Manhã de Natal

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Os olhos de tonalidades acinzentadas piscaram algumas vezes antes de notar que a porta de casa se tinha aberto e fechado pouco depois. Pelas frechas da persiana da sala, podia deduzir que ainda era bem cedo e por isso, só conseguia imaginar que devia ser o pai para a corrida matinal. Algo que ele também fazia, embora com as aulas normalmente optasse por fazer isso à noite.

Em condições normais, acompanharia o pai, mas as dores de cabeça, a boca seca e o sono acumulado, fizeram com que se cobrisse novamente com o cobertor. Dormiu mais algum tempo até concluir que precisava de um duche para desanuviar a cabeça que além de doer, parecia pesar muito mais do que o normal.

A casa continuava silenciosa, o que indicava que as visitas ainda dormiam e por isso, teve o cuidado de arrumar as suas coisas sem fazer ruído. De seguida, passando pelo corredor, notou que a porta do quarto estava aberta. No interior, não estavam os seus pais, pelos vistos os dois tinham saído sem avisar, mas como as suas malas estavam ainda pelo quarto imaginou que não devessem demorar.

Sendo assim, aproveitou para ir ao guarda-fatos retirar algumas roupas limpas e dirigiu-se à casa de banho. Fechou a porta com chave, não fosse algum dos adolescentes sonolentos abrir sem bater ou sem sequer se aperceber que estava alguém no interior. O senso comum não funcionava na cabeça de todos e por isso, sabia que mesmo que vissem a porta fechada se não tivesse com a chave, ainda poderiam tentar abrir.

"Se bem que acho que a Hanji fazia isso de propósito", dizia a si próprio em pensamento e bocejou enquanto tirava a camisa, "Por falar nela, será que ela e o Irvin já se entenderam?".

Abriu a torneira da banheira e recriminou-se por estar a pensar na amiga logo pela manhã. Tentou convencer-se que de todos os pensamentos que podia ter, aquele não era o melhor para começar o dia que já tinha dores de cabeça suficientes.

Após um duche que serviu pelo menos para se refrescar um pouco, ouviu algum murmurinho no quarto de hóspedes. Deduziu que Mikasa e Annie estivessem acordadas. Isso significava que em breve, os amigos também poderiam acordar e isso significava quererem comer qualquer coisa.

– Tch...

"Nunca pensei que vir ser professor para este fim do mundo me desse a infeliz oportunidade de andar a preparar refeições para pirralhos. Mais do que professor, já pareço um voluntário em África", pensava mal disposto e ao passar pela sala viu que Eren estava a levantar, mas assim que o viu, virou o rosto. "Será que ele pode ser um pouco mais óbvio? O que se passa com aquele miúdo? Só de olhar para ele, fica...".

Então, como se fosse um flashback repentino da noite anterior, as coisas começaram a fazer sentido. Os copos de vinho a mais, o fato de Eren ter vindo ter com ele durante a noite para lhe desejar os parabéns, a troca de palavras...

Foda-se... – Murmurou ao entrar na cozinha.

Queria bater com a cabeça no armário da cozinha, mas isso iria piorar as dores. Quem é que tinha que ser discreto? Claro, o vinho, a temperatura, as hormonas que pensava que tinha sob controlo e o Eren que não sabia ficar longe numa situação daquelas. Agora que pensava sobre a situação, imaginava como aquilo podia ter acabado muito mal, bastando que para isso alguém os tivesse visto. À medida que recordava o que tinha feito, chegava à conclusão que se censurava muito mais pelo que tinha dito. Sem pensar e por instinto do momento, acabou por se declarar e por muito pouco conhecimento da língua francesa que o adolescente tivesse, "Je t'adore" não era um mistério.

Talvez não pudesse ser considerada uma declaração válida devido ao estado ébrio em que estava. Era disso que se tentava convencer, só que ao mesmo tempo, pensava na hipótese do rapaz ter encarado aquilo com seriedade. O que devia dizer depois disso? Concluiu que o melhor seria não dizer nada, afinal aquele tipo de conversa não era o seu forte. Nunca tinha sido porque...

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