falar sobre.

- Tudo bem, me fale o que tinha a dizer.

Robin sentou na cama de frente para Madu e tentou rapidamente organizar as ideias para não falar alguma besteira, algo que se tornará corriqueiro na frente da Rainha. O nervosismo que assolava a médica na presença de Madu chegava a ser risível.

- Então, vai ter a festa de San Valentim e Gabi poderia arrumar o seu cabelo para irmos juntas.
- É assim que você faz um convite a Rainha, dizendo que o cabelo dela está um bagaço?
- Não...Eu não quis dizer isso. Eu só lembrei que Gabi sabe fazer e seu cabelo tá crescendo. Mas você continua linda. Isso é inquestionável!
- Quer dizer que mesmo com o cabelo todo bagunçado eu fico linda e você quer me convidar para ir ao baile?
- Sim, quer dizer...Eu quero e sim, mas não... Seu cabelo não tá bagunçado. Eu só tive a ideia é se você aceitar e Gabi e eu aí vamos e você vai...e....

Sem saber mais o que dizer, Robin suspirou confusa, tentando entender as próprias palavras enquanto Madu carregava um sorriso divertido nos lábios.

- Você é má, dona Maria Eduarda. - Constatou Robin bem humorada ao perceber a tentativa da Rainha em intimida-la.

- Talvez um pouco sádica, você fica uma graça toda desconcertada. - Robin sentiu-se feliz por satisfeita por arrancar alguns sorrisos sinceros de Madu, mesmo que soltasse que toda o desgosto ainda estivesse instalado em seu interior. - Obrigada por ser sincera ao me contar tudo e por está aqui, isso é muito significativo para mim. - Disse a Rainha de forma sincera ao fazer um leve carinho na bochecha da médica.
- Sempre que eu puder e você permitir...
- Eu aceito.
- O que? - Perguntou Robin confusa.
- Seu convite para ir ao San Valentim em sua companhia, mesmo que você não tenha feito um pedido decente.

Um toque na porta despertou Madu do breve devaneio a trazendo para a realidade, onde estava com os olhos marejados e uma pilha de documentação a sua frente para ser analisada.
Após a autorização, Paloma entrou na sala a fim de entregar o chá que a Rainha pediu. A cabeça de Madu latejava e nada melhor do que um chá indicado por Antônia para aliviar o incômodo.
Depois da saída da jovem serviçal, Madu manteve seus pensamentos a respeito de toda a descoberta feita durante a manhã. Cada gole do chá era engolido de forma lenta e o gosto tornava -se amargo sem perceber. Maria Eduarda queria justiça por sua mãe e por isso teria que ser fria e calcular milimetricamente todos seus passos. O culpado seria encontrado e pagaria pela atrocidade cometida.

- Eu juro por sua memória, mãe. –
Madu disse em um sussurro antes de limpar a única lágrima que se atreveu escapar de seus olhos verdes. – Seu assassino será encontrado e pagará pelo que fez... Caso contrário não me chamo, Maria Eduarda.

Os MonarcasWhere stories live. Discover now