CAPÍTULO 22

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Breno sentiu um calafrio ao atravessar os portões do colégio naquela manhã de terça-feira. Apesar de tudo, ele havia sobrevivido. Nem foi preciso fazer uma visita ao médico e, contra todas as probabilidades, já se sentia bem o suficiente para voltar às aulas. Foi o que dissera a mãe, pelo menos, depois de medir sua temperatura pela milésima vez. Mas, no momento em que se viu devorado pela multidão de alunos que enchiam o saguão, a espinha arrepiada como se tivesse levado um choque elétrico, Breno soube que não estava pronto. Quis dar meia-volta e correr para qualquer outro lugar, mas alguma força desconhecida mantinha seus pés colados ao chão.

Depois, enquanto deslizava por entre os colegas, não pôde deixar de notar os rostos que o encaravam, as vozes que zumbiam como uma nuvem de moscas famintas sobre a carniça. Logo descobriu que, por mais que tentasse, nada faria com que ele passasse despercebido. Os olhos injetados de curiosidade, os sorrisos contidos e os escancarados, os sussurros indistintos que se multiplicavam por onde passava... tudo o que Breno conseguia ver e ouvir eram peças de um mosaico grotesco. Um animal na floresta escura, em meio ao cerco dos predadores — era assim que o menino se sentia, suando frio por baixo do agasalho.

Então assomaram diante dele três figuras bem conhecidas. Ruan, Chico e Codinome formavam um bloqueio no caminho com seus corpos volumosos, todos de braços cruzados e peito estufado, em contraste com o perfil franzino e cabisbaixo de Breno. Ele suspirou, as orelhas queimando, pois já conseguia prever o que estava para acontecer.

— E aí, Breno? Qual é a dessa cara de florzinha murcha? — O líder do trio abriu um sorriso torto e amarelado, que os capangas logo imitaram. — Conta pra mim o que tá pegando. Brigou com o bofe, foi? Por quê? Não conseguiram chegar a um acordo sobre qual dos dois seria a mulher da relação?

— Acho que não foi bem isso, Ruan — disse Chico, num esforço visível de conter o riso. — Ele deve saber que não tem chance contra a namorada do cara. O que a Renata tem de peito e bunda ele só vai conseguir na base do silicone!

Nesse momento os três explodiram em uma gargalhada esganiçada, fazendo com que as bochechas de Breno ganhassem um tom vermelho-vivo. Seu coração passou a bater em um ritmo frenético, a pulsação tão ensurdecedora a ponto de fazer com que as vozes dos valentões se tornassem distantes e abafadas. No borrão daquele momento, em que o menino se viu no limite entre a realidade e o pesadelo, um rosto familiar destacou-se entre os demais.

Luigi assistia à cena com o olhar enviesado, tão cheio de vergonha que parecia se esconder por trás da franja desgrenhada. Quando se viu descoberto por Breno, encarou-o por alguns segundos, parecendo incerto sobre como reagir, até passar o braço pela cintura de Renata e trazê-la para mais perto de si, então afundou o rosto no pescoço perfumado da namorada. Ela, por sua vez, mantinha uma expressão enigmática, mas Breno podia jurar que um sorriso se esboçava nos cantos de seus lábios.

De repente, o silêncio. Breno encheu os pulmões, buscando resquícios de coragem para encarar os brutamontes que o confrontavam, mas, ao virar o rosto, eles já não estavam ali. Haviam evaporado, sem deixar rastros nem qualquer direito a resposta. Então o sinal estridente ecoou pelo saguão, decretando o início de mais uma torturante sequência de aulas.

Horas depois, o corredor principal do colégio foi tomado por uma horda de adolescentes desesperados pelo intervalo. No meio deles, Breno se arrastava, deixando-se levar pela debandada, torcendo para que ninguém o identificasse e viesse abordá-lo por um motivo qualquer. Só ergueu a cabeça ao desembocar no saguão, quando se deu conta de que havia perdido Gina em meio ao fluxo de alunos.

Como uma ave de rapina, ele estreitou os olhos e procurou cuidadosamente por entre a multidão, até ser atraído de súbito por uma figura solitária, agachada em um canto afastado do lugar. Mesmo ao longe, Breno conseguiu distinguir o rosto tristonho e logo começou a atravessar o saguão, tropeçando nas canelas que surgiam pelo caminho.

Do Fundo do Meu Coração - Dramas e Confidências de um Garoto ApaixonadoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora